Rumo ao porto da eternidade

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Às vezes sentia-me só, muito só. Como nos dias da minha vida de internato, quando passeava triste e doente pelo enorme pátio, não me cansava de repetir estas palavras que sempre faziam renascer a paz e a força no meu coração: “A vida é o teu navio e não a tua morada”. Quando era muito pequenina estas palavras levantavam-me o ânimo. E, no entanto, hoje, apesar dos anos que fazem com que desapareçam tantos sentimentos de piedade infantil, a imagem do navio continua a fascinar a minha alma, ajudando-me a suportar este desterro.

Santa Teresa do Menino Jesus

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Beato Isidoro Bakanja – 12 de Agosto

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Isidoro Bakanja nasceu em torno de 1885, no antigo Congo Belga, África. Converteu-se ao Cristianismo em 1906. No dia 6 de Maio de 1906, aos 21 anos de idade, foi baptizado, sendo o primeiro cristão da sua região. No baptismo, recebeu de presente um Rosário e o Escapulário de Nossa Senhora do Carmo, que nunca mais deixou de usar. Chamavam-no de o “leigo do Escapulário”.

Isidoro trabalhava na plantação de um colonizador belga, ateu, que não gostava de africanos convertidos. Dizia que rezavam demais e que perdiam tempo. A raiva do patrão foi crescendo e mandou que Isidoro lançasse fora o Escapulário. Isidoro recusou. Por isso foi chicoteado até ao ponto de as suas costas se transformarem numa chaga viva. A ferida infeccionou e, ao longo de seis meses, Isidoro viveu um verdadeiro calvário de sofrimentos. Morreu com o Rosário nas mãos e o Escapulário de Nossa Senhora do Carmo no seu pescoço, no dia 15 de Agosto de 1909. Perdoou ao seu algoz e prometeu rezar por ele quando ingressasse no céu. O Papa João Paulo II beatificou-o em 1994 e chamou-o de “mártir do Escapulário”.

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19º Domingo do Tempo Comum – Ano A

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Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus (Mt 14, 22-33)

Depois, Jesus obrigou os discípulos a embarcar e a ir adiante para a outra margem, enquanto Ele despedia as multidões. Logo que as despediu, subiu a um monte para orar na solidão. E, chegada a noite, estava ali só. O barco encontrava-se já a várias centenas de metros da terra, açoitado pelas ondas, pois o vento era contrário. De madrugada, Jesus foi ter com eles, caminhando sobre o mar. Ao verem-no caminhar sobre o mar, os discípulos assustaram-se e disseram: «É um fantasma!» E gritaram com medo. No mesmo instante, Jesus falou-lhes, dizendo: «Tranquilizai-vos! Sou Eu! Não temais!» Pedro respondeu-lhe: «Se és Tu, Senhor, manda-me ir ter contigo sobre as águas.» «Vem» – disse-lhe Jesus. E Pedro, descendo do barco, caminhou sobre as águas para ir ter com Jesus. Mas, sentindo a violência do vento, teve medo e, começando a ir ao fundo, gritou: «Salva-me, Senhor!» Imediatamente Jesus estendeu-lhe a mão, segurou-o e disse-lhe: «Homem de pouca fé, porque duvidaste?» E, quando entraram no barco, o vento amainou. Os que se encontravam no barco prostraram-se diante de Jesus, dizendo: «Tu és, realmente, o Filho de Deus!»

Mensagem

No relato de Mateus proposto para o 19º do Tempo Comum, Ano A, (Mt 14, 22-33), os discípulos vão sozinhos na barca, sem Jesus. Mas surgem problemas, que os discípulos, sozinhos, não conseguem resolver. Esta importante cena serve para mostrar que, sem Jesus, os discípulos não conseguem ter sucesso. A barca serve para atravessar o mar encapelado, que são as perseguições, deste mundo. Mas apenas na companhia de Jesus. Ontem como hoje!

A referência ao caminhar de Jesus sobre as águas é claramente um indicador divino, pois Deus é Aquele “cuja estrada é no meio do mar, e o seu caminho sobre as muitas águas” (Sl 77, 20). Mas Mateus empresta a este episódio uma tonalidade própria, pois é o único a inserir o diálogo de Pedro com Jesus. Também Pedro caminha sobre as águas, a seu pedido, e seguindo a ordem de Jesus: “Vem!”. Entenda-se bem: Pedro caminha sobre as águas como Jesus, mas não com autoridade própria. O que Pedro faz assenta na Palavra de Jesus e na Fé que o liga a Jesus. Importante lição: Pedro faz o mesmo que faz Jesus enquanto permanecer vinculado a Jesus pela Fé. Esmorecendo a Fé em Jesus, Pedro torna-se presa fácil de outras forças e sucumbirá no meio da tempestade. Pedro como nós. Sentindo o perigo, Pedro grita: “Salva-me, Senhor!”. E sente logo a mão de Jesus que o segura. Nós como Pedro.

Pedro é, aqui, o porta-voz e o representante da comunidade dos discípulos que vai no barco (a Igreja). O episódio reflecte a fragilidade da fé dos discípulos, sempre que têm de enfrentar as forças da opressão, do egoísmo, da injustiça. Jesus comunicou aos seus o poder de vencerem todos os poderes deste mundo que se opõem à vida, à libertação, à realização, à felicidade dos homens. No entanto, enquanto enfrentam as ondas do mundo hostil e os ventos soprados pelas forças da morte, os discípulos debatem-se entre a confiança em Jesus e o medo. Mateus refere-se, desta forma, à experiência de muitos discípulos (da sua comunidade e das comunidades cristãs de todos os tempos e lugares) que seguem a Jesus de forma decidida, mas que se deixam abalar quando chegam as perseguições, os sofrimentos, as dificuldades. Então, começam a afundar-se e a ser submergidos pelo “mar” da morte, da frustração, do desânimo, da desilusão. No entanto, Jesus lá está para lhes estender a mão e para os sustentar.

Finalmente, a desconfiança dos discípulos transforma-se em fé firme: “Tu és verdadeiramente o Filho de Deus” (vers. 33). É para aqui que converge todo o relato. Esta confissão reflecte a fé dos verdadeiros discípulos, que vêem em Jesus o Deus que vence o “mar”, o Senhor da vida e da história que acompanha a caminhada dos seus, que lhes dá a força para vencer as forças da opressão e da morte, que lhes estende a mão quando eles estão desanimados e com medo e que não os deixa afundar.

Palavra para o caminho

Se somos sinceros, devemos confessar que há uma distância enorme entre o crente que professamos ser e o crente que somos na realidade. Que fazer ao constarmos em nós uma fé, às vezes, tão frágil e vacilante?

Primeiro, não desesperar nem assustar-se ao descobrir em nós dúvidas e hesitações. A busca de Deus vive-se quase sempre na insegurança, na obscuridade e no risco. É “tacteando” que se procura Deus. Não devemos esquecer que muitas vezes “a fé genuína só pode aparecer como dúvida superada” (Ladislao Boros).

O importante é aceitar o mistério de Deus com o coração aberto. A nossa fé depende da verdade da relação com ele. E não é necessário esperar que as nossas interrogações e dúvidas se resolvam para viver, verdadeiramente, diante desse Pai.

Por isso, o importante é saber clamar como Pedro: “Senhor, salva-me”. Saber levantar para Deus as nossas mãos vazias, não só como gesto de súplica, mas também como entrega confiante de alguém que se sabe pequeno, ignorante e necessitado de salvação. Não esqueçamos que a fé é “caminhar sobre as águas”, mas com a possibilidade de encontrar sempre essa mão que nos salva quando nos começamos a afundar.

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Santa Teresa Benedita da Cruz – 9 de Agosto

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Santa Teresa benedita da Cruz (Edith Stein) nasceu a 12 de Outubro de 1891, no seio de uma família de judeus. A cidade que a viu nascer chama-se Breslau, na Alemanha. Apaixonadíssima pela busca e conhecimento da verdade, procurou-a com toda a força da sua alma, desde a sua juventude. Não encontrou a verdade, nem na religião judaica nem na filosofia que entretanto estudou e ensinou como professora na Universidade de Gottingen. Um dia, encontrando o Livro da Vida, escrito por Santa Teresa de Jesus, exclamou entusiasmada: «Esta é a verdade!», e não parou de ler enquanto não terminou o livro.

Baptizou-se em 1922, tomando o nome de Teresa. Em 1933 entrou no Carmelo da Cidade de Colónia, tomando o nome de Teresa Benedita da Cruz; pois, como dizia, foi Santa Teresa quem a despertou para a Verdade e, em S. João da Cruz encontrou a perfeita vivência do mistério da Paixão, a razão do seu viver. Imitando-o tomou o nome da Cruz. Ofereceu-se como vítima de Deus, pelo seu povo e pela paz.

Antes de ingressar no Carmelo, algumas pessoas influentes tentaram demovê-la da sua decisão, dizendo-lhe que era mais útil na Universidade que no convento. Ao que Edith Stein respondeu dizendo: «Não é a actividade humana que nos há-de salvar, mas a Paixão de Cristo. Tomar parte nela é a minha aspiração». E depois de se ter tornado carmelita acrescentou: «A oração e o sacrifício valem muito mais do que se possa pensar… Por toda e qualquer oração, mesmo pela mais pequenina, acontece algo na Igreja… Aprendamos a servir-nos da oração, para que à hora, de cada dia, fazermos uma obra de eternidade».

A perseguição anti-semita punha a sua vida em perigo. Os superiores decidiram, por isso, que deixasse a Alemanha, e transferiram-na para um Carmelo na Holanda. Foi-lhe muito difícil abandonar o Carmelo de Colónia onde entrara na Festa de Santa Teresa, a 15 de Outubro de 1933. Acerca do Carmelo escreveu dizendo: «É o santuário mais íntimo que a Igreja tem. Sempre me pareceu que Deus me tinha reservado, no Carmelo, alguma coisa que em nenhuma outra parte do mundo me poderia dar».

Após a invasão da Holanda por Hitler, a terrível polícia SS foi arrancá-la à clausura do Carmelo. A Irmã Teresa da Cruz saudou os polícias com a saudação cristã «Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo», porque como disse, estava convencida que com «aquela saudação não saudava a polícia alemã, antes os representantes daquela luta antiga entre Cristo e o Demónio». No dia 9 de Agosto de 1942, foi conduzida à câmara de gás, repetindo pela última vez o que já deixara escrito antes: «Não sou nada e nada valho, mas… quero oferecer-me ao Coração de Jesus como vítima pela verdadeira paz. Que seja derrubado o poder do Anti-Cristo e a ordem se volte a estabelecer». Diante da morte soube manter-se serena até ser acolhida pelas mãos de Deus, das quais deixou dito: «Aquelas mãos dão e pedem ao mesmo tempo. Vós sábios, deponde a vossa sabedoria e tornai-nos simples como crianças. Segui-me porque é preciso decidir entre a luz e as trevas». Morreu no campo de concentração de Aushwitz, repetindo a sua doação como vitima pela paz e pelo seu povo de Israel.

Mulher de singular inteligência e cultura, afamada professora universitária de Filosofia, deixou-nos numerosos escritos de elevada doutrina e profunda espiritualidade. O centro da sua vida e da sua contemplação na oração, pode comprovar-se pelos seus escritos, era o mesmo de S. João da Cruz: o mistério grandioso de Cristo Crucificado.

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Por ti

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Só por causa de ti, ainda que fosse para vir uma só vez para ti, Jesus teria ficado na solidão de um tabernáculo durante séculos: medita isto e corresponde-Lhe.

Beata Maria Cândida da Eucaristia

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Frases de São Filipe Néri, o santo da alegria

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– Ser misericordioso com os que caíram é o melhor meio para não cairmos nós mesmos!

– Na guerra pela pureza só vencem os covardes, isto é, aqueles que fogem!

– Quem quiser outra coisa que não seja Cristo, não sabe aquilo que quer; quem pede outra coisa que não seja Cristo, não sabe aquilo que faz.

– A grandeza do amor que se tem a Deus, é medida pela grandeza do desejo de sofrer muito por amor de Deus; quem se impacienta com a cruz, achará uma outra mais pesada.

– Os sofrimentos deste mundo são a melhor escola do desprezo do mundo; quem não se matricular nesta escola, merece dó, porque é um infeliz.

– Basta, Senhor, basta! Suspendei a torrente de vossas consolações, porque não tenho forças para receber tantas delícias.

– Ó meu Deus tão amável, por que não me destes um coração capaz de Vos amar condignamente?

– Quem não puder dedicar longo tempo à oração deve, pelo menos, elevar muitas vezes o seu coração a Deus.

– É possível restaurar as instituições com a santidade, e não restaurar a santidade com as instituições.

– Esta só razão devia bastar para manter alegre um fiel – saber que tem a Virgem Maria junto de Deus, que pede por ele.

– Somente a Comunhão pode conservar puro um coração aos vinte anos! Não pode haver castidade sem Eucaristia.

– Quem quiser que lhe obedeçam muito, mande pouco.

– Longe de mim, o pecado e a tristeza!

– Não pode acontecer coisa mais gloriosa a um cristão do que padecer por amor de Cristo.

 

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18º Domingo do Tempo Comum – Ano A

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Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus (Mt 14, 13-21)

Tendo ouvido isto, Jesus retirou-se dali sozinho num barco, para um lugar deserto; mas o povo, quando soube, seguiu-o a pé, desde as cidades. Ao desembarcar, Jesus viu uma grande multidão e, cheio de misericórdia para com ela, curou os seus enfermos. Ao entardecer, os discípulos aproximaram-se dele e disseram-lhe: «Este sítio é deserto e a hora já vai avançada. Manda embora a multidão, para que possa ir às aldeias comprar alimento.» Mas Jesus disse-lhes: «Não é preciso que eles vão; dai-lhes vós mesmos de comer.» Responderam: «Não temos aqui senão cinco pães e dois peixes.» «Trazei-mos cá» – disse Ele. E, depois de ordenar à multidão que se sentasse na relva, tomou os cinco pães e os dois peixes, ergueu os olhos ao céu e pronunciou a bênção; partiu, depois, os pães e deu-os aos discípulos, e estes distribuíram-nos pela multidão. Todos comeram e ficaram saciados; e, com o que sobejou, encheram doze cestos. Ora, os que comeram eram uns cinco mil homens, sem contar mulheres e crianças.

Mensagem

O Evangelho deste 18º Domingo do Tempo Comum (Mt 14, 13-21) é conhecido como a primeira «multiplicação dos pães», realizada, neste caso, em mundo judaico. Mas vê-se bem que o título de «multiplicação» é inadequado, pois o que está aqui em causa não é, na verdade, uma multiplicação, mas uma divisão ou condivisão.

Neste episódio, salta à vista o comportamento compassivo, acolhedor, inclusivo e de partilha de Jesus em confronto com o comportamento insensível, não acolhedor, exclusivista, frio, mercantilista, consumista, egoísta, e egocêntrico destes discípulos de Jesus, que propõem a Jesus que mande as pessoas embora, para que cada um, compre de comer para si mesmo (Mt 14,15).

Vistas bem as coisas, o comportamento destes discípulos, e se calhar o nosso também, opõe-se ponto por ponto, ao comportamento de Jesus: A celebração da Eucaristia, com Jesus sempre no meio de nós, reclama que mudemos tantas maneiras de fazer!

De notar que, aos olhos atónitos dos discípulos e aos nossos, Jesus não fez uma operação de «multiplicação» dos pães, mas de «divisão» e «condivisão», «partilha» dos pães! O milagre de Jesus – aquilo que suscita surpresa e maravilha – não consiste em aumentar a quantidade do pão (que permanece a mesma), mas em abrir os olhos aos Seus discípulos e a nós que, como cegos, só conhecemos e pensamos na lógica do vender e do comprar e não chegamos a saborear a lógica da gratuitidade, que é a do nosso Pai celeste que faz nascer o sol para os bons e para os maus. Entrar nesta lógica é acreditar na força do dom e ir por este mundo consumista, partindo o pão e dividindo-o com a clara consciência de que onde isto acontecer, não só se instaura o necessário para todos («todos comeram e foram saciados»), mas instaura-se igualmente o “excesso”, a superabundância da graça («os discípulos encheram doze cestos).

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Santo tabernáculo

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Quantas vezes, especialmente à noite, olhando o santo Tabernáculo e respirando de felicidade, penso e digo: “De tudo quanto há nesta terra de grande, de belo, de precioso, nada há que iguale o Tesouro que aqui se esconde. Está aqui o único Tesouro que existe sobre a terra e eu possuo-O, vivo perto d’Ele”.

Beata Maria Cândida da Eucaristia

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17º Domingo do Tempo Comum – Ano A

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Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus (Mt 13, 44-52)

Naquele tempo, disse Jesus às multidões: «O Reino do Céu é semelhante a um tesouro escondido num campo, que um homem encontra. Volta a escondê-lo e, cheio de alegria, vai, vende tudo o que possui e compra o campo. O Reino do Céu é também semelhante a um negociante que busca boas pérolas. Tendo encontrado uma pérola de grande valor, vende tudo quanto possui e compra a pérola.» «O Reino do Céu é ainda semelhante a uma rede que, lançada ao mar, apanha toda a espécie de peixes. Logo que ela se enche, os pescadores puxam-na para a praia, sentam-se e escolhem os bons para as canastras, e os ruins, deitam-nos fora. Assim será no fim do mundo: sairão os anjos e separarão os maus do meio dos justos, para os lançarem na fornalha ardente: ali haverá choro e ranger de dentes.»

«Compreendestes tudo isto?» «Sim» – responderam eles. Jesus disse-lhes, então: «Por isso, todo o doutor da Lei instruído acerca do Reino do Céu é semelhante a um pai de família, que tira coisas novas e velhas do seu tesouro.»

Mensagem

A primeira parábola do Evangelho de hoje fala de um homem que por mero acaso, descobre no campo onde trabalhava um tesouro; volta a escondê-lo, vai vender tudo o que tem e compra o campo. O tesouro de que Jesus fala é o Reino dos Céus, a condição nova em que entra quem acolhe a proposta das bem-aventuranças. Tem um valor incalculável, e vai sendo progressivamente descoberto somente por quem decide apostar nele a própria vida.

O facto que este tesouro seja encontrado por acaso indica a sua gratuitidade: Deus oferece-o aos homens sem nenhum mérito da parte deles: não é um prémio pelas suas boas obras. Mas há um comportamento que é preciso assumir perante este dom. Quem o descobre não pode ter hesitações, perplexidades, dúvidas. A decisão tem que ser tomada com urgência, a escolha é inadiável. Não se pode faltar ao encontro marcado com o Senhor. E depois é preciso apostar tudo. Não é pedido que se renuncie a alguma coisa, mas que se concentrem os pensamentos, as atenções, os interesses, todos os esforços no novo objectivo. O tesouro – como irá acontecer também com a pérola – não é adquirido para ser depois vendido outra vez e assim permitir que se volte a possuir os bens antigos; é adquirido em substituição de tudo aquilo que, até àquele momento, tinha dado sentido à vida. A descoberta do Reino de Deus comporta uma mudança radical. É este o significado da decisão de «vender tudo quanto se possui para comprar o campo».

Uma tal mudança provoca surpresa, admiração, perplexidade. Quem não descobriu o mesmo tesouro não se consegue capacitar, não encontra uma explicação que justifique a novidade de vida para quem entrou no Reino de Deus. Quem viu o camponês vender tudo para comprar o campo deve ter pensado que tinha enlouquecido: a terra árida e pedregosa da Palestina não justificava tais sacrifícios. Só ele estava consciente da sua escolha: aquele era o negócio da sua vida.

Mas havia um sinal, pelo qual todos deveriam ter percebido que agia com lucidez e sabendo o que fazia: a alegria. Quem percebeu ter nas mãos um tesouro inesperado não pode deixar de se encher de alegria.

Na segunda parábola o protagonista não é um pobre trabalhador rural, mas um rico negociante que anda pelo mundo com um objectivo bem determinado: encontrar pérolas. Na Antiguidade, as pérolas eram tão preciosas como são hoje os diamantes. Sendo consideradas de grande valor, Jesus escolheu-as como imagem do tesouro inestimável que Ele oferecia: o Reino de Deus. Ao contrário de um camponês que embate por acaso num tesouro, o negociante encontra a pérola após uma pesquisa extenuante. Num caso, a descoberta é fruto da sorte; no outro, do empenho. O comportamento do negociante é a imagem da pessoa que procura apaixonadamente aquilo que pode dar sentido à vida e encher de alegria os seus dias. As duas parábolas completam-se: por um lado, o Reino de Deus é um dom gratuito do próprio Deus; por outro, é também fruto do empenho da pessoa.

A terceira parábola retoma o tema da parábola do trigo e do joio, tratado no domingo passado. A imagem é tomada da pesca no lago de Tiberíades, onde eram utilizadas grandes redes de arrasto, que capturavam peixes bons mas também peixes não comestíveis ou impuros (Lv 11, 10-11). Na praia, os pescadores procediam á separação. Assim – diz Jesus – acontece no Reino dos Céus.

Segundo a concepção dos antigos, o mar era o reino das forças diabólicas, inimigas da vida. Era confiada aos discípulos a missão de «pescar homens», subtraindo-os ao poder do mal. Paixões irreprimíveis, egoísmo, inveja são como ondas impetuosas que, como um turbilhão, os arrastam para o abismo. O Reino dos Céus é uma rede que os tira para fora, os deixa respirar, os traz para a luz, para a salvação. Nesta rede não são acolhidos apenas os bons, mas toda a gente, sem distinção. O Reino de Deus não se apresenta, hoje, em estado puro; na comunidade cristã deve ser admitida serenamente, ao lado do bem, também a presença do mal e do pecado. Ninguém, mesmo sendo impuro, se deve sentir excluído ou deve ser marginalizado. Este é o tempo da misericórdia e da paciência de Deus, que «não quer que ninguém pereça, mas que todos se convertam» (2Pd 3,9). Chegará, certamente, o momento da separação.

O discurso de Jesus termina com a pergunta: «Entendeste tudo isto?» e com a evocação da obra do escriba. A pergunta é dirigida aos discípulos, àqueles que encontraram o tesouro e a pedra preciosa. O Reino dos Céus que agora possuem foi preparado através do Antigo Testamento (as coisas velhas) e realizado em Cristo (as coisas novas). Os cristãos são convidados a tomar consciência, pelo estudo das Sagradas Escrituras, do dom imenso que receberam de Deus.

Palavra para o caminho

As duas pequeninas parábolas, a do tesouro escondido no campo e a da pérola preciosíssima, constituem dois fortíssimos acenos a deixar tudo por amor, para, por um amor maior, seguir Jesus, que é o Reino de Deus em Pessoa. É Ele o tesouro escondido, é Ele a pérola preciosíssima. Para o seguir, é mesmo necessário deixar tudo (Lc 14, 33).

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Oração de Judite de Sousa

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Meu Deus e meu Pai! Desfeito em átomos de água, partiu hoje para o teu infinito o filho que me deste. Gerei-o com amor, criei-o com carinho e eduquei-o o melhor que soube. Foi meu companheiro e meu ânimo nas muitas tempestades que tenho atravessado. Hoje não tenho nada. O muito que tinha foi para junto de ti. A sua alma de menino e o que restou do seu corpo de anjo também já foi desfeito em fumo. Estou só. Terrivelmente só. Só como há séculos, quando a tua mãe, nossa Senhora, te acolheu no regaço depois de te despregarem da cruz no calvário. Eu agora nada tenho. Nas distorcidas imagens que os meus olhos rasos de lágrimas salgadas e já secas, vejo nitidamente, o teu rosto misericordioso. No plano infinito da eternidade já está o meu menino. Tapa-o com o teu manto divino que as noites são frias para lá do Universo, ele é um bom menino. O meu menino! E se vires que pode merecer alguma coisa da dor desta perda sem remédio, rogo-te, meu Pai, que pronto me leves a vê-lo, que nestes dias as saudades apertam mais este meu coração trespassado pela dor. Eu só fui mãe deste filho. Hoje, já não sou mais mãe de ninguém.

Judite de Sousa

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