O Amor solidário de Jesus para com os puros de coração

Fazia parte do programa de Jesus “abrir os olhos dos cegos” (Lc 4,18). Ele dizia aos discípulos: “A lâmpada do corpo é o olhar. Quando o olhar é sadio, o corpo inteiro também fica iluminado. Mas, se o olhar está doente, o corpo também fica na escuridão. Portanto, veja bem se a luz que está em você não é escuridão” (Lc 11,34-35). Quem tem um olhar de inveja, não enxerga corretamente as pessoas e não percebe a presença de Deus nos outros. Quem tem um olhar de orgulho, de raiva ou de vingança, não consegue apreciar direito os fatos da vida. Tais pessoas são cegas. Jesus dizia que alguns fariseus eram cegos, porque não enxergavam direito nem a vida nem as coisas de Deus (cf. Mt 15,14; 23,16-17; Jo 9,40-41). Mas quem tem um olhar puro, esse consegue perceber os apelos de Deus na vida.

Jesus, ele tinha um olhar limpo, puro, e o mantinha puro por meio da oração, tendo sempre presente a vontade do Pai (Jo 4,34; 5,19). Ele só fazia aquilo que o Pai lhe mostrava que era para fazer (Jo 5,19). Ele falava só aquilo que ouvia do Pai (Jo 5,30).

Jesus procurava ajudar os discípulos a limpar o olhar: “Cuidado com o fermento dos fariseus e de Herodes!” (Mc 8,15-16). A mentalidade do “fermento de Herodes e dos fariseus” (Mc 8,15) tinha raízes profundas na vida daquele povo. Também hoje, o “fermento do consumismo” tem raízes profundas na nossa vida e exige uma vigilância constante. Jesus procurava atingir essas raízes para poder arrancar o “fermento” que os impedia de perceber a presença de Deus na vida. É bonito ver como Jesus, através do diálogo, ia ajudando as pessoas a enxergar melhor. O evangelho de João é que dá uma atenção especial a esta preocupação de Jesus: a conversa de Jesus com a Samaritana (Jo 4,7-26), com Nicodemos (Jo 3,1-15), com Marta (Jo 11,21-27), com o cego que foi curado (Jo 9,35-39). Jesus ajudava até mesmo as pessoas que resistiam contra ele: alguns judeus (Jo 8,31-59) e Pilatos (Jo 18,33-38).

Vale a pena ver de perto como ele fazia para purificar os olhos dos discípulos e como combatia os vários tipos desse falso fermento, dessa falsa mentalidade, que até hoje impedem a visão correta das coisas: Certa vez, alguém, que não era da comunidade, usava o nome de Jesus para expulsar os demônios. João viu e proibiu, pois, assim ele dizia, aquela pessoa não fazia parte do grupo (Mc 9,38). Era o falso fermento da mentalidade de grupo fechado.  Jesus responde: “Não impeçam! Quem não é contra é a favor!” (Lc 9,39-40). Outra vez, os discípulos brigavam entre si pelo primeiro lugar (Mc 9,33-34). Era o falso fermento da mentalidade de competição e de prestígio. Jesus reage: “O primeiro seja o último” (Mc 9,35). “Não vim para ser servido, mas para servir” (Mc 10,45; Mt 20,28; Jo 13,1-16). Outro dia, mães com crianças queriam chegar perto de Jesus. Os discípulos as afastavam. Era o falso fermento da mentalidade de quem marginaliza o pequeno. Jesus os repreende: ”Deixem vir a mim as crianças!” (Mc 10,14). “Quem não receber o Reino como uma criança, não pode entrar nele” (Lc 18,17). Outro dia ainda, vendo um cego os discípulos perguntavam: “Quem pecou, ele ou seus pais, para que nascesse cego?” (Jo 9,2). Era o falso fermento da mentalidade de quem segue a opinião da ideologia dominante. Jesus responde: “Nem ele, nem os pais dele, mas para que nele se manifestem as obras de Deus” (cf Jo 9,3).

Em todas estas atitudes Jesus se esforçava para que as pessoas modificassem seu olhar sobre o próximo. Por exemplo, ele dizia: “Tudo que vocês fizerem a um destes meus irmãos mais pequeninos é a mim que o fizeram” (Mt 25,40). Ele se identifica com os pequenos: “Era eu!” (Mt 25,40.45). Ele levava as pessoas a perceber a presença dele até nas coisas mais simples da vida como dar um copo de água (Mt 10,42; Mc 9,41).

Carlos Mesters, O. Carm.

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Semana de Oração pelas Vocações

Oração pelas Vocações

Senhor da messe e pastor do rebanho, faz ressoar em nossos ouvidos o teu forte e suave convite: “Vem e segue-Me”! Derrama sobre nós o teu Espírito: que Ele nos dê sabedoria para ver o caminho e generosidade para seguir a tua voz. Senhor, que a messe não se perca por falta de operários. Desperta as nossas comunidades para a missão. Ensina a nossa vida a ser serviço. Fortalece os que querem dedicar-se ao Reino, na vida consagrada e religiosa. Senhor, que o rebanho não pereça por falta de pastores. Sustenta a fidelidade dos nossos bispos, padres e ministros. Dá perseverança aos nossos seminaristas. Desperta o coração dos nossos jovens para o ministério pastoral na tua Igreja. Senhor da messe e pastor do rebanho, chama-nos para o serviço do teu povo. Maria, Mãe da Igreja, modelo dos servidores do Evangelho, ajuda-nos a responder “sim”. Amen.

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O Amor solidário de Jesus para com os misericordiosos

Jesus era a misericórdia em pessoa. Como o samaritano da parábola, tinha o coração na miséria dos outros. Ele conhecia de perto a miséria e o sofrimento do seu povo. Nas parábolas ele menciona a angústia dos trabalhadores desempregados que viviam à espera de um biscate e nem sempre o conseguiam (Mt 20,1-6); a situação do povo cheio de dívida e ameaçado de ser escravizado (Mt 18,23-26); o desespero que chegava a levar o pobre a explorar seu próprio companheiro (Mt 18,27-30; Mt 24,48-50); a extravagância dos ricos que ofendia os pobres (Lc 16,19-21); a luta da viúva pobre pelos seus direitos (Lc 18,1-8). Jesus sabia o que se passava no seu país. A miséria do povo o rodeava e enchia o seu coração.

O que Jesus mais fazia era atender às pessoas que o procuravam em busca de alguma ajuda ou alívio. Ele fazia isto desde pequeno. Lá em Nazaré, como todo mundo, ele trabalhava na roça e, além disso, ajudava o povo como carpinteiro. Carpinteiro era aquela pessoa bem prática do povoado a quem todos recorriam para resolver seus pequenos problemas domésticos: mesa quebrada, telha estragada, arado desregulado, etc. Este seu jeito natural de servir aos outros, Jesus o deve ter aprendido de sua mãe que chegou a viajar mais de 100 quilômetros só para ajudar sua prima idosa Isabel, no primeiro parto (Lc 1,36-39.56-57). Jesus dizia de si mesmo, resumindo o sentido da sua vida: “Eu não vim para ser servido, mas para servir” (Mc 10,45).

Sim, Jesus era a misericórdia em pessoa. Certa vez, ele queria descansar um pouco e foi de barco para o outro lado do lago (Mc 6,31). O povo soube e foi a pé na frente dele e ficou esperando por ele na praia (Mc 6,33). Vendo o povo, Jesus esqueceu o descanso e dizia: “Tenho dó desse povo. São como ovelhas sem pastor” (Mc 6,34). Outra vez, em Cafarnaum, terminado o sábado, no momento de aparecer a primeira estrela no céu, o povo levou a ele todos os doentes da cidade, e ele curou a todos (Mc 1,32-34). Era tanta gente que o procurava, que nem sobrava tempo para ele comer (Mc 3,20; Mt 6,31). O evangelho conta muitos episódios desta atenção misericordiosa de Jesus para com as pessoas: com a mulher adúltera (Jo 8,11), com o paralítico (Mc 2,9), a moça pecadora (Lc 7,47), o bom ladrão (Lc 23,34). Perdoou até o soldado que o estava matando (Lc 23,34).

Pedro, ouvindo Jesus falar tanto em misericórdia e perdão, perguntou: “Quantas vezes devo perdoar, se meu irmão pecar contra mim? Até sete vezes?” (Mt 18,21) O número sete significava a totalidade. No fundo, Pedro pergunta: “Então devo perdoar sempre?” E Jesus responde: “Não lhe digo que até sete vezes, Pedro, mas até setenta vezes sete”. Ou seja: “Não lhe digo até sempre, mas até setenta vezes sempre!”

O evangelho conta também as brigas e discussões que Jesus sustentava para defender os sofredores contra as agressões injustas das autoridades religiosas. Defendeu a mulher que vivia curvada há 18 anos e que foi agredida pelo coordenador da sinagoga (Lc 13,10-17). Defendeu a moça que foi agredida como pecadora na casa de um fariseu (Lc 7,36-50). Defendeu as mães que queriam uma bênção para suas crianças, contra a má vontade dos discípulos (Mt 19,13-15). Defendeu os discípulos quando criticados por arrancarem espigas em dia de sábado (Mt 12,1-8). Defendeu a mulher acusada de adultério por alguns fariseus (Jo 8,1-11). Defendeu e curou o rapaz com mão seca dentro da sinagoga em dia de sábado (Mc 3,1-6). Acolhia os leprosos, os doentes, os cegos, os coxos, todos e todas que o procuravam. E ele explicou o motivo que o levava a ter esse seu comportamento. Ele disse: “Quero misericórdia e não sacrifício” (Mt 9,13; 12,7; 23,23). Agindo assim, Jesus irradiava para os outros o amor solidário que ele mesmo recebia do Pai. Colocava em prática o que ensinava aos outros: “Sede misericordiosos como o Pai de vocês é misericordioso” (Lc 6,36).

Carlos Mesters, O. Carm.

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O Amor solidário de Jesus para com os que têm fome e sede de justiça

No tempo de Jesus, muitos escribas e fariseus ensinavam que a justiça só se alcançaria observando a lei até nos seus mínimos detalhes. Era aquela mesma visão da reforma deuteronomista e do Doutor da parábola do Bom samaritano. O relacionamento com Deus se tornava comercial: Eu ofereço algo a Deus, para que Ele me pague. Se eu observar bem toda a lei, posso exigir que Ele me dê a herança prometida da vida eterna. No ensino deles o acento caía na observância, no merecer. Não deixavam espaço para a gratuidade do amor e a misericórdia (cf Mt 9,13). Jesus não concordava com esta justiça e dizia: “Se a justiça de vocês não for maior que a justiça dos fariseus e escribas, vocês não vão poder entrar no Reino dos céus” (Mt 5,20).

Na raiz desta falsa justiça estava a injustiça maior da falsa imagem de Deus que a religião comunicava ao povo. Por causa da insistência na observância da Lei, Deus aparecia como um juiz severo que ameaça com castigo, provoca medo e condena, e não como um pai que acolhe e perdoa. Esta tremenda injustiça para com Deus se manifestava nas coisas mais comuns do dia-a-dia e transformava a vida de muitas pessoas num inferno. Por exemplo, eles não podiam comer sem lavar as mãos (Mc 7,3); não podiam sentar à mesa com quem era de outra raça ou de outra religião (Mc 2,16); não podiam entrar na casa de um pagão (At 10,28); não podiam arrancar espigas em dia de sábado para matar a fome (Mt 12,1-2); não podiam curar um doente em dia de sábado (Mc 3,1-2). E assim havia muitas outras normas, observâncias e costumes. A impureza que a lei assim exigia ameaçava o povo de todos os lados: “Pecado! Proibido! Não Pode!” O “pecado” estava em toda parte! O povo, em vez de sentir-se em paz diante de Deus e feliz com a perspectiva do Reino, tinha a consciência pesada, pois não conseguia observar a Lei, nem alcançar a justiça (cf. Rom 7,15.19).

Jesus não pensava assim. Ele tinha fome e sede de uma outra justiça. Tinha outra imagem de Deus no coração. O amor de Deus por nós não é fruto das nossas observâncias, mas é um dom que recebemos de Deus. A mãe ama a criança não porque a criança é boa e lhe obedece em tudo, mas porque ela mesma é mãe. Mãe é Mãe! Amor de mãe não se compra, nem se merece, mas se recebe de graça pelo simples fato de nascer. “Quisesse alguém dar tudo o que tem para comprar o amor, seria tratado com desprezo” (Ct 8,7). Temos que observar a lei de Deus, sim, sempre, mas não para merecer ou comprar o céu. Observamos a lei para retribuir e agradecer a imensa bondade com que Deus nos acolhe e “nos amou primeiro”, sem mérito algum da nossa parte (1Jo 4,19). Aqui está a raiz do Amor Solidário!

Esta visão da justiça cresceu em Jesus, desde pequeno, convivendo em casa com sua mãe que lhe falava do amor e da misericórdia de Deus (cf Lc 1,54-55) e lembrava as histórias de Jeremias, Oséias e Isaías e tantas outras pessoas. Ele descobria o amor de Deus Pai no amor que recebia de Maria, sua mãe, de Ana, sua avó, e de José, seu pai, que era um homem justo (Mt 1,19). Jesus, por sua vez, traduzia este amor naqueles gestos tão simples de ternura com que recebia e acolhia as pessoas, desde as criancinhas até os velhos: Zaqueu (Lc 19,1-10), Bartimeu (Mc 10,46-52), Talita (Mc 5,41), Nicodemos (Jo 3,1-15), Madalena (Lc 8,2; Jo 20,11-18), Levi (Mc 2,13-17), a mulher adúltera (Jo 8,1-11), a moça do perfume (Lc 7,36-50), a Samaritana (Jo 4,7-26), a Cananéia (Mt 15,21-28), as mães com crianças pequenas nos braços (Mc 10,13-16). Irradiando esta sua fome e sede de justiça, Jesus irradiava o Amor Solidário de Deus.

Carlos Mesters, O. Carm.

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Quinta-feira santa: sacerdócio e eucaristia

Um sacerdote deve ser simultaneamente pequeno e grande, nobre de espírito, como de sangue real, simples e natural, como de raiz camponesa, um herói na conquista de si mesmo, um homem que se bateu com Deus, uma fonte de santificação, um pecador a quem Deus perdoou, dos seus desejos o soberano, um servidor para os tímidos e os fracos, que não se abaixa diante dos poderosos, mas que se curva diante dos pobres, discípulo do seu Senhor, chefe do seu rebanho, um mendigo de mãos totalmente abertas, um portador de inúmeros dons, um homem no campo de batalha, uma mãe para confortar os doentes, com a sabedoria da idade e a confiança duma criança em direcção ao alto, os pés na terra, feito para a alegria, perito no sofrimento, isento de qualquer inveja, com perspectivas largas, que fala com franqueza, um amigo da paz, um inimigo da inércia, fiel para sempre… Tão diferente de mim!

De um manuscrito medieval

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O Amor solidário de Jesus para com os mansos

Jesus disse: “Venham a mim todos vocês que estão cansados de carregar o peso do seu fardo, e eu lhes darei descanso. Carreguem a minha carga e aprendam de mim, porque sou manso e humilde de coração.” (Mt 11,28-30). A mansidão a que Jesus se refere não é a de uma pessoa sem fibra, sem vontade própria, que aprova tudo e concorda com tudo, pois Jesus não era assim. A mansidão a que ele se refere é a mansidão resistente do Servo de Javé, anunciado pelo profeta Isaías: “Ele não grita, nem levanta a voz, não solta berros pelas ruas, não quebra a planta machucada, nem apaga o pavio que ainda solta fumaça. Com fidelidade promove o direito sem desanimar nem desfalecer, até estabelecer o direito sobre a terra” (Is 42,2-4).

Assim era a mansidão de Jesus. Isaías completa a descrição da mansidão dizendo que ela consiste em “saber dizer uma palavra de conforto a quem está desanimado” (Is 50,4). E o próprio Servo acrescenta: “O Senhor me abriu os ouvidos e eu não resisti, nem voltei atrás. Ofereci minhas costas aos que me batiam e o queixo aos que me arrancavam a barba. Não escondi o rosto para evitar insultos e escarros. O Senhor é a minha ajuda! Por isso, estas ofensas não me desmoralizam. Faço cara dura como pedra, sabendo que não vou ser um fracassado” (Is 50,5-7).

A mansidão de Jesus é a resistência que nasce da certeza de fé de que a vitória final não será dos violentos, dos corruptos, dos prepotentes, mas sim dos que tem a mansidão do Servo. Jesus era uma amostra viva desta mansidão resistente. Para ele, tudo se resumia em imitar Deus: “Vocês ouviram o que foi dito: Ame o seu próximo, e odeie o seu inimigo. Eu, porém, lhes digo: amem os seus inimigos, e rezem por aqueles que perseguem vocês! Assim vocês se tornarão filhos do Pai que está no céu, porque ele faz o sol nascer sobre maus e bons, e a chuva cair sobre justos e injustos. Portanto, sejam perfeitos como é perfeito o Pai de vocês que está no céu” (Mt 5,43-45 e 48; cf Lc 6,36).

Jesus imitou o Pai e revelou o seu amor. Cada gesto, cada palavra de Jesus, desde o nascimento até à morte na cruz foi um crescendo contínuo. A manifestação plena desta mansidão foi quando na Cruz ofereceu o perdão ao soldado que o torturava e matava. O soldado, empregado do império, prendeu o pulso de Jesus no braço da cruz, colocou um prego e começou a bater. Deu várias pancadas. O sangue espirrava. O corpo de Jesus se contorcia de dor. O soldado bruto e ignorante, alheio ao que estava fazendo e ao que estava acontecendo ao redor, continuava batendo como se fosse um prego na parede da sua casa para pendurar um quadro. Neste momento Jesus dirige ao Pai esta prece: “Pai, perdoa! Eles não sabem o que estão fazendo!” (Lc 23,34) Olhando aquele soldado ignorante e bruto, Jesus teve dó do rapaz e rezou por ele e por todos nós: “Pai, perdoa!” E ainda arrumou uma desculpa: “São ignorantes. Não sabem o que estão fazendo!” Diante do Pai, Jesus se fez solidário com aqueles que o torturavam e maltratavam. Era como o irmão que vem com seus irmãos assassinos diante do juiz e ele, vítima dos próprios irmãos, diz ao juiz: “São meus irmãos, sabe! São uns ignorantes. Perdoa. Eles vão melhorar!” Era como se Jesus estivesse com medo que o mínimo de raiva contra o rapaz que o matava pudesse apagar nele o último restinho de humanidade que ainda sobrava nele. Este gesto incrível de humanidade e de mansidão foi a maior revelação do amor de Deus. Jesus podia morrer: “Está tudo consumado!” (Jo 19,30). Sua vida foi uma revelação do amor solidário do Pai.

Carlos Mesters, O. Carm.

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O Amor solidário de Jesus para com os que choram

Não existe pessoa neste mundo que nunca chorou. Nem Jesus escapa. Nascemos chorando. Uns choram mais que os outros. O choro pode ter muitas causas: choro de raiva e de ódio, choro de amor e de compaixão. Choro alegre e choro triste. Jesus chorou várias vezes. Chorou sobre Jerusalém, a capital do seu povo, porque ela não soube perceber o dia da visita do Senhor (Lc 19,41-44). Jesus se comovia diante do povo faminto que o procurava (Mc 6,34). O evangelho de Mateus diz que, diante da tristeza de tanta gente, causada pela pobreza e opressão, Jesus imitava o Servo de Javé anunciado por Isaías: “Ele tomou sobre si as nossas enfermidades e carregou as nossas doenças” (Mt 8,17).

Jesus deve ter enxugado muitas lágrimas e devolvido a alegria a muita gente. Ele imitava Deus que, como diz Isaias, “enxugará as lágrimas de todas as faces, e eliminará da terra inteira a vergonha do seu povo” (Is 25,8). Como devem ficado alegres a viúva de Naím, cujo filho único ele ressuscitou (Lc 7,11-17); a Cananéia, cuja filha curou (Mc 7,24-30); a mulher de hemorragia irregular que se curou graças a sua fé em Jesus (Mc 5,25-34); o cego Bartimeu (Mc 10,46-52), o velho Zaqueu (Lc 19,1-10), a Samaritana (Jo 4,7-42), a mulher adúltera (Jo 8,1-11), a mulher curvada (Lc 13,11), Madalena (Lc 8,2; Jo 20,11-18), Marta e Maria, irmãs de Lázaro (Jo 11,17-44), tantos e tantas! Não dá para enumerar todos os casos de aflição que se converteram em consolo e alegria graças à bondade de Jesus.

Ele combateu os males que faziam o povo sofrer e chorar: combateu a fome, pois alimentou os famintos (Mc 6,30-44; 8,1-10); combateu a doença, pois curou os enfermos (Mt 4, 24; 8,16-17); combateu os males da natureza, pois acalmou as tempestades (Mt 14,32; 8,23-27); expulsou os maus espíritos e os proibia de falar (Mc 1,23-27.34; Lc 4,13); combateu a ignorância, pois ensinava o povo (Mt 9, 35; Mc 1,22); combateu o abandono e a solidão, pois acolhia as pessoas e não as marginalizava (Mt 9,36; 11,28-30); combateu as leis que oprimiam, pois colocou o ser humano como objetivo de todas as leis (Mt 12,1-5; 23,13-15; Mc 2,23-28); combateu a opressão, pois acolhia o povo oprimido (Mt 11,28-30; Lc 22,25); combateu o medo, pois dizia sempre: “Não tenham medo!” (Mt 28,10; Mc 6,50).

Consolando assim os tristes e irradiando alegria do Reino, Jesus revelava o amor solidário do Pai. Ele mesmo se alegrava vendo a alegria dos pequenos: “Eu te louvo, Pai, Senhor do céu e da terra, porque escondeste essas coisas aos sábios e inteligentes, e as revelaste aos pequeninos. Sim, Pai, porque assim foi do teu agrado” (Lc 11,21; Mt 11,25-26).

Carlos Mesters, O. Carm.

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O Amor solidário de Jesus para com os pobres em espírito

Jesus via como os doutores da lei ensinavam aos pobres a tradição dos antigos (Mc 7,1-5). Eles explicavam tudo direitinho conforme a letra da lei, mas a muitos deles faltava o espírito da lei. Em nome da fidelidade à letra, querendo ou não, eles marginalizavam muita gente: os pobres, os doentes, os deficientes físicos, as mulheres, os impuros, as crianças, os pobres. Diziam que a pobreza, o sofrimento, os males da vida e as deficiências eram castigos de Deus. Em vez de ensinar a lei de Deus como expressão do rosto carinhoso do Pai, eles escondiam a imagem do Pai atrás de uma máscara de normas e obrigações que tornavam impossível a observância da lei para os pobres (Mc 7,6-13).

Jesus experimentava Deus de maneira diferente. Sentia Deus como Pai, como Mãe. Ele tinha um outro espírito, que o fazia meditar a letra da lei com um novo olhar e o levava a escutar os pobres com muita ternura. Jesus também era pobre. Vivia no meio dos pobres da sua terra, igual a eles.

Porém, para Jesus, nascer pobre e ser pobre não eram uma fatalidade nem um castigo de Deus, mas sim a expressão de um apelo de Deus. Jesus não era um pobre revoltado com inveja daqueles ricos que acumulavam toda a riqueza para si. Na sua pobreza Jesus tinha uma riqueza maior: Deus estava com ele. O Reino de Deus vivia nele e o espírito do Reino o levava a lutar para que a injustiça fosse eliminada e os bens da terra fossem partilhados e se tornassem fonte de fraterni­dade para todos. Esta riqueza do Reino de Deus e da fraternidade, Jesus a irradiava no meio dos pobres e queria que todos a descobrissem.

Jesus e seus discípulos viviam misturados com os pobres e os excluídos (Mc 2,16; 1,41; Lc 7,37). Jesus reconhecia a riqueza e o valor dos pobres (Mt 11,25-26; Lc 21,1-4), e proclamava-os felizes (Lc 6,20; Mt 5,3). Não possuía nada para si, nem mesmo uma pedra para reclinar a cabeça (Lc 9,58). E a quem desejava segui-lo para conviver com ele, mandava escolher: ou Deus, ou o dinheiro! (Mt 6,24). Mandava fazer opção pelos pobres (Mc 10,21). A pobreza, que caracterizava a vida de Jesus, caracterizava também a sua missão. Ao contrário dos outros missionários (Mt 23,15), os discípulos e as discípulas de Jesus não podiam levar nada, nem ouro, nem prata, nem duas túnicas, nem sacola, nem sandálias, mas somente a Paz! (Mt 10,9-10; Lc 10,4-5). Eram pobres em espírito, pois iam animados pelo mesmo espírito de Jesus.

Jesus anunciava o Reino para todos, para pobres e ricos. Não excluía ninguém. Mas o anunciava a partir dos pobres e excluídos: prostitutas eram preferidas aos fariseus (Mt 21,31–32; Lc 7,37-50); publicanos tinham precedência sobre os escribas (Lc 18,9-14; 19,1-10); leprosos eram acolhidos e limpos (Mc 1,44; Mt 8,2-3; 11,5; Lc 17,12-14); doentes eram curados em dia de sábado (Mc 3,1-5; Lc 14,1-6; 13,10-13); mulheres faziam parte do grupo que acompanhava Jesus (Lc 8,1-3; 23,49.55; Mc 15,40-41); crianças eram apresentadas como professores de adultos (Mt 18,1-4; 19,13-15; Lc 9,47-48); samaritanos eram apresentados como modelo para os judeus (Lc 10,33; 17,16); famintos eram acolhidos como rebanho sem pastor (Mc 6,34; Mt 9,36; 15,32; Jo 6, 5-11); cegos recebiam a visão (Mc 8,22-26; Mc 10,46-52; Jo 9,6-7) e os fariseus eram declarados cegos (Mt 23,16); possessos eram libertados do poder do mal (Lc 11,14-20); a mulher adúltera era acolhida e defendida contra os que a condenavam em nome da lei de Deus (Jo 8,2-11); estrangeiros eram acolhidos e atendidos (Lc 7,2-10; Mc 7,24-30; Mt 15,22). Os pobres perceberam a novidade e acolheram Jesus dizendo: “Um novo ensinamento dado com autoridade!” (Mc 1,27), diferente dos escribas e dos fariseus (Mc 1,22). Todo este carinho de Jesus na convivência com os pobres era a maneira de ele revelar a preferência do amor solidário do Pai para com eles.

Carlos Mesters, O. Carm.

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Quando se ama

Quando se ama tudo é alegria, a cruz não pesa, o martírio não se sente, vive-se mais no céu do que na terra.

Santa Teresa dos Andes

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