«Gostaria de vos falar hoje de Santa Teresa de Lisieux. Teresa do Menino Jesus e da Sagrada Face, que viveu neste mundo só 24 anos, no final do século XIX, levando uma vida muito simples e no escondimento, mas que, depois da morte e da publicação dos seus escritos, se tornou uma das santas mais conhecidas e amadas.
A “pequena Teresa” nunca deixou de ajudar as almas mais simples, os pequeninos, os pobres e os sofredores que lhe rezam, mas iluminou também toda a Igreja com a sua profunda doutrina espiritual, a ponto que o Venerável [Santo] papa João Paulo II, em 1997, quis atribuir-lhe o título de Doutora da Igreja, além do de Padroeira das Missões, que já lhe tinha sido atribuído por Pio XI em 1927.
O meu amado predecessor definiu-a “perita da scientia amoris”. Esta ciência, que vê resplandecer no amor toda a verdade da fé, Teresa expressa-a principalmente na narração da sua vida, publicada um ano depois da sua morte com o título de “História de uma alma”. Trata-se de um livro que teve imediatamente um grande sucesso, foi traduzido em muitas línguas e difundido em todo o mundo. Gostaria de vos convidar a redescobrir este pequeno-grande tesouro, este comentário luminoso ao Evangelho plenamente vivido!
De facto, a “História de uma alma” é uma história maravilhosa de amor, narrada com tanta autenticidade, simplicidade e vigor, que o leitor não pode deixar de se admirar! Mas qual é este amor que encheu toda a vida de Teresa, desde a infância até à morte? Queridos amigos, este amor tem um rosto, tem um nome, é Jesus! A santa fala continuamente de Jesus. Repercorramos então as grandes etapas da sua vida, para entrar no coração da sua doutrina.
Teresa nasceu a 2 de janeiro de 1873 em Alençon, uma cidade da Normandia, na França. É a última filha de Luís e Zélia Martin, esposos e pais exemplares, beatificados juntamente a 19 de outubro de 2008. Tiveram nove filhos; quatro morreram em tenra idade. Permaneceram as cinco filhas, que se tornaram todas religiosas. Teresa, com 4 anos, ficou profundamente abalada com a morte da mãe. Então, o pai transferiu-se com as filhas para a cidade de Lisieux, onde se desenvolverá toda a vida da santa. Mais tarde Teresa, atingida por uma grave doença nervosa, sarou por graça divina, que ela própria define o “sorriso de Nossa Senhora”. Recebeu depois a Primeira Comunhão, intensamente vivida, e pôs Jesus Eucaristia no centro da sua existência.
A “Graça do Natal” de 1886 assinala a grande mudança, por ela chamada a sua “total conversão”. De facto, ficou totalmente curada da sua hipersensibilidade infantil e começou uma “corrida de gigante”. Aos 14 anos Teresa aproxima-se cada vez mais, com grande fé, de Jesus crucificado, e começa a ocupar-se de um criminoso, aparentemente desesperado, condenado à morte e impenitente. “Quis impedir-lhe de todas as formas de cair no inferno”, escreve a santa, com a certeza de que a sua oração o teria posto em contacto com o Sangue redentor de Jesus. É a sua primeira experiência fundamental de maternidade espiritual: “Eu tinha tanta confiança na misericórdia infinita de Jesus”, escreve. Com Maria Santíssima, a jovem Teresa ama, crê e espera com “um coração de mãe”.
Em novembro de 1887, Teresa vai em peregrinação a Roma juntamente com o pai e a irmã Celina. Para ela, o momento culminante é a audiência do Papa Leão XIII, ao qual pede a autorização para entrar, apenas com 15 anos, no Carmelo de Lisieux. Um ano depois, o seu desejo realiza-se: torna-se carmelita, “para salvar as almas e rezar pelos sacerdotes”.
Contemporaneamente, começa também a dolorosa e humilhante doença mental do seu pai. É um grande sofrimento que leva Teresa à contemplação da Face de Jesus na sua Paixão. Assim, o seu nome de religiosa – irmã Teresa do Menino Jesus e da Sagrada Face – expressa o programa de toda a sua vida, em comunhão com os mistérios centrais da encarnação e da redenção.
A sua profissão religiosa, na festa da Natividade de Maria, a 8 de setembro de 1890, é para ela um verdadeiro matrimónio espiritual na “pequenez” evangélica, caracterizada pelo símbolo da flor (…). No mesmo dia, a santa escreve uma oração que indica toda a orientação da sua vida: pede a Jesus o dom do seu amor infinito, para ser a mais pequena, e sobretudo pede a salvação de todos os homens: “Que nenhuma alma seja danada hoje”. De grande importância é a sua Oferta ao Amor Misericordioso, feita na festa da Santíssima Trindade de 1895: uma oferenda que Teresa partilha imediatamente com as suas irmãs de hábito, sendo já vice-mestra das noviças.
Dez anos depois da “Graça de Natal”, em 1896, vem a “Graça de Páscoa” que abre a última fase da vida de Teresa com o início da sua paixão em profunda união com a paixão de Jesus; trata-se da paixão do corpo, com a doença que a levará à morte através de grandes sofrimentos, mas sobretudo trata-se da paixão da alma, com uma dolorosíssima prova da fé. Com Maria ao lado da cruz de Jesus, Teresa vive então a fé mais heroica, como luz nas trevas que lhe invadem a alma.
A carmelita tem a consciência de viver esta grande prova para a salvação de todos os ateus do mundo moderno, por ela chamados “irmãos”. Vive então ainda mais intensamente o amor fraterno: para com as irmãs da sua comunidade, para com os seus dois irmãos espirituais missionários, para com os sacerdotes e todos os homens, sobretudo os mais distantes. Torna-se deveras uma “irmã universal”! A sua caridade amável e sorridente é a expressão da alegria profunda da qual nos revela o segredo: “Jesus, a minha alegria é amar-te”. Neste contexto de sofrimento, vivendo o maior amor nas mais pequenas coisas da vida quotidiana, a santa realiza a sua vocação de ser o amor no coração da Igreja.
Teresa faleceu na noite de 30 de setembro de 1897, pronunciando as simples palavras “Meu Deus, amo-te!”, olhando para o crucifixo que estreitava nas suas mãos. Estas últimas palavras da santa são a chave de toda a sua doutrina, da sua interpretação do Evangelho. O ato de amor, expresso no seu último suspiro, era como que o contínuo respiro da sua alma, como o pulsar do seu coração. As simples palavras “Jesus, amo-te” estão no centro de todos os seus escritos. (…)
Queridos amigos, também nós com Santa Teresa do Menino Jesus deveríamos poder repetir todos os dias ao Senhor que queremos viver de amor a Ele e aos outros, aprender na escola dos santos a amar de modo autêntico e total. Teresa é um dos “pequeninos” do Evangelho que se deixam conduzir por Deus às profundezas do seu mistério. Uma guia para todos, sobretudo para aqueles que, no Povo de Deus, desempenham o ministério de teólogos.
Com a humildade e a caridade, a fé e a esperança, Teresa entra continuamente no coração da Sagrada Escritura que encerra o mistério de Cristo. E esta leitura da Bíblia, alimentada pela ciência do amor, não se opõe à ciência académica. De facto, a ciência dos santos, da qual ela mesma fala na última página da “História de uma alma”, é a ciência mais nobre (…).
Inseparável do Evangelho, a Eucaristia é para Teresa o sacramento do amor divino que se abaixa ao extremo para se elevar até Ele. Na sua última “Carta”, sobre uma imagem que representa o Menino Jesus na Hóstia consagrada, a santa escreve estas palavras simples: “Não posso temer um Deus que para mim se fez tão pequenino! (…) Eu amo-o! De facto, Ele mais não é do que amor e misericórdia!”
No Evangelho, Teresa descobre sobretudo a misericórdia de Jesus (…). Assim se expressa também nas últimas linhas da “História de uma alma”: ‘Um só olhar ao Santo Evangelho, imediatamente respiro os perfumes da vida de Jesus e sei para onde correr… Não é para o primeiro lugar, mas para o último que me oriento… Sim, sinto-o, mesmo se tivesse na consciência todos os pecados que se podem cometer, iria, com o coração despedaçado pelo arrependimento, lançar-me entre os braços de Jesus, porque sei quanto ama o filho pródigo que volta a Ele’.
“Confiança e amor” são, portanto, o ponto final da narração da sua vida, duas palavras que como faróis iluminaram todo o seu caminho de santidade, para poder guiar os outros pela sua mesma “pequena via de confiança e de amor” da infância espiritual. Confiança como a do menino que se abandona nas mãos de Deus, inseparável do compromisso forte e radical do verdadeiro amor, que é dom total de si, para sempre, como diz a santa contemplando Maria: “Amar é dar tudo, e dar-se a si mesmo”.
Assim Teresa indica a todos nós que a vida cristã consiste em viver plenamente a graça do Batismo na doação total de si ao amor do Pai, para viver como Cristo, no fogo do Espírito Santo, o seu mesmo amor por todos os outros.»
Bento XVI