Ano da Fé – LII

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Nomes dados à Igreja

O mistério da Igreja não se deixa encerrar nos termos de uma definição. As imagens e os nomes que, na Bíblia, servem para a evocar e que o Vaticano II lembra são um bom guia para aprender a sua riqueza. Estas imagens são múltiplas. Nenhuma tem a pretensão de exprimir a totalidade do mistério. Cada uma delas sublinha um aspecto. O que importa é combiná-las umas com as outras, sem se limitar a uma só.

Algumas destas imagens têm origem na vida pastoril: a Igreja é então o aprisco cuja porta é Cristo, ou ainda o rebanho, do qual Cristo é o verdadeiro pastor. Esta imagem permite a Jesus falar de outras ovelhas que lhe pertencem mas que não são deste redil: é preciso que ele as traga também (cf. Jo 10, 1-16). Outras imagens são tiradas da vida do campo. A Igreja é então o terreno no qual é espalhada a semente, o campo cultivado de Deus (cf. 1Cor 3, 9) ou ainda a vinha que ele plantou (cf. Mt 21, 33-43).

Várias imagens andam à volta da ideia de construção ou de habitação. A Igreja é chamada edifício de Deus (cf. 1Cor 3, 9), a casa de Deus (cf 1Tm 3, 15) ou o templo santo (cf Ef 2, 21). Deste edifício Cristo é a pedra angular; os crentes tornados templos do Espírito, são integrados nele como pedras vivas.

A Igreja pode também ser chamada a família de Deus (cf. Ef 2, 19). Ela chama-se também “a Jerusalém do alto” e “nossa mãe” (Gal 4, 26; cf. Ap 12, 17); e é descrita como a esposa imaculada a quem Cristo amou e por ela se entregou para a santificar (cf. Ap 21, 2; Ef 5, 26).

Achas, portanto, que as fraquezas da Igreja fariam com que Cristo a abandonasse? Abandonar a Igreja seria o mesmo que abandonar o Seu próprio corpo (D. Hélder Câmara).

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Ano da Fé – LI

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A comunidade cristã

O Espírito Santo reúne os crentes na Igreja. O amor do Pai, revelado pelo Filho, morto e ressuscitado, é comunicado aos discípulos, que se tornam a família de Deus, enviada a todo o mundo como sinal palpável da Sua proximidade. No próprio dia do Pentecostes forma-se a primeira comunidade cristã, a de Jerusalém, mãe e modelo de todas as que lhe seguiram. Os crentes são “assíduos ao ensino dos Apóstolos, à união fraterna, à fracção do pão e às orações” (Act 2, 42). Escutam e meditam a palavra de Deus. Louvam e agradecem continuamente ao Senhor, suplicam a Sua ajuda nas dificuldades. Celebram, na Eucaristia, o mistério da morte e da ressurreição de Cristo, realizando o gesto por Ele realizado na Última Ceia. Sentem-se bem em estar juntos; encarregam-se dos serviços necessários; partilham os bens materiais, com liberdade e generosidade, continuando a experiência já feita por alguns com Jesus. Levam para toda a parte o seu testemunho corajoso, provocando a simpatia do povo, apesar da hostilidade da classe dirigente. Trata-se de uma experiência histórica irrepetível em que se delineia a figura essencial de toda a verdadeira comunidade cristã: comunidade concreta de crentes em Cristo, homens e mulheres de carne e osso, santos e pecadores, reunidos sob a orientação dos pastores, na partilha dos bens materiais e espirituais, onde o mistério pascal do Senhor é proclamado pela pregação, concretizado na Eucaristia e vivido na caridade..

Para ser reconhecível como sinal diante do mundo, a Igreja deve possuir uma identidade visível bem determinada; deve configurar-se como comunidade de fé, de culto e, sobretudo, de relações fraternas: “É por isso que todos saberão que sois meus discípulos: se vos amardes uns aos outros” (Jo 13, 35).

A Igreja é uma mulher de idade muito avançada, com muitas rugas. Mas é a minha mãe. E numa mãe não se bate (Karl Rahner).

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Ano da Fé – L

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Orações ao Espírito Santo

– Ó Espírito Santo, alma de minha alma, eu vos adoro, esclarecei-me, guiai-me, fortificai-me, consolai-me, aconselhai-me, ensinai-me o que devo fazer, dai-me as vossas ordens, eu prometo submeter-me a tudo o que desejardes de mim e a aceitar tudo o que permitirdes que me aconteça, fazei-me conhecer somente a vossa vontade!

Divino Espírito Santo, força da nossa fraqueza, auxílio do nosso nada, sabedoria da nossa ignorância, tende compaixão de nós. Sede a minha luz, sede a minha força, sede o meu amor. Vinde, vivei em mim e transformai-me.

– Ó Espírito Santo, amor do Pai e do Filho, inspirai-me sempre: o que devo pensar, o que devo dizer, o que devo calar, o que devo escrever, como devo agir, aquilo que devo fazer, para alcançar a Vossa glória, a salvação das almas e minha própria santificação. Amen.

Espírito Santo, Deus de Amor, concede-me: uma inteligência que Te conheça; uma angústia que Te procure; uma sabedoria que Te encontre; uma perseverança que, enfim, Te possua. Amen.

– Espírito Santo de Deus, consagro-Te hoje todo o meu ser, vontade, inteligência, memória, imaginação e afectividade. Conduz-me pelos Teus caminhos, guia-me com a Tua sabedoria para a vida plena de Jesus. Cria em mim um coração puro e humilde, mas que tenha a ousadia e o ardor dos mártires. Enche-me com os Teus dons, santifica-me com os Teus frutos. Restaura todo o meu viver, para que eu seja um canal do Teu amor. Amen.

Vem, Espírito Santo, e renova em mim a chama do Teu amor. Enche-me da fé, e revela com a Tua luz todos os meus pecados e traumas. Liberta-me, Espírito Santo, e faz de mim uma nova criatura. Santifica o meu espírito e alma, renovando também todo o meu ser, emoções, mente, ouvidos, olhos, lábios e actos. Capacita-me a viver a Palavra de Jesus Cristo em toda a sua profundidade. E agora, Espírito Santo, dá-me os Teus dons para que eu possa servir melhor o Reino de Deus, amando, indistintamente, todos os meus irmãos. Mas, acima de tudo, derrama o dom do louvor, para que, em tudo e por tudo, eu glorifique o Senhor Nosso Deus. Amen.

 

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Ano da Fé – XLIX

PELIGROSO "GUSTAV" SIGUE FORTALECIÉNDOSE POCO A POCO ANTES DE LLEGAR A CUBA

Creio no Espírito Santo – III

O Espírito Santo vai-se manifestando discretamente, até se revelar em força nos momentos mais decisivos da história da salvação. No Antigo Testamento, «o Espírito Santo, como pessoa, está encoberto», como diz o Papa João Paulo II na sua Encíclica Dominum et Vivificantem (cf. n.º 15). Irrompe no Novo Testamento, depois de o Filho consumar a sua obra de salvação. De facto, como podemos verificar, no Antigo Testamento predomina a figura do Pai; no Novo Testamento predomina a figura do Filho e ao mesmo tempo abre-se o caminho à acção do Espírito Santo na Igreja. Assim se torna explícita a existência da Santíssima Trindade, presente desde o princípio na obra da criação. O Espírito Santo é uma pessoa, mas para se falar dele usa-se a linguagem dos símbolos, que evidenciam aquilo que Ele faz. Eis alguns desses símbolos:

Vento, sinal da força de Deus: o vento destrói obstáculos que pareciam intransponíveis (Act 2, 2) e é símbolo da força, acção e dinamismo de Deus, que se manifestam logo na criação (cf. Gn 1, 2) e depois actuam nos profetas (Ez 1, 4) e nos Apóstolos (Act 2, 2).

Hálito, alma (alento vital) do homem: Gn 2, 7.

Água: os rios de água viva de que fala Jesus em Jo 7, 38 são o símbolo da vida nova no Espírito Santo: “Ele falava do Espírito que deviam receber aqueles que tinham crido nele; pois não havia ainda Espírito, porque Jesus ainda não fora glorificado” (Jo 7, 39).

A pomba é o sinal da simplicidade, da liberdade e da paz, do calor e da vida, e do mistério de Deus. Conforme a pomba que pousa na arca de Noé (Gn 8, 6-12) anuncia a nova humanidade, também aquela que aparece no Baptismo de Jesus (Mt 3, 16) anuncia que Ele é o iniciador da nova criação, o que baptiza no Espírito Santo.

O fogo significa, na Bíblia, a presença amorosa e activa de Deus no meio do seu povo. É sinal de insatisfação, de inquietação, de purificação (Is 6, 6-7; Ez. 1, 4) e entrega à missão, sobretudo ao ministério da Palavra (cf. Act 4, 8. 20: a ânsia de proclamar a Palavra é como um fogo que queima). Por isso em Act 2, 3 o Espírito Santo desce em forma de línguas de fogo.

A acção do Espírito Santo não se opõe à acção de Cristo, mas vem depois dele e graças a ele «para continuar no mundo, mediante a Igreja, a obra da Boa Nova da salvação» (cf. Dominum et Vivificantem, n.º 3). Assim, «o Espírito Santo fará com que perdure sempre na Igreja a mesma verdade, que os Apóstolos ouviram do seu Mestre» (cf. Dominum et Vivificantem, n.º4).

A sua acção concretiza-se em favor de cada pessoa individual, e em favor da Igreja. O Espírito Santo e as suas inspirações não são propriedade privada de ninguém, mas é em confronto com a Igreja que nós devemos avaliar os carismas que o Espírito vai suscitando em cada pessoa.

O Espírito Santo é o Espírito da Verdade. É no seu testemunho que «o testemunho humano dos Apóstolos encontrará o seu mais forte sustentáculo» (cf. Dominum et Vivificantem, n.º 5). Assim o Espírito Santo não ensina nada diferente do que Jesus Cristo ensinou, mas pelo contrário, assegura de modo duradouro a transmissão e irradiação da Boa Nova revelada por Jesus de Nazaré (cf. Dominum et Vivificantem, n.º 7).

Portanto, quem pede: «Vem, Espírito Santo!», tem de estar preparado para dizer: «Vem e incomoda-me onde tenho de ser incomodado!» (Wilhems Stählin).

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Ano da Fé – XLVIII

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Creio no Espírito Santo – I

Queridos irmãos e irmãs, bom dia!

O tempo pascal, que com alegria estamos a viver guiados pela liturgia da Igreja, é por excelência o tempo do Espírito Santo doado «sem medida» (cf. Jo 3, 34) por Jesus crucificado e ressuscitado. Este tempo de graça concluir-se-á com a festa do Pentecostes, na qual a Igreja revive a efusão do Espírito sobre Maria e os Apóstolos reunidos em oração no Cenáculo.

Mas quem é o Espírito Santo? No Credo professamos com fé: «Creio no Espírito Santo que é Senhor e dá a vida». A primeira verdade à qual aderimos no Credo é que o Espírito Santo é Kyrios, Senhor. Isto significa que Ele é verdadeiramente Deus como o Pai e o Filho, objecto do mesmo acto de adoração e glorificação que dirigimos ao Pai e ao Filho. De facto, o Espírito Santo é a terceira Pessoa da Santíssima Trindade; é o grande dom de Cristo Ressuscitado que abre a nossa mente e o nosso coração à fé em Jesus como o Filho enviado pelo Pai e que nos guia para a amizade e a comunhão com Deus.

Mas gostaria de reflectir principalmente sobre o facto de que o Espírito Santo é a fonte inesgotável da vida de Deus em nós. O homem de todos os tempos e lugares deseja uma vida plena e boa, justa e serena, uma vida que não seja ameaçada pela morte, mas que possa amadurecer e crescer até à sua plenitude. O homem é como um viajante que, ao atravessar os desertos da vida, tem sede de água viva, jorrante e fresca, capaz de saciar profundamente o seu desejo de luz, amor, beleza e paz. Todos nós sentimos este desejo! E Jesus doa-nos esta água viva: ela é o Espírito Santo, que procede do Pai e que Jesus derrama nos nossos corações. «Vim para que tenhais vida e vida em abundância», diz-nos Jesus (Jo 10, 10).

Jesus promete à Samaritana que dará a «água viva», em abundância e para sempre, a todos aqueles que o reconhecerem como o Filho enviado pelo Pai para nos salvar (cf. Jo 4, 5-26; 3, 17). Jesus veio para nos dar esta «água viva» que é o Espírito Santo, para que a nossa vida seja guiada, animada e alimentada por Deus. Quando dizemos que o cristão é um homem espiritual entendemos precisamente isto: é uma pessoa que pensa e age em conformidade com Deus, segundo o Espírito Santo. Mas pergunto-me: e nós, pensamos segundo Deus? Agimos em conformidade com Deus? Ou deixamo-nos guiar por muitas outras coisas que não são propriamente Deus? Cada um deve responder a isto no profundo do seu coração.

Nesta altura podemos perguntar-nos: por que esta água pode saciar-nos profundamente? Sabemos que a água é essencial para a vida; sem água morremos; ela sacia, purifica e torna a terra fecunda. Na Carta aos Romanos encontramos esta expressão: «O amor de Deus foi derramado em nossos corações, pelo Espírito Santo, que nos foi concedido» (5, 5). A «água viva», o Espírito Santo, Dom do Ressuscitado que passa a habitar em nós, purifica-nos, ilumina-nos, renova-nos e transforma-nos porque nos torna partícipes da própria vida de Deus que é Amor. Por isso, o Apóstolo Paulo afirma que a vida do cristão é animada pelo Espírito e pelos seus frutos, que são «caridade, alegria, paz, paciência, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, temperança» (Gl 5, 22-23). O Espírito Santo introduz-nos na vida divina como «filhos no Filho Unigénito». Noutro trecho da Carta aos Romanos, que recordámos várias vezes, são Paulo sintetiza-o com estas palavras: «Na verdade, todos aqueles que são movidos pelo Espírito de Deus, são filhos de Deus. Vós não recebestes um espírito de escravidão, para cair de novo no temor; recebestes, pelo contrário, um espírito de adopção, pelo qual chamamos: “Abba, Pai”. O próprio Espírito atesta em união com o nosso espírito que somos filhos de Deus; filhos e igualmente herdeiros – herdeiros de Deus e co-herdeiros de Cristo – se sofremos com Ele, é para sermos também glorificados com Ele» (8, 14-17). Este é o dom precioso que o Espírito Santo derrama nos nossos corações: a própria vida de Deus, vida de filhos verdadeiros, uma relação de intimidade, liberdade e confiança no amor e na misericórdia de Deus, que tem como efeito também um olhar novo para os outros, próximos e distantes, vistos sempre como irmãos e irmãs em Jesus, que devem ser respeitados e amados. O Espírito Santo ensina-nos a ver com os olhos de Cristo, a viver e a compreender a vida como Ele o fez . Eis por que a água viva que é o Espírito Santo sacia a nossa vida, porque nos diz que somos amados por Deus como filhos, que podemos amar Deus como seus filhos e com a sua graça podemos viver como filhos de Deus, como Jesus. E nós, escutamos o Espírito Santo? O que nos diz? Diz-nos: Deus ama-te. É o que nos diz. Deus ama-te, gosta de ti. Nós amamos deveras Deus e os outros, como Jesus? Deixemo-nos guiar pelo Espírito Santo, permitamos que Ele nos fale ao coração e nos diga: Deus é amor, Deus espera-nos, Deus é Pai, ama-nos como verdadeiro pai, ama-nos verdadeiramente e só o Espírito Santo diz isto ao nosso coração. Ouçamos o Espírito Santo, escutemos o Espírito Santo e vamos em frente por este caminho de amor, misericórdia e perdão. Obrigado!

Papa Francisco

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Ano da Fé – XLVII

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A ressurreição de Jesus – II

É a partir do testemunho e da fé dos apóstolos que nós acreditamos na ressurreição de Jesus: “Este Jesus, Deus ressuscitou-o: e disso todos nós somos testemunhas” (Act 2, 32). Hoje nós acreditamos sem ter visto. Os apóstolos, esses, viram e acreditaram. Por terem visto, eles podem atestar o acontecimento da ressurreição e dar testemunho que o Ressuscitado é, de facto, Jesus de Nazaré. Mas, se eles viram, foi para que nós pudéssemos acreditar, graças ao seu testemunho.

A ressurreição é a resposta amorosa de Deus ao amor filial e fiel de Jesus, mostrando quem era o inocente e quem eram os pecadores. Pela ressurreição Deus confirmou os actos e as palavras de Jesus bem como a autoridade que ele se tinha atribuído. Manifestou que em Jesus o Reino chegou, que Aliança Nova foi selada e que Jesus é o Messias prometido, o Ungido do Senhor. Nele as promessas de Deus estão realizadas. A ressurreição é a chegada de um mundo novo anunciado pelos profetas.

A ressurreição não constituiu simplesmente um triunfo para Jesus, mas é causa da nossa salvação: “foi ressuscitado para nossa justificação” (Rom 4, 25). Recebeu o poder divino de dar a vida e tornou-se o fundador da nova humanidade, o novo Adão, que nos faz renascer como filhos de Deus e conduz o mundo à sua perfeição. A vitória sobre o mal é certa. A história encaminha-se para a salvação; a última palavra pertence à graça de Deus. Devemos sacudir de nós a tristeza e a resignação, para nos abrirmos à coragem da esperança.

O acontecimento da morte e da ressurreição de Cristo é o coração do Cristianismo, o ponto central e fundamental da nossa fé, o poderoso impulso da nossa certeza, o vento forte que afugenta toda a angústia e incerteza, a dúvida e o calculismo humano (Bento XVI).

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Ano da Fé – XLVI

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A ressurreição de Jesus – I

A ressurreição de Jesus é o fundamento e o objecto por excelência da fé e da esperança cristãs. “Se Cristo não ressuscitou, não tem sentido a nossa pregação e também não tem sentido a vossa fé” – declara São Paulo (1Cor 15, 14). Os cristãos estão encarregados, no seguimento dos Apóstolos, a anunciar ao mundo esta “boa nova”: Cristo ressuscitou!

Ninguém assistiu à ressurreição de Jesus. Ela foi anunciada, primeiro, por um mensageiro de Deus, um anjo, que disse às mulheres: “Não tenhais medo; sei que procurais Jesus, o Crucificado. Não está aqui: ressuscitou, como tinha dito. Vinde ver o lugar onde jazia. Mas ide depressa dizer aos seus discípulos: ele ressuscitou dos mortos e vai à vossa frente para a Galileia. Lá o vereis!” (Mt 28, 5-7). No primeiro dia da semana, elas foram as primeiras a vir ao túmulo e a encontrá-lo vazio; foram elas as primeiras a receber o anúncio da ressurreição.

Se ninguém assistiu à saída do túmulo, Jesus ressuscitado deu-se a ver “às testemunhas que Deus tinha antecipadamente escolhido” – como Pedro o declarará em casa de Cornélio – : “a nós que comemos e bebemos com ele depois da sua ressurreição de entre os mortos” (Act 10, 41). Os discípulos de Jesus não cessaram de atestar com força e perseverança, e mesmo com perigo da própria vida, terem visto Jesus vivo.

A ressurreição de Jesus não é um regresso ao modo de vida anterior – o nosso – estabelecido sob a lei da morte. Deste ponto de vista a ressurreição de Jesus difere radicalmente de uma ressurreição provisória, como a de Lázaro, ou a de qualquer outra pessoa, realizada por Jesus. “Ressuscitado dos mortos, Cristo já não pode morrer; a morte já não tem domínio sobre ele”(Rm 6, 9).

É sempre por iniciativa gratuita da sua parte que Jesus, do lado de lá da morte, torna o seu corpo visível a homens e mulheres que não são ressuscitados. Os relatos das aparições insistem fortemente sobre a originalidade absoluta da presença de Jesus. Ele torna-se presente e desaparece de uma maneira nova, diferente das maneiras anteriores de se encontrar com as pessoas e, todavia, é sempre ele! Deste modo os discípulos poderão atestar, de geração em geração, a identidade entre o Crucificado e o Ressuscitado.

Quem compreende a Páscoa não desespera (Dietrich Bonhoeffer).

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Ano da Fé – XLIV

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A descida aos infernos

Conforme afirma a fé da Igreja formulada no “Credo apostólico”, Jesus ao morrer “desceu aos infernos”. O que significa esta expressão um tanto obscura? Os infernos são a morada simbólica dos defuntos. No tempo de Jesus considerava-se que aí havia lugares e condições diferentes para os justos e para os maus, enquanto uns e outros esperavam a recompensa plena no juízo final.

Jesus foi ter com os mortos “pregar aos espíritos que estavam na prisão da morte” (1Pe 3, 1; Ef 4, 9-10) e em seguida ressuscitou dos mortos. Foi ao encontro dos mortos como Salvador, levou-lhes os benefícios da sua morte redentora. O sentido desta fé neotestamentária resume-se em três afirmações: Jesus morreu de verdade; a sua morte redentora tem valor salvífico para todos os homens, mesmo para os que viveram antes dele; o seu encontro com os justos, que já tinham morrido, comunica-lhes a plenitude da comunhão com Deus. Definitivamente, a descida aos infernos, mais do que a sujeição à morte, é vitória sobre ela.

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Ano da Fé – LXIII

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Jesus na cruz

Jesus foi condenado à morte de cruz, suplício reservado aos escravos e aos criminosos de direito comum. Suplício infamante e atroz ao mesmo tempo. Na cruz, segundo Mateus 27, 46 e Mc 15, 34,  Jesus pronuncia estas palavras: “Meu Deus, meu Deus , porque me abandonaste?”. Este grito, que a tradição judaica aplica ao Justo sofredor, é a expressão do abismo a que pode descer o homem que se sente abandonado por Deus, mas é também uma oração confiante, na medida em que Jesus retoma aqui a primeira frase do salmo 21, cuja segunda parte é uma proclamação de esperança saída do mais profundo abatimento, um abandono filial. Algumas experiências dos místicos ajudam-nos a intuir, por analogia, quão tremenda foi para Jesus a experiência do abandono por parte do Pai: “Não há sofrimento maior para a pessoa do que o pensamento de ter sido abandonado por Deus… A alma experimenta vivamente a sombra da morte, o lamento da morte e os sofrimentos do inferno” (São João da Cruz).

São Lucas e São João dão à morte de Jesus uma luz complementar. Em Lucas, Jesus perdoa aos seus algozes (cf. Lc 23, 34), promete o paraíso, “hoje mesmo”, ao malfeitor arrependido (Lc 23, 43) e a sua última palavra é uma palavra de abandono confiante nas mãos do Pai: “Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito” (Lc 23, 46). João, por seu lado, refere a palavra comovente de Jesus a sua Mãe e ao discípulo que ele amava: “Mulher, eis o teu filho. (…) Eis a tua Mãe” (Jo 19, 26-27).

Jesus manifestou na cruz uma confiança filial absoluta para com o Pai, assim como um amor infinito para com todos – para com os inimigos como para os seres mais queridos – no meio de um sofrimento e de um abandono que temos dificuldade em imaginar.

A cruz foi, é e será sempre um escândalo e uma loucura. É necessário realizar a conversão para reconhecer o Salvador num homem crucificado. E todavia “o que é loucura de Deus é mais sábio do que os homens, e o que é fraqueza de Deus é mais forte do que os homens” (1Cor 1, 25). Para permanecer ao pé da cruz será sempre necessário uma conversão de olhar: “Hão-de olhar para Aquele que trespassaram” (Jo 19, 37). A morte de Jesus, assumida por amor e obediência à missão recebida do Pai, é revelação da glória de Deus. É o testemunho último e inesgotável de que “Deus amou de tal maneira o mundo que entregou o seu Filho único, para que todo o homem que acredita n’Ele não se perca” (Jo 3, 16).

Se levares alegre a tua cruz, ela te levará (Tomás de Kempis).

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Ano da Fé – XLII

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 A agonia e condenação de Jesus à morte

Depois da última ceia Jesus entra em agonia, isto é, numa luta interior entre o desejo de não ser entregue ao “domínio das trevas” (Lc 22, 53), de escapar à morte sangrenta que se anuncia, e o de realizar até ao fim a vontade do Pai e a missão recebida. Jesus confessa que “está triste com uma tristeza de morte” (Mt 26, 38). Nesta cena dolorosa de combate e de tentação, nesta hora de angústia, Jesus partilha a aflição que qualquer homem sente diante da morte.

Ao contrário dos discípulos que não conseguem contrariar o sono, Jesus dá exemplo de uma oração incessante, dizendo: “Pai, se este cálice não pode passar sem que eu o beba, faça-se a tua vontade” (Mt 26, 42).

Depois da agonia Jesus foi preso, conforme as indicações de Judas, o traidor. Jesus vai sujeitar-se a um duplo processo: primeiro, o judaico, no decurso do qual o Sinédrio, presidido por Caifás, o acusa formalmente de blasfémia, por ter respondido “Dizeis bem, Eu o sou” à pergunta “Tu és, então, o Filho de Deus?”; depois, o romano, ao comparecer diante de Pilatos, o governador da província; só ele tem direito de condenar à morte e de fazer executar a sentença. Por este duplo processo os evangelistas mostram que a morte de Jesus é da responsabilidade dos homens, de todos os homens, que se uniram na mesma cumplicidade pecadora para levar Jesus à morte. Jesus é o Justo, cuja vida e testemunho se tinham tornado insuportáveis aos olhos deles. Ele é o Inocente condenado. Na condenação de Jesus entram em acção simultâneamente, por um lado, a liberdade dos homens e, por outro, a liberdade soberana de Jesus, que se insere nos frutos amargos do pecado para aí fazer triunfar o amor.

Jesus não somente é julgado e condenado pelas autoridades religiosas e políticas, depois de ter sido traído por Judas, mas é escarnecido e torturado pelos soldados, apupado pela multidão que a ele prefere Barrabás, desamparado dos seus e renegado por Pedro. Abandonado à sua solidão, ele faz a experiência do fracasso e da contradição total. A acção que leva à morte é obra dos homens e a acção que leva à vida é obra de Deus. Só o desígnio de amor de Deus (cf. 1Jo 4, 10) podia fazer servir esta morte à reconciliação e à salvação daqueles que a infligiram.

Só quem seriamente ponderou quão pesada é a cruz pode conceber quão pesado é o pecado (Santo Anselmo de Cantuária).

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