Eu sou o caminho, a verdade e a vida

«Eu sou (egô eimi) o caminho e a verdade e a vida», a que acrescenta: «Ninguém vem ao PAI senão por MIM» (João 14,6). Claro que Jesus não é um caminho de terra batida ou uma estrada de asfalto. É um caminho pessoal, uma maneira de viver, com entranhas, pés, mãos e coração. Não é uma verdade de tipo filosófico, jurídico ou político, a usual adequação da mente à coisa (adequatio rei et intellectus). Não é uma coisa. A verdade bíblica [hebraico ʼemet] não responde à pergunta: «O que é a verdade?», à boa maneira de Pilatos (cf. João 18,38), mas à pergunta inédita e surpreendente: «QUEM é a VERDADE?» De facto, ʼemet deriva de ʼem [= mãe] e de ʼaman [= firmar, confiar], e remete para CONFIANÇA e FIDELIDADE. Não é uma verdade que se saiba. É uma atitude que se vive. É aquela verdade que uma criança vai aprendendo ao colo da sua mãe. Está ali ALGUÉM que a segura e que a ama, ALGUÉM em quem a criança pode confiar, que em caso algum a vai deixar cair ao chão, como bem refere a filósofa, de origem judaica, Edith Stein, depois Santa Teresa Benedita da Cruz. A VERDADE é ALGUÉM de fiar como uma MÃE, realidade bem patente na etimologia, dado que ʼemet [= verdade] deriva de ʼem [= mãe]. Não engana, portanto. É assim que JESUS, o FILHO, é também a VIDA (zôê) toda recebida (do PAI), vida divina, vida filial do FILHO de Deus, vida toda a nós dada.

Passa hoje também, neste Domingo V da Páscoa, o Dia da Mãe, que nos ajuda, com certeza, a entender melhor o Deus de Jesus e o Jesus de Deus da liturgia de hoje. Sobre esta terra exangue, fustigada pelos mísseis e pela insensatez, uma Mãe verdadeira ainda é o ícone mais belo do amor imenso e sem pauta nem medida, que não é meu, nem é teu, nem é nosso, que é de Deus, que atravessa os textos da liturgia de hoje, e se vê a palpitar em tantas páginas indescritíveis destes tempos ácidos e nebulosos. Nós sabemos isso. Mas uma Mãe sabe isso melhor.

António Couto