São Nuno de Santa Maria – 6 de Novembro

Neste dia, 6 de Novembro, em que a Ordem Carmelita celebra a festa de São Nuno, apresentamos três traços da “identidade” de São Nuno de Santa Maria (Nuno Álvares Pereira).

Uma das características que mais chama à atenção é, sem dúvida alguma, a humildade. Não apenas no fim da sua vida, quando, sendo já carmelita, viveu de maneira totalmente austera e penitente, mas, mesmo sendo Condestável e uma das figuras mais célebres e admiradas da Coroa portuguesa, Nuno foi sempre um homem humilde, um homem que fugiu das honras excessivas e das ambições de poder.

Um dos traços que sobressai do perfil espiritual de São Nuno é a sua profunda piedade eucarística. Indubitavelmente, esta piedade aconteceu nos moldes e formas típicas daquela época. É bem conhecido o seu desejo de restaurar as igrejas devastadas pela guerra ou por qualquer outra causa, para que a Eucaristia pudesse ser celebrada com dignidade. Fundou ou restaurou também confrarias do Santíssimo Sacramento em muitos lugares, e fomentou as celebrações do “Corpo de Cristo”, insistindo e ordenando que estas se fizessem com solenidade, decoro e piedade, e tudo isto, precisamente numa época da história da Igreja em que surgiram, em diversos lugares, críticas à ideia da presença real. De igual modo, quer como Condestável do Exército, quer no convento, participava frequentemente na Eucaristia, preparando-se espiritualmente com muita seriedade e com penitências e jejuns. 

Outra característica muito definida do perfil espiritual de São Nuno foi a sua devoção à Virgem Maria. Já na sua vida de soldado se encomendava sempre à Virgem Santíssima, antes das batalhas, e pedia também aos soldados que o fizessem. Tinha plena confiança na protecção de Nossa Senhora. Jejuava frequentemente em honra de Nossa Senhora e fomentava sempre a devoção mariana no meio daqueles que o rodeavam. De igual modo, no fim das batalhas, costumava peregrinar a algum santuário mariano. Por isso mandou reconstruir alguns deles que estavam abandonados ou em mau estado. Ele mesmo pagou a reconstrução de alguns templos, ou mandou construir novos, ou decorá-los dignamente.

Logicamente que a piedade mariana de Nuno cresceu com o contacto com os carmelitas e, sobretudo, ao ingressar no convento de Lisboa como irmão donato. O facto de ter escolhido, como nome religioso, o de “Nuno de Santa Maria” é, a todos os títulos, significativo.

Oração

Pai Santo, em Jesus Cristo mostrastes a São Nuno de Santa Maria o valor supremo do Vosso Reino. Para o acolher, ele pôs a render, como servo fiel, os dons que lhe concedestes, no serviço a Deus, à Igreja, à Pátria, ao próximo, especialmente aos mais necessitados, e a Maria Santíssima, por quem se enamorou e se entregou, quer na vida pública ao serviço do bem comum quer na vida conventual do Carmo de Lisboa, onde ingressou como religioso carmelita.

Concedei-nos, por sua intercessão, a graça… (nomeá-la), para que também nós possamos viver sempre ao Vosso serviço e, combatendo o bom combate da fé, um dia tenhamos parte no Banquete do Reino dos Céus. Por Jesus Cristo, Senhor nosso. Amen.

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Adquirimos no céu uma habitação eterna

A vida nova, recebida no Baptismo, não está sujeita à corrupção e ao poder da morte. Para quem vive em Cristo a morte é a passagem da peregrinação terrena para a pátria do Céu, onde o Pai acolhe todos os seus filhos, “de toda a nação, raça, povo e língua” (Ap 7, 9).

Bento XVI

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31º Domingo do Tempo Comum – Ano C

Zaqueu, desce depressa, pois hoje devo ficar em tua casa (Lc 10, 5)

O Evangelho de hoje coloca-nos no seguimento de Jesus que, no caminho para Jerusalém, faz uma paragem em Jericó. Havia uma grande multidão para recebê-lo, incluindo um homem chamado Zaqueu, chefe de publicanos, isto é, aqueles judeus que cobravam impostos em nome do império romano. Ele era rico não devido a ganhos honestos.

Zaqueu tentava ver quem era Jesus. Estava curioso. E sendo de baixa estatura, para conseguir vê-lo sobe a uma árvore. Quando Jesus chega ao local, olha para cima e vê-lo. O primeiro olhar não é de Zaqueu, mas de Jesus, que entre os muitos rostos que o cercavam procura exactamente aquele. O olhar misericordioso do Senhor alcança-nos antes mesmo que nós percebamos ter necessidade de sermos salvos. E com esse olhar do divino Mestre, começa o milagre da conversão do pecador. De facto, Jesus chama-o pelo nome: “Zaqueu, desce depressa, pois hoje devo ficar em tua casa”. Ele não o censura, não lhe faz um “sermão”; diz que deve ir até ele: “deve”, porque é a vontade do Pai. Apesar dos murmúrios das pessoas, Jesus escolhe parar na casa daquele pecador público.

Nós também teríamos ficado escandalizados com esse comportamento de Jesus. Mas o desprezo e o fechamento em relação ao pecador não fazem senão isolá-lo e endurecê-lo no mal que ele faz contra si e contra a comunidade. Em vez disso, Deus condena o pecado, mas tenta salvar o pecador, vai procurá-lo para trazê-lo de volta ao caminho recto. Quem nunca se sentiu procurado pela misericórdia de Deus, tem dificuldade em compreender a extraordinária grandeza dos gestos e palavras com que Jesus se aproxima de Zaqueu.

O acolhimento e a atenção que Jesus dá a Zaqueu, levam aquele homem a uma clara mudança de mentalidade: ele percebe quanto é mesquinha uma vida movida pelo dinheiro, à custa de roubar os outros e ser desprezado por eles. Ter o Senhor ali, em sua casa, faz com que ele veja tudo com olhos diferentes. E muda também o seu modo de ver e de usar o dinheiro: substitui o gesto de extorquir pelo de dar. De facto, decide dar metade do que possui aos pobres e restituir quatro vezes mais àqueles a quem roubou. Zaqueu descobre através do encontro com Jesus que é possível amar gratuitamente: até agora ele era avarento, agora torna-se generoso; gostava de acumular, agora alegra-se em distribuir. Encontrando o Amor, descobrindo ser amado apesar de seus pecados, ele torna-se capaz de amar os outros, fazendo do dinheiro um sinal de solidariedade e de comunhão.

Papa Francisco, Angelus (resumo), 3 de Novembro, 2019

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Comemoração de todos os fiéis defuntos – 2 de Novembro

Hino

Nós te rogamos, Senhor, / Pelos irmãos que morreram / E à procura do teu rosto / À tua porta bateram.

Recebe-os junto de Ti / Por tua grande bondade, / Teu amor os transfigure / Em divina claridade.

Pelo sangue que na Cruz / Por todos foi derramado, / Perdoa suas ofensas, / Purifica-os do pecado.

Lembra-te, Pai, que era frágil / O barro de que os fizeste. / Compadecido, recebe-os / Na tua glória celeste.

Os nossos rogos aceite / O teu coração paterno. / No esplendor da luz perpétua, / Dá-lhes o descanso eterno.

Prefácio da missa dos fiéis defuntos

Senhor, Pai santo, Deus eterno e omnipotente, é verdadeiramente nosso dever, é nossa salvação, dar-Vos graças, sempre e em toda a parte, por Cristo, nosso Senhor. N’Ele brilhou para nós a esperança da feliz ressurreição; e se a certeza da morte nos entristece, conforta-nos a promessa da imortalidade. Para os que crêem em Vós, Senhor, a vida não acaba, apenas se transforma; e, desfeita a morada deste exílio terrestre, adquirimos no céu uma habitação eterna, Por isso, com os Anjos e os Arcanjos e todos os coros celestes, proclamamos a vossa glória, cantando numa só voz: Santo, Santo, Santo…

Pai nosso… Ave Maria… Glória…

Oração

Deus, Pai de misericórdia, escutai benignamente as nossas orações, para que, ao confessarmos a fé na ressurreição do vosso Filho, se confirme em nós a esperança da ressurreição dos vossos servos. Por Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que é Deus convosco na unidade do Espírito Santo.  Amen.

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A santidade é dom e chamamento

A Solenidade de Todos os Santos lembra-nos que todos somos chamados à santidade. Os Santos e as Santas de todos os tempos não são simplesmente símbolos, seres humanos distantes, inalcançáveis. São pessoas que viveram com os pés no chão; eles experimentaram a fadiga diária da existência com os seus sucessos e fracassos, encontrando no Senhor a força para se levantar e continuar o caminho. Isto demonstra que a santidade é uma meta que não pode ser alcançada apenas pelas próprias forças, mas é o fruto da graça de Deus e da nossa livre resposta a ela. Portanto, a santidade é dom e chamamento.

A graça de Deus é algo que não podemos comprar ou trocar, mas acolher, participando assim da mesma vida divina através do Espírito Santo que habita em nós desde o dia do nosso Baptismo. A semente da santidade é precisamente o Baptismo. Trata-se de amadurecer sempre mais a consciência de que estamos enxertados em Cristo, como o ramo está unido à videira, e por isso podemos e devemos viver com Ele e Nele como filhos de Deus. Então a santidade é viver em plena comunhão com Deus, já agora, durante a peregrinação terrena.

A santidade além de ser um dom, é também um chamamento, uma vocação comum a todos nós, aos discípulos de Cristo; é o caminho de plenitude que cada cristão é chamado a percorrer na fé, caminhando para a meta final: a comunhão definitiva com Deus na vida eterna.

A santidade torna-se assim uma resposta ao dom de Deus, porque se manifesta como assunção de responsabilidade. Nesta perspectiva, é importante assumir um sério e quotidiano compromisso de santificação nas condições, deveres e circunstâncias da nossa vida, procurando viver tudo com amor, com caridade.

Os Santos que celebramos hoje na liturgia são irmãos e irmãs que admitiram nas suas vidas a necessidade dessa luz divina, de abandonar-se a ela com confiança. E agora, diante do trono de Deus, cantam a sua glória por toda a eternidade.

Os Santos constituem a “Cidade santa”, a qual olhamos com esperança como nossa meta definitiva, enquanto somos peregrinos na “cidade terrena”. Caminhamos para a “Cidade santa”, onde esses Santos irmãos e irmãs nos esperam.

É certo, estamos cansados ​​das dificuldades do caminho, mas a esperança dá-nos a força para seguir em frente. Olhando para as vidas dos Santos, somos encorajados a imitá-los. Entre eles, estão muitas testemunhas de uma santidade “da porta ao lado”, daqueles que vivem perto de nós e são reflexo da presença de Deus.

A recordação dos Santos leva-nos a erguer os olhos para o Céu: não para esquecer as realidades da terra, mas para enfrentá-las com mais coragem e esperança.

Papa Francisco, Angelus (resumo), 1 de Novembro, 2019

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Solenidade de Todos os Santos – 1 de Novembro

Ladainha de todos os santos

Senhor, tende piedade de nós. / Cristo, tende piedade de nós. / Senhor, tende piedade de nós.

Jesus Cristo, ouvi-nos. / Jesus Cristo, atendei-nos. / Deus Pai do Céu, tende piedade de nós. / Deus Filho, Redentor do mundo, tende piedade de nós. / Deus Espírito Santo, tende piedade de nós. / Santíssima Trindade, que sois um só Deus, tende piedade de nós.

Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por nós. / São Miguel, rogai por nós. / São Gabriel, rogai por nós. / São Rafael, rogai por nós. / Santos Anjos de Deus, rogai por nós. / São João Baptista, rogai por nós. / São José, rogai por nós. / São Pedro e São Paulo, rogai por nós. / Santo André, rogai por nós. / São João, rogai por nós. / Santa Maria Madalena, rogai por nós. / Santo Estêvão, rogai por nós. / São Lourenço, rogai por nós. / Santa Perpétua e Santa Felicidade, rogai por nós. / Santa Inês, rogai por nós. / Santa Cecília, rogai por nós. / Santa Águeda, rogai por nós. / Santa Anastácia, rogai por nós. / Santo Inácio de Antioquia, rogai por nós. / São Gregório, rogai por nós. / Santo Agostinho, rogai por nós. / Santo Atanásio, rogai por nós. / São Basílio, rogai por nós. / São Bento, rogai por nós. / São Martinho, rogai por nós. / São Domingos Gusmão, rogai por nós. / São Francisco de Assis, rogai por nós. / Santa Clara de Assis, rogai por nós. / Santo António de Lisboa, rogai por nós. / São Francisco Xavier, rogai por nós. / São João Maria Vianney, rogai por nós. / Santa Catarina de Sena, rogai por nós. / Santa Madre Teresa de Calcutá, rogai por nós. / Santa Teresa de Jesus, rogai por nós. / São João Paulo II, rogai por nós. / São João da Cruz, rogai por nós. / São Nuno de Santa Maria, rogai por nós. / Santos Francisco e Jacinta Marto, rogai por nós. / Todos os Santos de “ao pé da porta”, rogai por nós. / Todos os Santos e Santas de Deus, rogai por nós.

Sede-nos propício, ouvi-nos, Senhor. / Para que nos livreis de todo mal, ouvi-nos, Senhor. / Para que nos livreis da morte eterna, ouvi-nos, Senhor. / Pela vossa encarnação, ouvi-nos, Senhor. / Pela vossa morte e ressurreição, ouvi-nos, Senhor. / Pela efusão do Espírito Santo, ouvi-nos, Senhor. / Apesar dos nossos pecados, ouvi-nos, Senhor.

Para que vos digneis conduzir e proteger a vossa Igreja, ouvi-nos, Senhor. / Para que vos digneis conservar no vosso santo serviço o Papa, os Bispos e todo o clero, ouvi-nos, Senhor. / Para que vos digneis conceder a todos os povos a paz e a verdadeira concórdia, ouvi-nos, Senhor.

Cristo, ouvi-nos. / Cristo, atendei-nos.

Cordeiro de Deus, que tirais os pecados do mundo, perdoai-nos, Senhor. / Cordeiro de Deus, que tirais os pecados do mundo, ouvi-nos, Senhor. / Cordeiro de Deus, que tirais os pecados do mundo, tende piedade de nós.

Oração

Deus eterno e omnipotente, que nos concedeis a graça de honrar numa única solenidade os méritos de todos os Santos, dignai-Vos derramar sobre nós, em atenção a tão numerosos intercessores, a desejada abundância da vossa misericórdia. Por Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que é Deus convosco na unidade do Espírito Santo. Amen.

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A glória dos santos

Como porta que se abre para o dia de amanhã, queremos com esta partilha aquecer o coração e centrar a atenção crente para a alegria e a grandeza da solenidade de Todos os Santos, na qual se celebra o mistério da santidade divina presente na nossa vida. Numa única celebração, evocamos a vitória daqueles nossos irmãos e irmãs que nos precederam na fé, na esperança e na caridade e que, tendo concluído a sua peregrinação sobre a terra, já gozam da plenitude, na visão de Deus.

Eles formam uma incontável multidão. Muitos foram oficialmente canonizados pela Igreja, a maior parte deles, porém, nunca o virá a ser. Alguns deles cruzaram os nossos caminhos, embora a maior parte deles tenha passado desapercebida neste mundo, sendo só por Deus conhecidos. Mas todos eles responderam com generosidade aos apelos do Senhor, amando-o sobre todas as coisas, na pessoa dos irmãos, em especial dos mais necessitados, dos que sofrem, dos excluídos e dos descartados.

Prefácio dos santos

Senhor, Pai santo, Deus eterno e omnipotente, é verdadeiramente nosso dever, é nossa salvação dar-Vos graças, sempre e em toda a parte. Vós sois glorificado na assembleia dos Santos e, ao coroar os seus méritos, coroais os vossos próprios dons. Na sua vida dais-nos um exemplo, na comunhão com eles uma família e na sua intercessão um auxílio, para que, confirmados por tão grandes testemunhas, possamos vencer o bom combate da fé e receber com eles a eterna coroa de glória, por Cristo, nosso Senhor. Por isso, com os Anjos e todos os Santos, proclamamos a vossa glória, cantando numa só voz: Santo, Santo, Santo…

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Para alimentar e fortalecer a esperança

Pensar e escudrinhar o que o Senhor passou por nós move-nos à compaixão, e é saborosa esta pena e as lágrimas que procedem daqui, e de pensar a glória que esperamos e o amor que o Senhor nos teve e a sua ressurreição move-nos ao gozo.

Santa Teresa de Jesus

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30º Domingo do Tempo Comum – Ano C

O publicano desceu justificado para sua casa e o fariseu não (Lc 18, 14)

Neste Domingo a Palavra de Deus ajuda-nos a rezar por meio de três personagens: na parábola contada por Jesus rezam o fariseu e o publicano e, na primeira leitura, fala-se da oração do pobre. Na sua oração, o fariseu vangloria-se porque cumpre do melhor modo possível os preceitos particulares, mas esquece o maior: amar a Deus e ao próximo. Transbordando confiança em si próprio, na sua capacidade de observar os mandamentos, nos seus méritos e virtudes, o fariseu aparece centrado apenas em si mesmo. O drama desse homem é que vive sem amor. Mas, sem amor, até as melhores coisas nada são, como diz São Paulo. E sem amor, qual é o resultado? No fim das contas, em vez de rezar, elogia-se a si mesmo. De facto, não pede nada ao Senhor, porque não se sente necessitado nem em dívida, mas com crédito. Está no templo de Deus, mas pratica outra religião, “a religião do eu”. Muitos grupos “ilustres”, “cristãos católicos”, vão por esta estrada.

E além de Deus, o fariseu esquece o próximo, despreza-o, ou seja, não lhe dá valor. Considera-se melhor do que os outros. Quanta superioridade presumida, que se transforma em opressão e exploração, ainda hoje! 

Rezemos pedindo a graça de não nos considerarmos superiores, não nos julgarmos íntegros, nem nos tornarmos cínicos e escarnecedores. Peçamos a Jesus que nos cure de criticar e queixar dos outros, de desprezar seja quem for: são coisas que desagradam a Deus.

A oração do publicano ajuda-nos a compreender o que é agradável a Deus. Ele não começa pelas suas virtudes, mas pelas suas faltas; não pela riqueza, mas pela sua pobreza: não uma pobreza económica, os publicanos eram ricos, mas uma pobreza de vida, porque no pecado nunca se vive bem. Aquele homem reconhece-se pobre diante de Deus, e o Senhor ouve a sua oração, feita apenas de sete palavras, mas de atitudes verdadeiras. De facto, enquanto o fariseu estava à frente, de pé, o publicano mantém-se à distância e “nem sequer ousava levantar os olhos ao céu”, porque crê que o Céu está ali e é grande, enquanto ele se sente pequeno. E “batia no peito”, porque no peito está o coração. A sua oração nasce do coração, é transparente: coloca diante de Deus o coração, não as aparências. Rezar é deixar-se olhar dentro por Deus sem simulações, sem desculpas, nem justificações. Do publicano aprendemos a considerar-nos, todos, necessitados de salvação. É o primeiro passo da religião de Deus, que é misericórdia com quem se reconhece miserável. Considerar-se justo é deixar Deus, o único justo, fora de casa.

Se olharmos com sinceridade para dentro de nós, vemos os dois em nós: o publicano e o fariseu. Somos um pouco publicanos, porque pecadores, e um pouco fariseus, porque presunçosos, capazes de nos sentirmos justos, campeões na arte de nos justificarmos! Isto, com os outros, muitas vezes dá certo; mas, com Deus, não. Peçamos a Deus a graça de nos sentirmos necessitados de misericórdia, pobres intimamente. Por isso, faz-nos bem frequentar os pobres, para nos lembrarmos que somos pobres, para nos recordarmos de que a salvação de Deus só age num clima de pobreza interior.

O Livro do Eclesiástico fala que a oração do pobre “atravessa as nuvens”. Enquanto a oração de quem se considera justo fica por terra, esmagada pela força de gravidade do egoísmo, a do pobre sobe, directa, até Deus. O sentido da fé do Povo de Deus viu nos pobres “os porteiros do Céu”: são eles que nos abrirão, ou não, as portas da vida eterna; eles que não se consideraram senhores nesta vida, que não se antepuseram aos outros, que tiveram só em Deus a sua própria riqueza. São ícones vivos da profecia cristã.

Devemos rezar pedindo a graça de saber ouvir o grito dos pobres: é o grito de esperança da Igreja. Assumindo nós o seu grito, temos a certeza de que a nossa oração atravessará as nuvens.

Papa Francisco, Homilia (resumo), 27 de Outubro, 2019

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Ternura e compaixão

E finalmente a terceira linha: ternura e compaixão. O contemplativo tem um coração compassivo. Quando o amor enfraquece, tudo perde sabor. O amor, diligente e criativo, é bálsamo para os que estão cansados ​​e esgotados (cf. Mt 11,28), para os que sofrem o abandono, o silêncio de Deus, o vazio da alma, o amor despedaçado. Se um dia, à nossa volta, não houver mais pessoas doentes e famintas, abandonadas e desprezadas – os menores de que fala a vossa tradição mendicante – não é porque não se encontrem aí, mas simplesmente porque não as vemos. Os pequenos (cf. Mt 25, 31-46) e os descartados (cf. A Alegria do Evangelho, nº 53) sempre os teremos (cf. Jo 12,8), a oferecer-nos uma oportunidade para que a contemplação seja uma janela aberta à beleza, à verdade e à bondade. “Quem ama a Deus deve procurá-lo nos pobres”, nos “irmãos de Jesus”, como disse o Beato Angelo Paoli, de quem ireis celebrar brevemente o terceiro centenário da sua morte. Que possais ter sempre a bondade de os procurar! A confiança absoluta do Beato Angelo Paoli na providência divina fazia-o exclamar com alegria: “Tenho uma despensa na qual nada falta!”. Que a vossa despensa transborde compaixão diante de qualquer forma de sofrimento humano!

A contemplação seria apenas qualquer coisa momentânea se se reduzisse a arroubos e êxtases que nos afastasse das alegrias e das preocupações das pessoas. Devemos desconfiar do contemplativo que não é compassivo. A ternura, segundo o estilo de Jesus (cf. Lc 10,25-37), protege-nos da “pseudo-mística”, da “solidariedade de fim de semana” e da tentação de ficar longe das feridas do corpo de Cristo. Três perigos: a “pseudo-mistica”, o “fim de semana solidário” e a tentação de ficar longe das feridas do corpo de Cristo. As feridas de Jesus são também ainda hoje visíveis no corpo dos irmãos que são despojados, humilhados e escravizados. Tocando estas feridas, acariciando-as, é possível adorar o Deus vivo no meio de nós. Hoje é necessário fazer uma revolução da ternura (cf. A Alegria do Evangelho, nnº 88; 288) para que nos torne mais sensíveis diante das noites escuras e dos dramas da humanidade.

Caríssimos irmãos, agradeço-vos por este encontro. Que a Virgem do Carmelo sempre vos acompanhe e proteja todos aqueles que colaboram convosco e se inspiram na vossa espiritualidade. E, por favor, confiai-me também a mim à sua maternal protecção. Obrigado!

Papa Francisco aos participantes no Capítulo Geral da Ordem Carmelita

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