Não é possível aderir a Cristo, impondo condições

Prezados irmãos e irmãs, bom dia!

Prosseguindo a reflexão sobre o Batismo, hoje gostaria de meditar sobre os ritos centrais, que têm lugar ao pé da pia batismal.

Consideremos antes de tudo a água, sobre a qual é invocado o poder do Espírito, a fim de que tenha a força de regenerar e renovar (cf. Jo 3, 5 e Tt 3, 5). A água é matriz de vida e de bem-estar, enquanto a sua falta provoca o esmorecimento de toda a fecundidade, como acontece no deserto; mas a água pode ser também causa de morte, quando submerge entre as suas ondas, ou em grande quantidade devasta tudo; por fim, a água tem a capacidade de lavar, limpar e purificar.

A partir deste simbolismo natural, universalmente reconhecido, a Bíblia descreve as intervenções e as promessas de Deus através do sinal da água. No entanto, o poder de perdoar os pecados não está na água em si, como explicava Santo Ambrósio aos neófitos: «Viste a água, mas nem toda a água cura: só sara a água que tiver em si a graça de Cristo. […] A ação é da água, mas a eficácia é do Espírito Santo» (De sacramentis 1, 15).

Por isso, a Igreja invoca a ação do Espírito sobre a água, «a fim de que, aqueles que nela receberem o Batismo, sejam sepultados com Cristo na morte e, com Ele, ressuscitem para a vida imortal» (Rito do Batismo das crianças, n. 60). A prece de bênção diz que Deus preparou a água «para ser sinal do Batismo», recordando as principais prefigurações bíblicas: sobre as águas primordiais pairava o Espírito, para as transformar em germe de vida (cf. Gn 1, 1-2); a água do dilúvio marcou o fim do pecado e o início da nova vida (cf. Gn 7, 6-8, 22); através da água do Mar Vermelho, os filhos de Abraão foram libertados da escravidão do Egito (cf. Êx 14, 15-31). A propósito de Jesus, recorda-se o Batismo no Jordão (cf. Mt 3, 13-17), o sangue e a água derramados do seu lado (cf. Jo 19, 31-37), e o mandato dado aos discípulos, para batizar todos os povos em nome da Trindade (cf. Mt 28, 19). Revigorados por esta memória, pede-se a Deus que infunda na água da pia batismal a graça de Cristo morto e ressuscitado (cf. Rito do Batismo das crianças, n. 60). E assim, esta água é transformada em água que traz em si a força do Espírito Santo. E mediante esta água, com a força do Espírito Santo, batizamos as pessoas, os adultos, as crianças, todos.

Santificada a água da pia batismal, é preciso dispor o coração para aceder ao Batismo. Isto acontece mediante a renúncia a Satanás e a profissão de fé, dois gestos estritamente ligados entre si. Na medida em que digo “não” às sugestões do diabo — aquele que divide — torno-me capaz de dizer “sim” a Deus, que me chama a conformar-me com Ele nos pensamentos e nas ações. O diabo divide; Deus une sempre a comunidade, as pessoas num único povo. Não é possível aderir a Cristo, impondo condições. É necessário desapegar-se de certos vínculos para poder realmente abraçar outros; ou estás de bem com Deus, ou com o diabo. Por isso, a renúncia e o ato de fé caminham juntos. É preciso eliminar pontes, deixando-as atrás, para empreender o novo Caminho, que é Cristo.

A resposta às perguntas — «Renunciais a Satanás, a todas as suas obras e a todas as suas seduções?» — é dada na primeira pessoa do singular: «Renuncio». E do mesmo modo é professada a fé da Igreja, dizendo: «Creio». Eu renuncio, eu creio: isto está na base do Batismo. É uma opção responsável, que deve ser traduzida em gestos concretos de confiança em Deus. O ato de fé supõe um compromisso que o próprio Batismo ajudará a manter com perseverança nas várias situações e provas da vida. Recordemos a antiga sabedoria de Israel: «Meu filho, se te apresentares para servir o Senhor, prepara-te para a tentação» (Eclo 2, 1), ou seja, prepara-te para o combate. E a presença do Espírito Santo concede-nos a força para lutar bem.

Estimados irmãos e irmãs, quando molhamos a mão na água benta — ao entrar numa igreja, tocamos a água benta — e fazemos o sinal da Cruz, pensemos com alegria e gratidão no Batismo que recebemos — esta água benta recorda-nos o Batismo — e renovemos o nosso “Amém” — “Estou feliz” — para viver imersos no amor da Santíssima Trindade.

Papa Francisco, Audiência Geral, 2 de Maio de 2018

 

Abrir

Tenho um Amigo que adora encontrar-se comigo todos os dias

Um dia também perguntaram a uma amiga minha, muito nova e muito competente na sua área de especialidade, porque é que se levantava todos os dias uma hora mais cedo para ir à Missa antes de chegar ao trabalho. Também sem hesitar, esta minha querida amiga respondeu: “Tenho um Amigo que adoro e com quem conto para a vida que também me adora e gosta de Se encontrar comigo todos os dias. Marcamos encontro logo de manhã, porque gosto de conversar com Ele e de o ouvir antes de começar a fazer coisas e a tomar decisões. Sei que Ele nunca falha e está lá todos os dias à minha espera e, também por isso, não quero faltar ao encontro nem falhar!”

Desde que ouvi esta minha amiga dar esta resposta, sinto que também é por isso que vou à Missa todos os dias.

Laurinda Alves

Abrir

“Quem permanece em mim e Eu nele, esse dá muito fruto”

Para ser santo não é necessário ser bispo, sacerdote, religioso ou religiosa. Todos nós somos chamados a ser santos vivendo com amor e oferecendo a cada um o seu próprio testemunho nas ocupações de todos os dias, ali onde se encontra. Neste sentido, toda a actividade, pequena ou grande que seja – o trabalho e o descanso, a vida familiar e social, o exercício de responsabilidades políticas, culturais e económicas – toda a actividade, se vivida em união com Jesus e com uma atitude de amor e de serviço, é uma oportunidade para viver em plenitude o Baptismo e a santidade evangélica.

Jesus apresenta-se como a verdadeira videira e convida-nos a permanecer unidos a Ele para podermos dar muito fruto. A videira é uma planta que forma uma única coisa com os ramos; e os ramos só são fecundos quando estão unidos à videira. Esta relação é o segredo da vida cristã e o evangelista João expressa-a com o verbo permanecer, que na passagem do evangelho de hoje é repetida sete vezes.

Trata-se de permanecer com o Senhor para encontrar a coragem de sair de nós mesmos, das nossas comodidades, dos nossos espaços restritos e protegidos, para entramos no mar aberto das necessidades dos outros e dar ampla respiração ao nosso testemunho cristão no mundo. Essa coragem de entrar nas necessidades dos outros nasce da fé no Senhor ressuscitado e da certeza de que o seu Espírito acompanha a nossa história. Neste sentido, um dos frutos mais maduros que brota da comunhão com Cristo é, de facto, o compromisso de caridade para com o próximo, amando os irmãos com abnegação de si mesmo, até às últimas consequências, como Jesus nos amou. O dinamismo da caridade do crente não é o resultado de estratégias, não nasce de solicitações externas, de instâncias sociais ou ideológicas, mas do encontro com Jesus e do permanecer em Jesus. Ele é para nós a videira da qual absorvemos a linfa, isto é, a vida para levar para a sociedade uma maneira diferente de viver e de se doar, que coloca em primeiro lugar os últimos.

Quando alguém é íntimo com o Senhor, como são íntimos e unidos entre si a videira e os ramos, tem-se a capacidade de produzir frutos de vida nova, de misericórdia, de justiça e de paz, derivados da ressurreição do Senhor. Isto é o que os santos fizeram, aqueles que viveram em plenitude a vida cristã e o testemunho da caridade, porque foram verdadeiros ramos da videira do Senhor.

Papa Francisco, Regina Coeli (resumo), 29 de Abril de 2018

Abrir

5º Domingo da Páscoa – Ano B

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São João (Jo 15, 1-8) 

Naquele tempo disse Jesus aos seus discípulos: «Eu sou a videira verdadeira e o meu Pai é o agricultor. Ele corta todo o ramo que não dá fruto em mim e poda o que dá fruto, para que dê mais fruto ainda. Vós já estais purificados pela palavra que vos tenho anunciado.

Permanecei em mim, que Eu permaneço em vós. Tal como o ramo não pode dar fruto por si mesmo, mas só permanecendo na videira, assim também acontecerá convosco, se não permanecerdes em mim. Eu sou a videira; vós, os ramos. Quem permanece em mim e Eu nele, esse dá muito fruto, pois, sem mim, nada podeis fazer. Se alguém não permanece em mim, é lançado fora, como um ramo, e seca. Esses são apanhados e lançados ao fogo, e ardem.

Se permanecerdes em mim e as minhas palavras permanecerem em vós, pedi o que quiserdes, e assim vos acontecerá. Nisto se manifesta a glória do meu Pai: em que deis muito fruto e vos comporteis como meus discípulos.» 

Reflexão 

No Antigo Testamento (e de forma especial na mensagem dos profetas), a videira e a vinha eram símbolos do Povo de Deus. A videira que era Israel produziu uvas azedas em vez de uvas boas e doces, porque abandonou o Deus verdadeiro, para ir atrás dos ídolos. Mas «a videira, a verdadeira», que é Jesus, está agora plantada no meio de nós. E nós podemos ser os seus ramos, enxertados nele, e dar assim uvas boas e doces, Bom e Belo fruto. Basta, para tanto, permanecer nele, que é «a videira, a verdadeira», e deixar a sua vida, a sua seiva, vivificar os ramos. Trata-se, para nós, de permanecer em Jesus, como ele permanece em nós, pois veio habitar em nós. Habitar nele é fazer dele a nossa casa onde nos alimentamos, repousamos, pacificamos das nossas agitações, decepções, fracassos, lutas e incompreensões.

Ser cristão hoje exige uma experiência vital com Jesus Cristo, um conhecimento interior da sua pessoa e uma paixão pelo seu projecto. O decisivo no momento que estamos a viver é “permanecer nele”. É importante e necessário que toda a Igreja compreenda bem que a sua segurança, a paz e os frutos não nascem de técnicas cada vez mais apuradas nem de mecanismos político-económicos cada vez mais sofisticados, mas do seu abandono seguro na Palavra de Deus e no Espírito que a conforta e sustenta porque “Cristo, (…) é como uma abundante mina com muitas cavidades cheias de riquezas, e por mais que se cave, nunca se lhes encontra fim nem termo; pelo contrário, aqui e além, vão encontrando em cada cavidade novos veios de novas riquezas” (São João da Cruz).

Palavra para o caminho 

O Pai, que é o agricultor, corta todo o ramo que não dá fruto e poda o que dá fruto, para que dê mais fruto ainda. O Pai poda-nos através da comunidade, dos amigos, dos pobres e, também, através dos que nos criticam e fazem frente…. Alguns podam-se a eles próprios para darem mais fruto. A maioria das podas acontecem sem serem procuradas. Trá-las a própria vida. São podas involuntárias, a tempo ou fora de tempo. A Carmelita Santa Teresa Benedita da Cruz (Edith Stein) tem uma afirmação que nos pode ajudar a compreender esta acção do Pai e a sua finalidade: “Quanto mais elevado é o grau de união amorosa ao qual Deus destina a alma, tanto mais profunda e persistente deverá ser a sua purificação”. É uma morte que é geradora de vida, e vida em abundância (Jo 10, 10).

É interessante repassar a vida dos santos: quanto mais santos, mais podas e provas tinham: físicas, morais e espirituais. Deus os podava para que dessem mais fruto. Provou Santa Teresa de Jesus e São João da Cruz, e como os provou. Provou e podou Santa Teresinha de Lisieux. Provou e podou São João Bosco. Provou e podou o santo padre Pio de Pietrelcina. Provou e podou São João Paulo II. Graças a essa poda, caem de nós os galhos inúteis, os empecilhos que dificultavam a passagem triunfal da seiva de Cristo, as folhas secas da nossa vontade própria, dos nossos desejos vácuos, infantis e caprichosos. 

Abrir

A vida cristã é um combate sem fim contra o mal

Estimados irmãos e irmãs, bom dia!

Continuemos a nossa reflexão sobre o Batismo, sempre à luz da Palavra de Deus.

É o Evangelho que ilumina os candidatos e suscita a adesão de fé: «O Batismo é, de modo totalmente particular, o “sacramento da fé”, uma vez que é a entrada sacramental na vida de fé» (Catecismo da Igreja Católica, 1236). E a fé é a entrega de nós mesmos ao Senhor Jesus, reconhecido como «nascente de água […] para a vida eterna» (Jo 4, 14), «luz do mundo» (Jo 9, 5), «vida e ressurreição» (Jo 11, 25), como ensina o itinerário percorrido, ainda hoje, pelos catecúmenos já prestes a receber a iniciação cristã. Educados pela escuta de Jesus, pelo seu ensinamento e pelas suas obras, os catecúmenos voltam a viver a experiência da mulher samaritana sedenta de água viva, do cego de nascença que adquire a vista, de Lázaro que sai do sepulcro. O Evangelho traz em si a força de transformar quem o recebe com fé, arrancando-o do domínio do maligno, a fim de que aprenda a servir o Senhor com alegria e novidade de vida.

À pia batismal nunca vamos sozinhos, mas acompanhados pela oração da Igreja inteira, como recordam as ladainhas dos Santos que precedem a prece de exorcismo e a unção pré-batismal com o óleo dos catecúmenos. São gestos que, desde a antiguidade, asseguram a quantos se preparam para renascer como filhos de Deus, que a oração da Igreja os assiste na luta contra o mal, os acompanha no caminho do bem, os ajuda a libertar-se do poder do pecado, a fim de passar para o reino da graça divina. A prece da Igreja. A Igreja reza, e reza por todos, por todos nós! Nós, Igreja, oramos pelos outros. É bom rezar pelos outros. Quantas vezes, quando não temos uma necessidade urgente, não rezamos. Devemos orar pelos outros, unidos à Igreja: “Senhor, peço-vos pelas pessoas que estão em necessidade, por quantos não têm fé…”. Não vos esqueçais: a oração da Igreja está sempre em ação. Mas nós devemos entrar nesta prece e rezar por todo o povo de Deus, e por aqueles que precisam de orações. Por isso, o caminho dos catecúmenos adultos está marcado por reiterados exorcismos pronunciados pelo sacerdote (cf. CIC, 1237), ou seja, por orações que invocam a libertação de tudo o que separa de Cristo e impede a íntima união com Ele. Pede-se a Deus até pelas crianças, para que as liberte do pecado original e as consagre como morada do Espírito Santo (cf. Rito do Batismo das crianças, n. 56). As crianças. Rezar pelas crianças, pela sua saúde espiritual e corporal. É um modo de proteger as crianças com a oração. Como testemunham os Evangelhos, o próprio Jesus combateu e expulsou os demónios para manifestar a vinda do reino de Deus (cf. Mt12, 28): a sua vitória sobre o poder do maligno deixa espaço ao senhorio de Deus, que rejubila e reconcilia com a vida.

O Batismo não é uma fórmula mágica, mas um dom do Espírito Santo que torna quem o recebe capaz de «lutar contra o espírito do mal», acreditando que «Deus enviou ao mundo o seu Filho para destruir o poder de Satanás e transferir o homem das trevas para o seu Reino de luz infinita» (cf. Rito do Batismo das crianças, n. 56). Sabemos por experiência que a vida cristã está sempre sujeita à tentação, sobretudo à tentação de se separar de Deus, da sua vontade, da comunhão com Ele, para voltar a cair na rede das seduções mundanas. E o Batismo prepara-nos, dá-nos força para esta luta quotidiana, até para a luta contra o diabo que — como diz São Pedro — como um leão, procura devorar-nos, destruir-nos.

Além da oração, há a unção no peito com o óleo dos catecúmenos, os quais «dele recebem vigor para renunciar ao diabo e ao pecado, antes de se aproximarem da fonte e ali renascerem para a nova vida» (Bênção dos óleos, Premissas, n. 3). Devido à propriedade do óleo de penetrar nos tecidos do corpo, proporcionando-lhe benefício, os antigos lutadores costumavam ungir-se de óleo para tonificar os músculos e para ativar mais facilmente as garras do adversário. À luz deste simbolismo, os cristãos dos primeiros séculos adotaram o uso de ungir o corpo dos candidatos ao Batismo com o óleo benzido pelo do Bispo [Eis a prece de bênção, expressiva do significado deste óleo: «Ó Deus, sustentáculo e defesa do vosso povo, abençoai este óleo, no qual quisestes oferecer-nos um sinal da vossa fortaleza divina; concedei energia e vigor aos catecúmenos que serão por ele ungidos, a fim de que, iluminados pela vossa sabedoria, compreendam mais profundamente o Evangelho de Cristo; sustentados pelo vosso poder, assumam com generosidade os compromissos da vida cristã; e, tornando-se dignos da adoção de filhos, tenham a alegria de renascer e viver na vossa Igreja»: Bênção dos óleos, n. 21], com a finalidade de significar, mediante este «sinal de salvação», que o poder de Cristo Salvador fortalece para lutar contra o mal e para o derrotar (cf. Rito do Batismo das crianças, n. 105).

É cansativo combater contra o mal, escapar dos seus enganos, recuperar a força depois de uma luta extenuante, mas devemos saber que toda a vida cristã é um combate. Contudo, devemos saber também que não estamos sozinhos, que a Mãe Igreja reza a fim de que os seus filhos, regenerados no Batismo, não sucumbam às emboscadas do maligno, mas que as vençam pelo poder da Páscoa de Cristo. Fortalecidos pelo Senhor Ressuscitado, que derrotou o príncipe deste mundo (cf. Jo 12, 31), também nós podemos repetir com a fé de São Paulo: «Tudo posso n’Aquele que me dá força» (Fl 4, 13). Todos nós podemos vencer, vencer tudo, mas com a força que nos vem de Jesus.

Papa Francisco, Audiência Geral, 25 de Abril de 2018


Abrir

Santificar-se na normalidade do dia a dia

Quando estava na prisão, o Cardeal Francisco Xavier Nguyen van Thuan renunciou a desgastar-se com a ânsia da sua libertação. A sua decisão foi «viver o momento presente, cumulando-o de amor»; eis o modo como a concretizava: «aproveito as ocasiões que vão surgindo cada dia para realizar ações ordinárias de maneira extraordinária».

Papa Francisco, Gaudete et Exsultate , nº 17

Abrir

Deixar-se conhecer por Jesus

A liturgia deste IV Domingo de Páscoa – Domingo do Bom Pastor – prossegue no intento de nos ajudar a redescobrir a nossa identidade de discípulos do Senhor Ressuscitado. Nos Actos dos Apóstolos Pedro declara abertamente que a cura do enfermo, operada por ele e da qual fala toda a Jerusalém, foi feita em nome de Jesus, porque “em nenhum outro há salvação” (At 4,12).

Naquele homem curado encontra-se cada um de nós – aquele homem é a nossa figura, todos estamos ali –, encontram-se as nossas comunidades: cada um pode curar-se das muitas formas de enfermidade espiritual – ambição, preguiça, orgulho – se aceitar colocar confiadamente a sua própria existência nas mãos do Senhor Ressuscitado. “No nome de Jesus Cristo, o Nazareno – afirma Pedro – este homem está curado diante de vós.” Mas quem é Cristo que nos cura? Em que consiste o ser curado por Ele? De que nos cura? E mediante que atitudes?

A resposta a todas estas perguntas encontramo-la no Evangelho deste Domingo, onde Jesus diz: “Eu sou o bom pastor. O bom pastor dá a vida pelas ovelhas” (Jo 10,11). Esta auto-apresentação de Jesus não pode ser reduzida a uma mera sugestão emotiva, sem nenhum efeito concreto! Jesus cura mediante o seu ser pastor que dá a vida. Dando a sua vida por nós, Jesus diz a cada um: “a tua vida vale tanto para mim, que para salvá-la dou todo o meu ser”. É exactamente esse oferecer a sua vida que o torna Pastor bom por excelência, Aquele que cura, Aquele que nos permite viver uma vida bonita e fecunda”.

A mesma página evangélica diz-nos quais as condições com que Jesus pode curar-nos e pode tornar a nossa vida alegre e fecunda: “Eu sou o bom pastor. Conheço as minhas ovelhas, e elas conhecem-me, assim como o Pai me conhece e eu conheço o Pai” (Jo 10, 14-15). Jesus não fala de um conhecimento intelectual mas de uma relação pessoal, de predilecção, de ternura recíproca, reflexo da mesma relação íntima de amor entre Ele e o Pai. Esta é a atitude mediante a qual se realiza uma relação viva com Jesus: deixar-se conhecer por Ele. “Não fechar-se em si mesmo, abrir-se ao Senhor, para que Ele me conheça. Ele está atento a cada um de nós, conhece profundamente o nosso coração, conhece as nossas qualidades e os nossos defeitos, os projectos que realizamos e as esperanças que foram desiludidas. Mas aceita-nos como somos, também com os nossos pecados, para curar-nos, para perdoar-nos, guia-nos com amor, para que possamos atravessar estradas difíceis de transitar sem perder o caminho. Ele acompanha-nos”.

Somos chamados a conhecer Jesus, o que implica um encontro com ele, um encontro que desperta o desejo de o seguir, abandonando atitudes auto-referenciais para percorrer novos caminhos, indicados pelo próprio Cristo e abertos para horizontes mais amplos. 

Quando nas nossas comunidades se esfria o desejo de viver a relação com Jesus, de escutar a sua voz e de o seguir fielmente, é inevitável que prevaleçam outros modos de pensar e de viver não coerentes com o Evangelho.

Papa Francisco, Regina Coeli (resumo), 22 de Abril de 2018

Abrir

4º Domingo da Páscoa – Ano B

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São João (Jo 10, 11-18)

Naquele tempo disse Jesus: «Eu sou o bom pastor. O bom pastor dá a sua vida pelas ovelhas. O mercenário, e o que não é pastor, a quem não pertencem as ovelhas, vê vir o lobo e abandona as ovelhas e foge e o lobo arrebata-as e espanta-as, porque é mercenário e não lhe importam as ovelhas. Eu sou o bom pastor; conheço as minhas ovelhas e as minhas ovelhas conhecem-me, assim como o Pai me conhece e Eu conheço o Pai; e ofereço a minha vida pelas ovelhas. Tenho ainda outras ovelhas que não são deste redil. Também estas Eu preciso de as trazer e hão-de ouvir a minha voz; e haverá um só rebanho e um só pastor. É por isto que meu Pai me tem amor: por Eu oferecer a minha vida, para a retomar depois. Ninguém ma tira, mas sou Eu que a ofereço livremente. Tenho poder de a oferecer e poder de a retomar. Tal é o encargo que recebi de meu Pai.»

Reflexão

O evangelho deste quarto Domingo da Páscoa apresenta-nos a parábola do Bom Pastor. Por esta razão este Domingo é também chamado o Domingo do Bom Pastor. No evangelho de hoje, Jesus apresenta-se como o Bom Pastor que veio “para que todos tenham vida e a tenham em abundância” (Jo 10, 10). Naquele tempo, o pastor era a imagem do líder. Jesus diz que muitos se apresentavam como pastores, mas na realidade eram “ladrões e salteadores”. Hoje acontece a mesma coisa. Há pessoas que se apresentam como líderes, mas na realidade, em vez de servir, procuram os próprios interesses. Alguns têm um modo de falar tão suave e fazem uma propaganda tão inteligente que conseguem enganar os outros.

O nosso texto começa com a afirmação de Jesus: “Eu sou o Bom Pastor”. Naquela época todos sabiam o que era um pastor e como vivia e trabalhava. Mas Jesus não é um pastor qualquer, mas sim o Bom Pastor! As palavras em grego (kalós) e hebraico (tôb) usadas para traduzir “bom” têm um sentido mais amplo: além de Bom, significam também Belo, Perfeito e Verdadeiro Pastor.

Quando entre os primeiros cristãos começaram os conflitos e dissensões entre grupos e diferentes líderes, houve necessidade de recordar que, na comunidade de Jesus, só ele é o Bom Pastor. Não um pastor mais, mas o autêntico, o verdadeiro, o modelo a seguir por todos. Ontem como hoje!

Há dois pontos em que Jesus insiste: 1). A defesa da vida das ovelhas: o bom pastor dá a sua vida pelas ovelhas. 2). O mútuo reconhecimento entre o pastor e as ovelhas: o pastor conhece as suas ovelhas e elas conhecem o pastor. Jesus diz que o povo tem a percepção para saber quem é o bom pastor. Era isto que os fariseus não aceitavam. Eles desprezavam as ovelhas e chamavam-nas de povo maldito e ignorante (Jo 7,49; 9,34). Eles pensavam ter o olhar certo para discernir as coisas de Deus. Na realidade eram cegos. O discurso sobre o Bom Pastor ensina duas regras para curar este tipo bastante frequente de cegueira: 1). Prestar muita atenção à reacção das ovelhas, pois elas reconhecem a voz do pastor. 2). Prestar muita atenção à atitude daquele que se diz pastor para ver se o seu interesse é ou não a vida das ovelhas e se ele é ou não capaz de dar a vida por elas.

Palavra para o caminho

Ocorrendo neste Domingo o 55º Dia Mundial de Oração pelas Vocações, reproduzimos esta afirmação do Papa Bento XVI: “Os jovens que hoje consagrei sacerdotes não são diferentes dos outros jovens, mas foram tocados profundamente pela beleza do amor de Deus, e não puderam deixar de responder com toda a sua vida. Como encontraram o amor de Deus? Encontraram-no em Jesus Cristo: no seu Evangelho, na Eucaristia e na comunidade da Igreja. Na Igreja descobre-se que a vida de cada homem é uma história de amor. Mostra-nos isto claramente a Sagrada Escritura, e no-lo confirma o testemunho dos santos. É exemplar a expressão de Santo Agostinho, que nas suas Confissões se dirige a Deus e diz: «Tarde te amei, beleza tão antiga e tão nova, tarde te amei! Eis que estavas dentro de mim, e eu fora… Estavas comigo, e eu não estava em ti… Chamaste-me, e venceste a minha surdez» (x, 27.38)” (Bento XVI, Regina Coeli, 29 de Abril de 2012).

Abrir

Resumo da Mensagem para o 55º Dia Mundial de Oração pelas Vocações

 Tema: «Escutar, discernir, viver a chamada do Senhor»

Também nestes nossos agitados tempos, o mistério da Encarnação lembra-nos que Deus não cessa jamais de vir ao nosso encontro: é Deus connosco, acompanha-nos ao longo das estradas por vezes poeirentas da nossa vida e, sabendo da nossa pungente nostalgia de amor e felicidade, chama-nos à alegria. Na diversidade e especificidade de cada vocação, pessoal e eclesial, trata-se de escutar, discernir e viver esta Palavra que nos chama do Alto e, ao mesmo tempo que nos permite pôr a render os nossos talentos, faz de nós também instrumentos de salvação no mundo e orienta-nos para a plenitude da felicidade.

Estes três aspetos – escuta, discernimento e vida – servem de moldura também ao início da missão de Jesus: passados os quarenta dias de oração e luta no deserto, visita a sua sinagoga de Nazaré e, aqui, põe-Se à escuta da Palavra, discerne o conteúdo da missão que o Pai Lhe confia e anuncia que veio realizá-la «hoje» (cf. Lc 4, 16-21).

Escutar

A chamada do Senhor – fique claro desde já – não possui a evidência própria de uma das muitas coisas que podemos ouvir, ver ou tocar na nossa experiência diária. Deus vem de forma silenciosa e discreta, sem Se impor à nossa liberdade. Assim pode acontecer que a sua voz fique sufocada pelas muitas inquietações e solicitações que ocupam a nossa mente e o nosso coração.

Por isso, é preciso preparar-se para uma escuta profunda da sua Palavra e da vida, prestar atenção aos próprios detalhes do nosso dia-a-dia, aprender a ler os acontecimentos com os olhos da fé e manter-se aberto às surpresas do Espírito.

Não poderemos descobrir a chamada especial e pessoal que Deus pensou para nós, se ficarmos fechados em nós mesmos, nos nossos hábitos e na apatia de quem desperdiça a sua vida no círculo restrito do próprio eu, perdendo a oportunidade de sonhar em grande e tornar-se protagonista daquela história única e original que Deus quer escrever connosco.

Também Jesus foi chamado e enviado; por isso, precisou de Se recolher no silêncio, escutou e leu a Palavra na Sinagoga e, com a luz e a força do Espírito Santo, desvendou em plenitude o seu significado relativamente à sua própria pessoa e à história do povo de Israel.

Hoje este comportamento vai-se tornando cada vez mais difícil, imersos como estamos numa sociedade rumorosa, na abundância frenética de estímulos e informações que enchem a nossa jornada… (a que se junta) … uma dispersão e confusão interior, que não nos permite parar, provar o gosto da contemplação, refletir com serenidade sobre os acontecimentos da nossa vida e realizar um profícuo discernimento, confiados no desígnio amoroso de Deus a nosso respeito.

Mas, como sabemos, o Reino de Deus vem sem fazer rumor nem chamar a atenção (cf. Lc 17, 21), e só é possível individuar os seus germes quando sabemos, como o profeta Elias, entrar nas profundezas do nosso espírito, deixando que este se abra ao sopro impercetível da brisa divina (cf. 1 Re 19, 11-13).

Discernir

Na sinagoga de Nazaré, ao ler a passagem do profeta Isaías, Jesus discerne o conteúdo da missão para a qual foi enviado e apresenta-o aos que esperavam o Messias: «O Espírito do Senhor está sobre Mim; porque Me ungiu para anunciar a Boa-Nova aos pobres; enviou-Me a proclamar a libertação aos cativos e, aos cegos, a recuperação da vista; a mandar em liberdade os oprimidos, a proclamar o ano favorável da parte do Senhor» (Lc 4, 18-19).

De igual modo, cada um de nós só pode descobrir a sua própria vocação através do discernimento espiritual, um «processo pelo qual a pessoa, em diálogo com o Senhor e na escuta da voz do Espírito, chega a fazer as opções fundamentais, a começar pela do seu estado da vida».

Em particular, descobrimos que a vocação cristã tem sempre uma dimensão profética. Como nos atesta a Escritura, os profetas são enviados ao povo, em situações de grande precariedade material e de crise espiritual e moral, para lhe comunicar em nome de Deus palavras de conversão, esperança e consolação. Como um vento que levanta o pó, o profeta perturba a falsa tranquilidade da consciência que esqueceu a Palavra do Senhor, discerne os acontecimentos à luz da promessa de Deus e ajuda o povo a vislumbrar, nas trevas da história, os sinais duma aurora.

Também hoje temos grande necessidade do discernimento e da profecia, de superar as tentações da ideologia e do fatalismo e de descobrir, no relacionamento com o Senhor, os lugares, instrumentos e situações através dos quais Ele nos chama. Todo o cristão deveria poder desenvolver a capacidade de «ler por dentro» a vida e individuar onde e para quê o está a chamar o Senhor a fim de ser continuador da sua missão.

Viver

Por último, Jesus anuncia a novidade da hora presente, que entusiasmará a muitos e endurecerá a outros: cumpriu-se o tempo, sendo Ele o Messias anunciado por Isaías, ungido para libertar os cativos, devolver a vista aos cegos e proclamar o amor misericordioso de Deus a toda a criatura. Precisamente «cumpriu-se hoje – afirma Jesus – esta passagem da Escritura que acabais de ouvir» (Lc 4, 20).

A alegria do Evangelho, que nos abre ao encontro com Deus e os irmãos, não pode esperar pelas nossas lentidões e preguiças; não nos toca, se ficarmos debruçados à janela, com a desculpa de continuar à espera dum tempo favorável; nem se cumpre para nós, se hoje mesmo não abraçarmos o risco duma escolha. A vocação é hoje! A missão cristã é para o momento presente! E cada um de nós é chamado – à vida laical no matrimónio, à vida sacerdotal no ministério ordenado, ou à vida de especial consagração – para se tornar testemunha do Senhor, aqui e agora.

Realmente este «hoje» proclamado por Jesus assegura-nos que Deus continua a «descer» para salvar esta nossa humanidade e fazer-nos participantes da sua missão. O Senhor continua ainda a chamar para viver com Ele e segui-Lo numa particular relação de proximidade ao seu serviço direto. E, se fizer intuir que nos chama a consagrar-nos totalmente ao seu Reino, não devemos ter medo. É belo – e uma graça grande – estar inteiramente e para sempre consagrados a Deus e ao serviço dos irmãos!

O Senhor continua hoje a chamar para O seguir. Não temos de esperar que sejamos perfeitos para dar como resposta o nosso generoso «eis-me aqui», nem assustar-nos com as nossas limitações e pecados, mas acolher a voz do Senhor com coração aberto. Escutá-la, discernir a nossa missão pessoal na Igreja e no mundo e, finalmente, vivê-la no «hoje» que Deus nos concede.

Franciscus

Abrir