Dar fruto
Na parábola do Evangelho do 33º Domingo do Tempo Comum (Ano A) (Mateus 25,14-30), somos logo levados a tomar consciência de que um imenso dom, vindo de Deus, precede sempre a nossa acção: cinco talentos, dois talentos, um talento… é sempre uma imensa quantidade dada logo à partida!
Um talento equivalia então a 6000 denários, sendo que o denário era o salário normal de um dia de trabalho. Um talento, 6000 denários, era assim o equivalente a uma vida inteira de trabalho! Portanto, quer seja um, dois ou cinco talentos, é sempre um imenso dom que nos é entregue. Os talentos entregues por Deus a cada um de nós não são como uma pedra preciosa que há que guardar ciosamente. São antes como uma imensa soma de dinheiro que há que pôr a render, ou como uma semente que há que semear para produzir raízes, caule, ramos, folhas, flores e frutos. Só que esta imensa soma de dinheiro ou esta semente capaz de um tal desenvolvimento são-nos entregues sem instruções!
Os dois primeiros servos não perderam tempo, mas partiram logo e obtiveram resultados fantásticos (100% de lucro). Mas o terceiro, ao contrário, agiu como se o talento recebido fosse uma pedra preciosa, e guardou-a ciosamente, para, a seu tempo, a devolver intacta ao seu dono. As razões do comportamento estranho deste terceiro servo, são-nos manifestadas depois, quando este servo se explica aquando da chegada, «muito tempo depois», do seu Senhor. Ele diz: «Eu sei que és um homem duro, que colhes onde não semeaste e juntas onde não espalhaste. Tive medo, e escondi o teu talento na terra» (Mateus 25,24-25). Aqui estão as respostas erradas, que vêm desde Adão. Também Adão teve medo de Deus e escondeu-se dele (cf. Gn 3,10). Também este terceiro servo da parábola de Mateus ficou tolhido pelo medo e optou por jogar pelo seguro, que se vem a revelar falso. O medo deriva, nos dois casos, de uma falsa imagem de Deus, que é visto como um homem duro e exigente. É assim que ficamos muitas vezes paralisados, sem perceber a lógica dos dons de Deus, a começar pelo dom de Deus por excelência, que é o Espírito Santo. Sim, os dons do Deus da parábola são dinâmicos, e não pedras estáticas e imóveis! E o Deus da parábola é o Senhor da alegria e não do medo!
Portanto, a vigilância de Mateus 25,13 («Vigiai, pois…») manifesta-se em sermos activos, generosos, corajosos e ousados desde o primeiro momento, e não em ficarmos tolhidos, frios e inertes, ciosamente guardando um grande tesouro… Negociantes ousados, e não o tempo todo sentados em cima do tesouro. (Texto resumido e adaptado de António Couto).
Palavra para o caminho
Às vezes, nós pensamos que ser cristão consiste em não praticar o mal. E não praticar o mal é bom. Mas não praticar o bem não é bom. Temos que praticar o bem, sair de nós mesmos e olhar, olhar para os mais necessitados.“Estende a tua mão ao pobre!”. E Jesus diz-nos outra coisa: “Sabes, o pobre sou Eu”. Jesus diz-nos o seguinte: “Eu sou o pobre!” (Papa Francisco, Angelus do dia mundial dos pobres, 2020).