Ano da Fé – XIX

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O pecado original

No Antigo Testamento o texto sobre a queda de Adão não encontra eco senão no livro da Sabedoria: «Por inveja do diabo é que a morte entrou no mundo, e hão-de prová-la os que pertencem ao diabo» (Sab 2, 24). Em compensação, o pecado original ocupa um lugar capital no ensinamento de São Paulo «Por um só homem, Adão, o pecado entrou no mundo, e pelo pecado a morte» (Rm 5, 12). É assim que o apóstolo resume o conteúdo da narração do livro do Génesis. Pela sua transgressão – afirmará, por seu turno o Concílio de Trento – , Adão «perdeu a santidade e a justiça em que tinha sido constituído». A harmonia, na qual ele se encontrava com Deus, consigo mesmo e com o mundo, foi perdida, assim como o dom da imortalidade. A humanidade é afectada por este pecado de origem, que se situa na história, nas origens da história humana; cada um de nós é atingido e marcado por ele, pelo simples facto de pertencer à família humana.  Pelo pecado original a natureza humana foi gravemente ferida, mas não totalmente corrompida. A imagem de Deus ficou embaciada – como aliás sempre acontece quando pecamos – mas não foi nem será nunca destruída.

Acerca do pecado original, diz Bento XVI que se deve compreender «que todos carregamos dentro de nós uma gota do veneno daquela forma de pensar que nos é ilustrada nas imagens do livro do Génesis. (…) O ser humano não confia em Deus. Seduzido pelas palavras da serpente, levanta a suspeita de que Deus é um adversário que (…) restringe a nossa liberdade e de que só seremos verdadeiramente humanos quando pusermos Deus de parte. (…) O ser humano não quer receber de Deus a existência e a plenitude da sua vida. (…) E, na medida em que o faz, confia na mentira em vez da verdade e precipita a sua vida no vazio, na morte».

O mais grave não é cometer crimes, é não fazer o bem que poderia ter sido feito. É o pecado de omissão, que é nada mais que o não-amor; mas ninguém se queixa dele (Léon Bloy).

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Ano da Fé – XVIII

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Satanás

Os anjos maus têm Satanás por chefe. A sua força destrutiva e a sua influência na história são indicadas pela Bíblia em termos impressionantes: “o príncipe deste mundo” (Jo 12, 31); “o grande Dragão” (Ap 12, 9); “assassino desde o princípio… e pai da mentira” (Jo 8, 44); “aquele que tinha o império da morte” (Heb 2, 14); o “Maligno” que domina “o mundo inteiro” (1Jo 5, 19). É, pois, preciso ver nele uma pessoa espiritual, má e poderosa, pervertido e perversor, que, através de uma ilusão de vida, organiza sistematicamente a perdição e a morte.

Pode reconhecer-se a sua especial influência na força da mentira e do ateísmo, na atitude espalhada de auto-suficiência, nos fenómenos de destruição lúcida e louca. Mas toda a história, a começar pelo pecado original, está inquinada e perturbada pela sua acção nefasta. Segundo a concepção bíblica, as várias formas de mal são de certo modo atribuíveis a ele e aos seus cúmplices. A Igreja considera que “um duro combate contra os poderes das trevas atravessa toda a história humana; começou no princípio do mundo e… durará até ao último dia”.É preciso estar vigilante a respeito de Satanás e dos demónios, mas sem medo. A supremacia de Deus e de Cristo é total, do princípio ao fim. Nada temos a temer.

Normalmente, a acção dos espíritos malignos a respeito do homem consiste na tentação do pecado. O que lhes interessa é, normalmente, o nosso desencaminhamento espiritual. Para além das tentações são-lhes atribuídos alguns fenómenos prodigiosos de carácter negativo: a obsessão, que é violência interior ou exterior destinada a causar perturbação; a possessão, que consiste na tomada de posse do corpo com crises tempestuosas; a infestação, que se refere a locais e provoca danos e temores. Ao interpretar este género de fenómenos, é necessário ser-se extremamente cauteloso. Para um prudente discernimento, devem ser consultados psicólogos e psiquiatras competentes e respeitadores da fé.

Algumas vezes, porém, a explicação psicológica não parece adequada. Pode admitir-se como boa probabilidade a acção demoníaca quando nos encontramos na presença de alguns sinais concomitantes, tais como, força física anormal, comunicação através de línguas desconhecidas, conhecimento de coisas afastadas ou secretas, atmosfera doentia, aversão às realidades religiosas. Nestes casos, como em todas as situações de sofrimento, é aconselhável recorrer à oração humilde e confiante, que não pretende alcançar resultados a todo o custo, mas aceita o que Deus, na Sua providência, achar por permitir dar. É bom empenhar-se seriamente num caminho de vida cristã, incluindo o sacramento da reconciliação e a comunhão eucarística, as obras de penitência e de caridade,a fidelidade aos deveres pessoais. Pode, finalmente, recorrer-se ao exorcismo, que é um ritual, um gesto realizado em nome da Igreja. Na forma de esconjuro, dirigimo-nos a Deus para que expulse o Diabo. Na forma imperativa, confiando no vitorioso poder de Cristo, ordena-se-lhe ao demónio que vá embora. Ambas as formas implicam uma atitude de humilde confiança. A eficácia não é automática, depende da vontade de Deus.

Só um ministro autorizado pelo bispo pode fazer o exorcismo. A autorização é concedida a pessoas dotadas de piedade, ciência, prudência e integridade moral.

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Ano da Fé – XVII

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Só o amor vence o mal

Mas poderíamos nos perguntar: como é possível pensar em um Deus omnipotente olhando para a Cruz de Cristo? A este poder do mal que chega ao ponto de matar o Filho de Deus? Nós gostaríamos, certamente, de uma omnipotência divina segundo a nossa mentalidade e os nossos desejos: um Deus “omnipotente” que resolva os problemas, que intervenha para evitar a dificuldade, que vence o poder adversário, muda o curso dos acontecimentos e anula a dor. Assim, hoje, diversos teólogos dizem que Deus não pode ser omnipotente, caso contrário, não existiria tanto sofrimento, tanto mal no mundo. Na realidade, diante do mal e do sofrimento, para muitos, para nós, torna-se problemático, difícil, crer em um Deus Pai e acreditar nele como omnipotente; alguns procuram refúgio em ídolos, cedendo à tentação de encontrar resposta em uma suposta omnipotência “mágica” e nas suas ilusórias promessas.

Mas a fé em Deus omnipotente nos impele a percorrer caminhos bem diferentes: aprender a entender que o pensamento de Deus é diferente do nosso, que as vias de Deus são diferentes das nossas (cfr Is 55,8) e também a sua omnipotência é diferente: não se exprime como força automática ou arbitrária, mas é marcada por uma liberdade amorosa e paterna. Na realidade, Deus criando criaturas livres, dando liberdade, renunciou a uma parte do seu poder deixando o poder da nossa liberdade. Assim Ele ama e respeita a livre resposta de amor ao seu chamado. Como Pai, Deus deseja que nós nos tornemos seus filhos e vivamos como tais no seu Filho, em comunhão, em plena familiaridade com Ele. A sua omnipotência não se exprime na violência, não se exprime na destruição do poder adversário como nós gostaríamos, mas se exprime no amor, na misericórdia, no perdão, no aceitar a nossa liberdade e no incansável apelo à conversão do coração, em uma atitude só aparentemente indefesa – Deus parece indefeso, se pensamos em Jesus Cristo que reza, que é morto. Uma atitude aparentemente indefesa, feita de paciência, de mansidão e de amor, demonstra que este é o verdadeiro modo de ser poderoso! Este é o poder de Deus! E este poder vencerá! O sábio do Livro da Sabedoria assim se dirige a Deus: “Tendes compaixão de todos, porque vós podeis tudo; e para que se arrependam, fechais os olhos ao pecado dos homens, porque amais tudo o que existe … poupais todos os seres, porque todos são vossos, Ó Senhor, que amais a vida” (11,23-24a.26). Somente quem é verdadeiramente poderoso pode suportar o mal e mostrar compaixão; somente quem é verdadeiramente poderoso pode exercitar plenamente a força do amor. E Deus, a quem pertence todas as coisas porque tudo foi feito por Ele, revela a sua força amando tudo e todos, em uma paciente espera pela conversão de nós homens, que deseja ter como filhos. Deus espera a nossa conversão. O amor omnipotente de Deus não conhece limites, tanto que “não poupou o próprio Filho, mas o entregou por todos nós” (Rm 8, 32). A omnipotência do amor não é aquela do poder do mundo, mas é aquela da doação total, e Jesus, o Filho de Deus, revela ao mundo a verdadeira omnipotência do Pai dando a vida por nós pecadores. Eis o verdadeiro, autêntico e perfeito poder divino: responder ao mal não com o mal, mas com o bem, aos insultos com o perdão, ao ódio com o amor que faz viver. Então o mal é verdadeiramente vencido, porque lavado pelo amor de Deus; então a morte é definitivamente derrotada porque transformada no dom da vida. Deus Pai ressuscita o Filho: a morte, a grande inimiga (cfr 1 Cor 15,26), é engolida e privada de seu veneno (cfr 1 Cor 15,54-55), e nós, livres do pecado, podemos ter acesso à nossa realidade como filhos de Deus. Então, quando dizemos “Eu creio em Deus Pai omnipotente”, nós expressamos a nossa fé no poder do amor de Deus que no seu Filho morto e ressuscitado derrota o ódio, o mal, o pecado e nos abre à vida eterna, aquela dos filhos que desejam estar para sempre na “Casa do Pai”. Dizer “Eu creio em Deus Pai omnipotente”, no seu poder, no seu modo de ser Pai, é sempre um acto de fé, de conversão, de transformação do nosso pensamento, de todo o nosso afecto, de todo o nosso modo de viver.

 Bento XVI

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Ano da Fé – XVI

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O mal

Se Deus tudo sabe e tudo pode, porque não evita o mal? O mal no mundo é um mistério sombrio e doloroso. O próprio Crucificado perguntou ao seu Pai: «Meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste?» (Mt 27, 46). Muito dele é incompreensível. Mas de algo temos a certeza: Deus é cem por cento bom. Ele nunca pôde ter sido o autor de algo mau. Muitos males derivam, sem dúvida, dos limites naturais, da inserção no mundo. Participando num processo evolutivo global, o homem nasce, transforma-se e morre como os outros seres da Natureza. Só consegue receber a vida a pouco e pouco. A precaridade da condição de criatura é, depois, agravada por inúmeras culpas pessoais, que provocam mais ou menos directamente uma série de perturbações a si e aos outros. Basta recordar os danos produzidos à saúde, às distorções da convivência social, às guerras. Por sua vez, a propensão do homem para pecar, segundo a concepção bíblica, depende quer da influência de Satanás e dos vícios, quer de uma misteriosa solidariedade que envolve toda a humanidade desde as origens da história. A pergunta decisiva não é, portanto, «Como se pode crer num Deus bom, se há tanto mal?», mas «Como poderia o ser humano, com coração e inteligência, suportar a vida neste mundo se não existisse Deus?».

O mal não é indiferente a Deus. Deus toma a seu cuidado o pobre, a viúva e o órfão; reveste-se ele mesmo em seu Filho, da figura do Servo sofredor. Ele, o justo por excelência, consentiu em suportar a mais ignominiosa das mortes. Deus não quer o sofrimento: «Deus não fez a morte, e não se regozija em ver morrer os seres vivos» (Sb 1, 13). Foi por isso que o Filho de Deus a veio combater, numa espécie de luta corpo a corpo, a fim de que ela fosse «absorvida» na sua vitória (cf. 1Cor 15, 54). À luz do combate travado por Deus contra o mal, a fé impede-nos de nos resignarmos a ele, impelindo-nos a combater pela justiça e no exercício da caridade. A morte e a ressurreição de Cristo mostram-nos que o mal não tem a primeira nem a última palavra: do pior dos males Deus fez surgir o bem absoluto. Nós cremos que Deus, no Juízo Final, acabará com toda a injustiça. Na vida do mundo vindouro, o mal não terá mais lugar e o sofrimento acabará.

Deus sussurra nas nossas alegrias, fala na nossa consciência. Nas nossas dores, porém, Ele fala alto; elas são o seu megafone para despertar um mundo surdo (Clive Staples Lewis).

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Ano da Fé – XV

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O Homem criado à imagem e semelhança de Deus

A criação dos céus, da terra e de todos os seres vivos prepara a do homem que é, por assim dizer, a obra-prima de Deus, aquela que manifesta mais perfeitamente o esplendor de Deus e a possibilidade de entrar em comunhão com Ele. «Deus disse: “Façamos o homem à nossa imagem, à nossa semelhança”. Deus criou o homem à sua imagem, criou-o à imagem de Deus; Ele os criou homem e mulher» (Gn 1, 26-27). À imagem de Deus, o ser humano é dotado de inteligência e de liberdade; é capaz de amar, e de amar, em primeiro lugar, o seu Criador: «A Sagrada Escritura ensina-nos que o homem foi criado “à imagem de Deus”, capaz de conhecer e amar o seu Criador, constituído por Ele senhor de todas as criaturas terrestres, para as dominar e delas se servir, glorificando a Deus» (Gaudium et spes, 12).

O homem é a «única criatura sobre a terra que Deus quis por si mesma» (Gaudium et spes, 24. Homem e mulher, criados na alteridade, isto é, na capacidade do dom que os leva a reconhecerem-se um ao outro e a entrarem em diálogo, trazem em si mesma e única imagem divina. Cheio de admiração, o salmista pôde cantar: «Que é o homem para que Vos lembreis dele, o filho do homem para dele Vos ocupardes? Fizeste dele quase um ser divino, de honra e glória o coroaste; deste-lhe poder sobre a obra das vossas mãos, tudo submeteste a seus pés» (Sl 8, 5-7).

Se a única oração que fizesses em toda a tua vida fosse apenas: “Eu Te agradeço!”, isso já bastaria (Mestre Eckhart).

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Ano da Fé – XIV

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Os espíritos maus

É em referência à fé constante da Igreja e à sua fonte principal – o ensinamento de Cristo – que deve ser afirmada a existência de espíritos maus. A Sagrada Escritura faz alusão a uma “queda” original de certos anjos (cf. 2Pe 2, 4). A estes espíritos maus ela dá vários nomes: Lúcifer, Belial, Belzebú e sobretudo Satã. Estes nomes estão em relação com a sua acção maléfica (Satan é o Adversário).

A existência dos espíritos maus é igualmente testada nos evangelhos (cf. Mt 25, 41; Mc 1, 13; Lc 22, 31; Jo 13, 27, etc.). Esse testemunho vem também ao encontro da experiência que fazemos de forças ocultas que podem influenciar a nossa liberdade e marcar também a vida das sociedades, tantas vezes incapazes de realizarem os seus destinos. Eles impelem o homem a desobedecer a Deus.

Enquanto os anjos bons são associados à obra de Cristo, os espíritos maus, ou demónios, fazem-lhe obstáculo. No Pai Nosso, Jesus ensina aos seus discípulos a pedir ao Pai que não os exponha à tentação e que nos livre do Maligno (cf. Mt 6, 13). Entretanto o Evangelho anuncia a vitória definitiva de Cristo sobre todas as formas do mal. Por Ele a Criação é restituída à sua primeira destinação (cf. Mt 12, 28) e o homem restituído à sua liberdade de filho de Deus.

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Ano da Fé – XIII

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Os anjos

Falando de “coisas visíveis e invisíveis”, a fé cristã está a referir-se, ao mesmo tempo ao que cai debaixo da experiência sensível e ao que a ultrapassa. Aos olhos da fé, as realidades invisíveis não são menos reais do que as visíveis. Se os nossos sentidos não as podem alcançar, nem por isso estamos autorizados a dizer que são fruto da nossa imaginação. Entre as criaturas invisíveis de que fala a Bíblia, e que a Tradição cristã venera, contam-se os anjos. Na Bíblia, alguns anjos são reconhecidos pelo seu nome, sobretudo Miguel, Gabriel e Rafael. A designação que atribuímos a estes seres espirituais está associada à missão, que a tradição bíblica descreve: são mensageiros, enviados. Hoje, para dar credibilidade à existência destes seres espirituais precisamos de purificar o nosso pensamento de todas as imagens infantilizadas que lhes estão associadas Para muitas pessoas, os anjos são coisas apenas das crianças, um produto do imaginário infantil. Por outro lado, temos de admitir que será sempre difícil qualquer tipo de linguagem para nos referirmos às «coisas invisíveis». Fazem parte de uma dimensão à qual só podemos aceder pela fé. «Excluiríamos uma parte notável do Evangelho, se deixássemos de lado estes seres enviados por Deus, que anunciam a sua presença no meio de nós e constituem um sinal da mesma» (Bento XVI). A cada pessoa está atribuído um anjo específico: o anjo da guarda. Acompanha-a desde a infância até à morte com a sua protecção e intercessão.

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Ano da Fé – XII

Terra

Criador do céu e da terra (II)

Dom de Deus, a Criação traz a marca do seu Criador: “A partir da criação do mundo, os homens com a sua inteligência, podem ver, através das obras de Deus, o que é invisível: o seu poder eterno e a sua divindade” (Rm 1, 20). Mas, se se pode remontar das criaturas ao Criador, não se pode fazer da própria criação uma necessidade que se impusesse a Deus. Ela depende da sua livre vontade, que nos é manifestada pela Revelação. Reconhecida por Deus como boa (cf. Gn 1, 31), a Criação reflecte a própria bondade do Criador. Ela é o primeiro sinal daquilo que só poderemos compreender totalmente quando pomo os olhos em Jesus: “Deus é amor” (1Jo 4, 8).

Não se deve conceber a Criação da mesma maneira como se vêem fabricar os objectos do mundo, isto é, pela transformação de uma coisa noutra. Afirmar que Deus é Criador, é dizer que ele faz existir o que existe, incluindo a própria matéria de que o mundo é feito. Deus cria “a partir do nada”. O mundo não foi criado de uma vez para sempre, como se Deus, terminada a Criação, nada mais tivesse que fazer senão retirar-se. Ele não cessa de assegurar a existência do mundo. A Criação é portanto um acontecimento sempre actual. O acto criador renova-se a cada instante para manter a existência do mundo. Sem esta acção incessante de Deus, tudo voltaria ao nada.

Deus confia ao homem uma obra a continuar, para que o homem, pelo trabalho e pela arte, contribua para o aperfeiçoamento do mundo criado. Deus associou o homem à sua obra. Para nós, cristãos, a ecologia não é apenas uma questão ética, mas é, antes de tudo, uma questão teológica. Trata-se de ter a mesma atitude de Deus perante a Criação: cuidar dela com carinho, contemplando-a como «muito boa».

Não creiais que Deus nos proíbe totalmente de amar o mundo. Não! Devemos amá-lo, porque tudo aquilo a que Ele deu existência é digno do nosso amor (Santa Catarina de Sena).

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Ano da Fé – XI

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Criador do céu e da terra (I)

Deus, Pai todo-poderoso, é o «criador do céu e da terra». Assim professamos sempre com este artigo do «Credo», afirmando que o Pai todo-poderoso está na origem do dom mais radical e fontal que é a própria existência do ser humano e de todas as coisas. A criação é o início e o fundamento de todas as obras de Deus e de toda a história da salvação. A fé na criação torna explícita a resposta à questão elementar que os seres humanos de todos os tempos têm vindo a pôr-se: «De onde vimos?», «Para onde vamos?», «Qual é a nossa origem?», «Qual é o nosso fim?». Falar de criação significa enfrentar o problema das origens do mundo e do ser humano. Neste contexto, não faz sentido contrapor criação e evolução, porque não se trata somente de saber quando e como surgiu materialmente o cosmos, nem quando é que apareceu o ser humano; mas, sobretudo, de descobrir qual o sentido de tal origem. Assim como a explicação científica do nascimento de uma criança não contradiz a afirmação de que ela é o fruto do livre dom de amor dos seus pais, assim também acontece com a criação do mundo e do ser humano. Nenhuma explicação científica séria sobre este assunto está em oposição ao dado da fé, porque confessar que Deus é «criador do céu e da terra» significa afirmar que a origem do mundo e do ser humano não é governada pelo acaso, por um destino cego, por uma necessidade anónima, mas por um Ser transcendente, inteligente e bom, que é Deus. Deste ponto de vista, é significativo que na Bíblia a criação seja revelada como um momento de aliança de Deus com o Seu povo, como o primeiro e universal testemunho do amor todo-poderoso de Deus.

A existência inicia-se como um dom. E, precisamente por isso, deve ser acolhida com um obrigado! Então, a fé no Criador prepara-nos para experimentarmos a admiração, a gratidão e alegria por este dom. Esta evocação do dom do Criador refere «o céu e a terra», isto é «a totalidade do que existe», porque «céu e terra» constituem, por assim dizer, os extremos em que está contido todo o mundo da nossa experiência. Cada criatura depende de Deus e a Ele deve a sua existência e o facto de ser, de estar e de permanecer viva. Confessar a nossa fé em Deus «criador do céu e da terra» significa olhar para toda a realidade criada com profundo respeito, afastando de nós o orgulho e a avidez que a deturpam e empenhando-nos em guardá-la e cultivá-la, usando-a com um coração humilde e agradecido, solicitamente atentos aos direitos e às necessidades de todos.

 

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Ano da Fé – X

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Todo-Poderoso

O Credo confessa Deus como “Pai todo-poderoso”. A fé católica põe a omnipotência de Deus em relação com o título de Pai. Não é dominação arbitrária, mas soberania plena de sabedoria e de bondade à qual “nada é impossível” (Lc 1, 37; cf. Gn 18, 14). É a omnipotência amorosa de um pai: do “Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo” (2Cor 1, 3) que nos comunica o seu Espírito. A omnipotência deste Pai não vem esmagar, mas, pelo contrário, suscitar a vida, fazer voltar ao bem o que se lhe opõe, levantar o que está caído e mesmo vencer a morte. Manifestada na Criação, ela afirma-se, de maneira soberana, na cruz e na ressurreição de Jesus.

A fé na paternidade omnipotente de Deus exprime-se na piedade cristã como fé na Providência. A  fé cristã sabe que a bondade do Pai celeste envolve a existência dos seus filhos: Deus “faz com que tudo concorra para o seu bem” (Rm 8, 28). Não raramente se pergunta: “Então, onde está Deus?”. Ele diz-nos através do profeta Isaías: “Os meus pensamentos não são os vossos, nem os vossos caminhos são os meus” (Is 55, 8). A fé na Providência leva a uma atitude de profunda confiança e abandono e à oração, mas não justifica a nossa preguiça; pelo contrário, é fonte de generosidade, de coragem e de confiança.

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