Estamos cansados do Covid 19. Estamos cansados de ver doentes, de ver máscaras e sapatos de plástico, de ver luvas e ventiladores.
Estamos cansados de tanto número na televisão, um pior que o outro, curvas sempre a subir, estatísticas ameaçadoras, carregadas de óbitos, de internamentos, de fadigas nos tratadores de doentes.
Estamos fartos da desconfiança, o outro como potencial inimigo, a afastar, a manter à distância, sem um toque, sem um carinho, sem um beijo, sem um abraço. E nem sequer o nosso sorriso recebe, tapado por uma máscara que nos abafa, que nos distorce, que nos atormenta.
Mãe, já chega. Vem depressa em nosso auxílio!
Também estamos cansados de ver em cada puxador uma bomba, em cada objeto uma espingarda, em cada papel um contágio, em cada saco de compras um perigo, em cada pedaço de tecido um depósito de vírus.
E não suportamos mais essa ideia da quarentena, dias e dias a contar carneiros, a ver paredes, a trepar por elas, a pensar na vida, a pensar no próximo teste ao Covid, a desesperar por ver o mundo um pouco maior que quatro paredes. Há gente que não sai de um quarto há meses, espreitando apenas para detrás da porta, a certas horas, em busca de algum alimento.
Tanta gente sozinha, cada vez mais sozinha, com medo de estar sozinha, igualmente com medo de receber companhia, porque tudo agora é ameaça, tudo é perigoso, tudo amedronta.
Mãe, já chega. Vem depressa em nosso auxílio!
Os números do desemprego vão subindo assustadoramente. A frustração é enorme. Não há mais motivação para nada. Não há razões para uma luta. Acabaram-se os objetivos. A fome espreita. Começa a faltar até o essencial. E para além do estômago vazio, os olhos começam a ficar embaciados, o coração mirrado, os dias cinzentos, a vida pesada e triste.
Não podemos morder a bochecha do bebé que nasceu, não podemos abraçar o amigo que está aí, a mãe – que é de idade – não recebe o carinhoso beijo, vai tudo de aceno ao longe, ou espreita-se pela janela. E se alguém se lembra de partir, os olhos vêm-no afastar-se, a solidariedade reduzida ao virtual, a mensagem enviada de longe, sem o calor da presença, o lenitivo do abraço, a solidariedade física, meiga e robusta.
Mãe, já chega. Vem depressa em nosso auxílio!
Estamos cansados de ver setas, contagens de espaço em metros, percursos assinalados, senta aqui e deixa espaço acolá, vai pela outra porta e chega-te para lá. Passa tanta corrente de ar entre nós e o próximo… Que distantes nos sentimos…
Milhares de consultas adiadas, milhares de operações desmarcadas, tantos doentes descuidados, porque as atenções se centraram e centram apenas ou quase exclusivamente num núcleo de enfermos. Mas os outros debilitados também sofrem, também penam, também morrem, também precisam de cuidados…
Uma dor de cabeça, que aflição. Uma tossidela, a mente começa logo a funcionar. A cabeça mais quente… e …estarei doente?! Faço teste ou não?! Ligo pra quem? Ou não ligo já?! Vou ter com quem tinha previsto encontrar-me ou irei contaminar?! Dúvidas. Muitas dúvidas. Incertezas. Muitas incertezas.
As floristas não vendem, os restaurantes estão aflitos, os cafés estão meio vazios, o negócio para tantos não rende, nem pra comer, que fará para fazer face a despesas. Que desatino!
Mãe, por favor, já chega. Vem mesmo depressa em nosso auxílio!
Começa por socorrer os doentes e os enlutados. Dá coragem a quem tem que cuidar de uns e de outros. Acolhe os que partiram. Dá luz a quem procura antídotos. Dá-nos serenidade, saúde e paz. Dá-nos sustento e ânimo. Cuida de nós. Cuida de todos. Cuida do mundo.
Que em breve nos possamos, sem medo, abraçar. E possamos louvar-te pelos teus benefícios, ó Mãe piedosa e bendita, Rainha dos Céus e da Terra, a quem, de todo o coração, nos confiamos.
Mãe, por favor, vem depressa em nosso auxílio!
Cón. José Paulo Leite de Abreu
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