29º Domingo do Tempo Comum – Ano A

Mc 12, 13-17

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus (Mt 22, 15-21)

Então, os fariseus reuniram-se para combinar como o haviam de surpreender nas suas próprias palavras. Enviaram-lhe os seus discípulos, acompanhados dos partidários de Herodes, a dizer-lhe: «Mestre, sabemos que és sincero e que ensinas o caminho de Deus segundo a verdade, sem te deixares influenciar por ninguém, pois não olhas à condição das pessoas. Diz-nos, portanto, o teu parecer: É lícito ou não pagar o imposto a César?»

Mas Jesus, conhecendo-lhes a malícia, retorquiu: «Porque me tentais, hipócritas? Mostrai-me a moeda do imposto.» Eles apresentaram-lhe um denário. Perguntou: «De quem é esta imagem e esta inscrição?» «De César» – responderam. Disse-lhes então: «Dai, pois, a César o que é de César e a Deus o que é de Deus.» Quando isto ouviram, ficaram maravilhados e, deixando-o, retiraram-se.

Chave de leitura

Jesus chega a Jerusalém vindo da Galileia para a festa anual da Páscoa. Quando entra na cidade é aclamado pelo povo (Mt 21, 1-11). Em seguida, entra no Templo de onde expulsa os vendedores (Mt 21, 12-16). Residindo em Jerusalém, contudo, passa as noites fora da cidade e retorna logo pela manhã (Mt 21, 17). A situação é muito tensa. Em Jerusalém, discutindo com as autoridades (chefes dos sacerdotes, anciãos e fariseus), Jesus expõe o seu pensamento através de parábolas (Mt 21, 23-22,14). Querem prendê-lo mas têm medo (Mt 21, 45-46). O Evangelho deste Domingo sobre o tributo a César (Mt 22, 15-21) está inserido neste conjunto de conflitos entre Jesus e as autoridades.

Comentário do texto

Mateus 22, 15-17: Uma pergunta feita pelos fariseus e herodianos. Os fariseus e herodianos eram líderes locais não apoiados pelo povo da Galileia. Tinham já desde há muito decidido matar Jesus (Mt 12, 14; Mc 3, 6). Agora, por ordem dos sacerdotes e anciãos, querem saber de Jesus se está a favor ou contra o pagamento do tributo a Roma. Pergunta cheia de malícia. Sob a aparência da fidelidade à lei de Deus, procuram motivos para o acusar. Se Jesus tivesse dito: “Deve-se pagar!”, podiam acusá-lo diante do povo de ser amigo dos romanos. Se respondesse: “Não se deve pagar!”, podiam também acusá-lo perante as autoridades romanas de ser um subversivo. Um beco sem saída!

Mateus 22, 18-21a: A resposta de Jesus. Jesus deu-se conta da hipocrisia. Na resposta que dá não perde tempo com discussões inúteis e vai directamente ao núcleo da questão: “De quem é esta imagem e esta inscrição?”. Eles respondem: “De César!”.

Mateus, 22, 21b: Conclusão de Jesus. Jesus leva-os à conclusão: “Dai, pois, a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”. Na verdade, eles reconheciam já a autoridade de César. Já estavam a dar a César o que era de César, porque usavam as suas moedas para comprar ou vender e até para pagar o tributo ao Templo. Por conseguinte, a pergunta não fazia sentido. Porquê perguntar por algo cuja resposta é já evidente na prática? Eles que pela pergunta fingiam ser servos de Deus, esqueciam o mais importante: esqueciam-se de dar a Deus o que é de Deus! A Jesus interessa que “dêem a Deus o que é de Deus”, ou seja, que recuperem o povo que pela culpa deles se tinha afastado de Deus. Com o seu ensino fechavam ao povo a entrada no Reino (Mt 23, 13). Outros dizem: “Dai a Deus o que é de Deus”, ou seja, praticai a justiça e a honestidade segundo as exigências da lei de Deus, porque por causa da vossa hipocrisia negais a Deus o que lhe é devido. Os discípulos devem dar-se conta disto! Era precisamente a hipocrisia dos fariseus e herodianos que cegava os seus olhos (Mc 8, 15).

Palavra para o caminho

A imagem da moeda pertence a César, mas os homens não devem esquecer que têm em si mesmos a imagem de Deus, e que portanto só a ele pertencem. Assim o afirmava a tradição bíblica. É então que podemos captar o pensamento de Jesus: “Dai a César o que é de César, mas não esqueçais que vós pertenceis a Deus”.

Para Jesus, César e Deus não são duas autoridades de grau semelhante que entre si devem repartir a submissão dos homens. Deus está acima de qualquer César, e este nunca pode exigir o que pertence a Deus.

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28º Domingo do Tempo Comum – Ano A

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Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus (Mt 22, 1-14)

Tendo Jesus recomeçado a falar em parábolas, disse-lhes: «O Reino do Céu é comparável a um rei que preparou um banquete nupcial para o seu filho. Mandou os servos chamar os convidados para as bodas, mas eles não quiseram comparecer. De novo mandou outros servos, ordenando-lhes: ‘Dizei aos convidados: O meu banquete está pronto; abateram-se os meus bois e as minhas reses gordas; tudo está preparado. Vinde às bodas.’ Mas eles, sem se importarem, foram um para o seu campo, outro para o seu negócio. Os restantes, apoderando-se dos servos, maltrataram-nos e mataram-nos. O rei ficou irado e enviou as suas tropas, que exterminaram aqueles assassinos e incendiaram a sua cidade. Disse, depois, aos servos: ‘O banquete das núpcias está pronto, mas os convidados não eram dignos. Ide, pois, às saídas dos caminhos e convidai para as bodas todos quantos encontrardes.’ Os servos, saindo pelos caminhos, reuniram todos aqueles que encontraram, maus e bons, e a sala do banquete encheu-se de convidados.

Quando o rei entrou para ver os convidados, viu um homem que não trazia o traje nupcial. E disse-lhe: ‘Amigo, como entraste aqui sem o traje nupcial?’ Mas ele emudeceu. O rei disse, então, aos servos: ‘Amarrai-lhe os pés e as mãos e lançai-o nas trevas exteriores; ali haverá choro e ranger de dentes.’ Porque muitos são os chamados, mas poucos os escolhidos.»

Mensagem

Segundo parece, a parábola do banquete foi muito popular entre as primeiras gerações cristãs e está também recolhida em Lucas e Mateus. Ela diz que Deus está a preparar uma festa final para os seus filhos, pois quer vê-los todos sentados junto dele, à volta da mesma mesa, desfrutando para sempre uma vida plena. Esta foi certamente uma das imagens mais queridas de Jesus para «sugerir» o final último da história humana. Não se contentava só com o dizê-lo com palavras. Sentava-se à mesa com todos, e comia até com pescadores e inconvenientes, pois queria que todos pudessem ver plasticamente algo do que Deus desejava levar a cabo. Por isso, Jesus entendeu a sua vida como um grande convite em nome de Deus. Não impunha nada, não pressionava ninguém. Anunciava a Boa Nova de Deus, despertava a confiança no Pai, removia medos, acendia a alegria e o desejo de Deus. A todos devia chegar o seu convite, sobretudo aos mais necessitados de esperança.

Jesus era realista. Sabia que o convite podia ser rejeitado. Na versão de Mateus, descrevem-se diversas reacções. Uns rejeitam-no de maneira consciente: «não quiseram comparecer». Outros respondem com indiferença: «sem se importarem, foram um para o seu campo, outro para o seu negócio». São mais importantes as suas terras e negócios. Houve quem reagisse de forma hostil para com os criados.

Na parábola de Mateus, quando os que têm terras e negócios rejeitam o convite, o rei diz aos seus criados: «O banquete das núpcias está pronto, mas os convidados não eram dignos. Ide, pois às saídas dos caminhos e convidai para as bodas todos quantos encontrardes». A ordem é inaudita, mas reflecte o que Jesus pensa. Apesar de tanta rejeição e desprezo, haverá festa. Deus não mudou. Tem que se continuar a convidar. Mas agora o melhor é ir «às saídas dos caminhos» por onde passam tantas gentes errantes, sem terras nem negócios, e a quem nunca ninguém convidou para uma festa. Eles podem entender, melhor do que ninguém, o convite. Eles podem recordar-nos a necessidade última que temos de Deus. Podem ensinar-nos a esperança.

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26º Domingo do Tempo Comum – Ano A

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Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus (Mt 21, 28-32)

«Que vos parece? Um homem tinha dois filhos. Dirigindo-se ao primeiro, disse-lhe: ‘Filho, vai hoje trabalhar na vinha.’ Mas ele respondeu: ‘Não quero.’ Mais tarde, porém, arrependeu-se e foi. Dirigindo-se ao segundo, falou-lhe do mesmo modo e ele respondeu: ‘Vou sim, senhor.’ Mas não foi. Qual dos dois fez a vontade ao pai?» Responderam eles: «O primeiro.»

Jesus disse-lhes: «Em verdade vos digo: Os cobradores de impostos e as meretrizes vão preceder-vos no Reino de Deus. João veio até vós, ensinando-vos o caminho da justiça, e não acreditastes nele; mas os cobradores de impostos e as meretrizes acreditaram nele. E vós, nem depois de verdes isto, vos arrependestes para acreditar nele.»

Chave de leitura

Mais uma parábola de Jesus, dita aos «chefes dos sacerdotes» e aos «anciãos» do povo, no seguimento de Mt 21,23. São eles, os bens colocados na religião e na vida pública, que são interpelados por Jesus: «Que vos parece?» (Mt 21,28); «Qual dos dois fez a vontade do Pai?» (Mt 21,28-46). No final de duas parábolas em que a temática é a «vinha» (Mt 21,28-46), são os «chefes dos sacerdotes» e os «fariseus» que reagem às interpelações de Jesus (Mt 21,45-46).

Os fariseus aparecem no Evangelho de Mateus como aqueles que «dizem, mas não fazem» (Mt 23,3). E «fazer», em oposição a dizer, é um tema fundamental neste Evangelho, assim expresso por Jesus no discurso programático da Montanha: «Nem todo aquele que diz: “Senhor, Senhor” entrará no Reino dos Céus, mas aquele que faz a vontade do Meu Pai que está nos Céus» (Mt 7,21).

Mais ainda: neste Evangelho de Mateus, o verdadeiro «fazer» traduz-se em «fazer fruto», como consequência da conversão ou mudança operada na nossa vida. Como é importante, a ideia é recorrente neste Evangelho: veja-se Mt 3,8; 7,16-20; 12,33; 13,8; 21,41.43; 25,40.45.

Mas também a «justiça»é um termo recorrente em Mateus. E «justiça», no Evangelho de Mateus, indica o desígnio divino de salvação e a nossa obediência a esse desígnio. Dada a sua importância, esta nota da «justiça» faz-se ouvir por sete vezes neste Evangelho: veja-se Mt 3,15; 5,610.20; 6,1.33; 21,32.

Posto isto, é agora mais fácil deixar entrar em nós a força da parábola de Jesus, contada a gente habituada apenas a dizer, dizer, dizer… O homem e pai da parábola é Deus. A vinha é d´Ele, mas é também nossa. Nunca se fala, no corpo desta parábola, da «minha» vinha. A vinha é, portanto, campo aberto de alegria e de liberdade, onde todos os filhos de Deus podem encontrar um espaço novo, porventura ainda inédito, de filialidade e fraternidade.

É dito que este Pai tem dois filhos, que são todos os Seus filhos, nas suas semelhanças e diferenças. Somos todos nós, nas nossas semelhanças e diferenças. Ao primeiro, o Pai diz: «Filho, vai hoje trabalhar na vinha» (Mt 21,28). Note-se o termo carinhoso «filho», o imperativo da liberdade «vai», que nos coloca na estrada de Abraão, o «hoje», que requer resposta pronta e inadiável, e a «vinha», símbolo da festa e da alegria. Note-se ainda a resposta tresloucada deste «filho»: «Não quero» (Mt 21,29b) e a emenda: «Mas, depois, arrependeu-se e foi» (Mt 21,29b). Note-se também a resposta do segundo filho, depois de ter ouvido o mesmo convite do seu Pai : «Eu vou, Senhor» (Mt 21,30a), e a constatação do narrador de que, de facto, não foi (Mt 21, 30b).

Como se vê, todos os filhos de Deus-Pai ouvem o mesmo convite e vêem a mesma atitude de carinho. Respondem que não ou que sim, e ambos mudam! O que disse que não, de facto, vai HOJE fazer a vontade do PAI; o que disse que sim, ficou apenas em palavras, apenas mudando o sim em não.

Os interpelados por Jesus (chefes dos sacerdotes e anciãos), os que só dizem, dizem, dizem, têm de reconhecer que não é o que se DIZ, mas o que se FAZ, o que verdadeiramente conta.

E ainda têm de reconhecer que João Baptista bem que os tinha chamado à conversão (mudança de vida e atitude) para fazerem frutos de justiça (Mt 3,8; 21,32) e obedecerem ao desígnio de Deus, mas nem por isso lhe deram qualquer atenção (Mt 21,32). Entenda-se: o que fez João Baptista é o que Jesus faz agora, e tão-pouco lhe prestam atenção, convertendo-se ou mudando de vida e de atitudes.

É aqui que são chamados a fazer contraponto os publicanos e as prostitutas. Estes ouviram João e ouvem agora Jesus, e estão a mudar a sua vida (Mt 21,31-32)! Note-se sempre que nem isto podemos desmentir, pois o Autor destas páginas deslumbrantes que estamos a folhear, Mateus, era um publicano. E agora é um Apóstolo e Evangelista. E nós?

Palavra para o caminho

Não reduzimos com frequência a nossa fé a palavras, ideias e sentimentos? Não esquecemos demasiado que a fé verdadeira dá um significado novo e uma orientação diferente de todo o comportamento da pessoa? Nós, os cristãos, não deveríamos esquecer que, de facto, acreditamos não o que dizemos com os lábios mas o que expressamos com a nossa vida inteira.

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25º Domingo do Tempo Comum – Ano A

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Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus (Mt 20, 1-16a)

Com efeito, o Reino do Céu é semelhante a um proprietário que saiu ao romper da manhã, a fim de contratar trabalhadores para a sua vinha. Ajustou com eles um denário por dia e enviou-os para a sua vinha. Saiu depois pelas nove horas, viu outros na praça, que estavam sem trabalho, e disse-lhes: ‘Ide também para a minha vinha e tereis o salário que for justo.’ E eles foram. Saiu de novo por volta do meio-dia e das três da tarde, e fez o mesmo. Saindo pelas cinco da tarde, encontrou ainda outros que ali estavam e disse-lhes: ‘Porque ficais aqui todo o dia sem trabalhar?’ Responderam-lhe: ‘É que ninguém nos contratou.’ Ele disse-lhes: ‘Ide também para a minha vinha.’

Ao entardecer, o dono da vinha disse ao capataz: ‘Chama os trabalhadores e paga-lhes o salário, começando pelos últimos até aos primeiros.’ Vieram os das cinco da tarde e receberam um denário cada um. Vieram, por seu turno, os primeiros e julgaram que iam receber mais, mas receberam, também eles, um denário cada um. Depois de o terem recebido, começaram a murmurar contra o proprietário, dizendo: ‘Estes últimos só trabalharam uma hora e deste-lhes a mesma paga que a nós, que suportámos o cansaço do dia e o seu calor.’ O proprietário respondeu a um deles: ‘Em nada te prejudico, meu amigo. Não foi um denário que nós ajustámos? Leva, então, o que te é devido e segue o teu caminho, pois eu quero dar a este último tanto como a ti. Ou não me será permitido dispor dos meus bens como eu entender? Será que tens inveja por eu ser bom?’ Assim, os últimos serão os primeiros e os primeiros serão os últimos.

Chave de leitura

No evangelho deste 25º Domingo do Tempo Comum (Mt 20,1-16a), Deus conta aos seus filhos mais uma história verdadeira. A praça está sempre cheia de gente à espera de uma oportunidade. O dono da vinha sai às 06h00 da manhã e contrata trabalhadores para cultivar a sua vinha. Pagar-lhe-á um denário, que é o salário normal de um dia de trabalho. Sai outra vez às 09h00 da manhã, e encontrando mais gente na praça, envia-os para a sua vinha, dizendo que lhes pagará o que for justo. Volta a sair ás 12h00, ás 15h00 e ás 17h00, encontra sempre gente desocupada e a todos vai enviando para a sua vinha.

Impõe-se que anotemos um primeiro indicador: o dono da vinha sai por cinco vezes à procura de nós. Encontra-nos a toda a hora, e a toda a hora nos envia para a sua vinha. É dele toda a iniciativa.

Às 18h00, o dono da vinha ordena ao seu capataz que pague o salário (um denário) aos trabalhadores, com uma estranha condição: a começar pelos últimos! O capataz pagou a todos um denário, o salário de um inteiro dia de trabalho. Também esta é uma bela iniciativa do dono da vinha. Até aqui tudo bem: todos os que aqui estamos, estamos todos depois e por causa da iniciativa de Deus!

Temos também, todavia, de prestar atenção ao que fazemos, quando somos nós a tomar a iniciativa. O texto não diz se trabalhámos, ou se fomos preguiçosos, durante o tempo, muito ou pouco, que estivemos na vinha. Mas diz que somos mesquinhos, invejosos e ciumentos, quando reparamos que o dono da vinha nos trata a todos por igual. O texto desvenda o nosso instinto de grandeza e superioridade, e a dificuldade que sentimos em aceitar-nos e abraçar-nos como irmãos.

O amor de Deus está lá, bem retratado, em todas as iniciativas do dono da vinha: sai a toda a hora à nossa procura. Quer-nos a todos por igual. Enche as nossas mãos com os seus dons. Mas nós ficamos tão mal na fotografia ou na radiografia, que mostra bem as invejas e ciúmes que minam o nosso coração e não nos deixam ser irmãos.

Aquela última hora é a hora da graça. É a nossa hora de filhos de Deus, Mas é também a hora em que podemos ser aceites ou rejeitados como irmãos. Em apenas uma hora se pode ganhar ou perder o dia inteiro!

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Festa da Exaltação da Santa Cruz – Ano A

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Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São João (Jo 3, 13-17)

Pois ninguém subiu ao Céu a não ser aquele que desceu do Céu, o Filho do Homem. Assim como Moisés ergueu a serpente no deserto, assim também é necessário que o Filho do Homem seja erguido ao alto, afim de que todo o que nele crê tenha a vida eterna. Tanto amou Deus o mundo, que lhe entregou o seu Filho Unigénito, a fim de que todo o que nele crê não se perca, mas tenha a vida eterna. De facto, Deus não enviou o seu Filho ao mundo para condenar o mundo, mas para que o mundo seja salvo por Ele.

Chave de leitura

O texto que a liturgia nos propõe para a Festa da Exaltação da Santa Cruz é tirado do Evangelho de São João. Não nos deve surpreender que a passagem escolhida faça parte do quarto Evangelho, porque é justamente este Evangelho o que apresenta o mistério da Cruz do Senhor como exaltação. E isto é claro desde o começo do Evangelho: “Assim como Moisés elevou a serpente no deserto, assim tem que ser elevado o Filho do Homem” (Jo 3, 14; Dn 7, 13). João explica-nos o mistério do Verbo Encarnado no movimento paradoxal da descida-subida (Jo 1, 14.18; 3, 13). Este é o mistério que dá a chave de leitura para compreender a identidade e a missão de Jesus Cristo. E isto não vale unicamente para o texto de João. Também a Carta aos Efésios, por exemplo, serve-se deste mesmo movimento paradoxal para explicar o mistério de Cristo: “Subiu. Que quer dizer senão que também baixou às regiões inferiores da terra?” (Ef 4, 9).

Jesus é o Filho de Deus que ao fazer-se Filho do Homem (Jo 3, 13) faz-nos conhecer os mistérios de Deus (Jo 1, 18). Pode fazê-lo visto que só ele viu o Pai (Jo 6, 46). Podemos dizer que o mistério do Verbo que desce do céu responde ao desejo dos profetas: “quem subirá ao céu para nos revelar este mistério?” (cf. Dn 30, 12; Prov 30, 4). O quarto Evangelho está cheio de referências ao mistério daquele que “desceu do céu” (1Cor 15, 47). Eis algumas citações: Jo 6, 33.38.51.62; 16, 28-30; 17, 5.

A exaltação de Jesus está justamente neste abaixamento até nós, até à morte, e morte de cruz, da qual será levantado como a serpente no deserto e “todo aquele que o olhe… não morrerá” (Num 21, 7-9; Zc 12, 10). Olhar Jesus exaltado é recordado por João na cena da morte: “Olharão para aquele que trespassaram (Jo 19, 37). No contexto do quarto Evangelho, dirigir o olhar significa “conhecer”, “compreender”, “ver”.

Frequentemente no Evangelho de João, Jesus refere-se ao facto de ser levantado: “Quando levantarem o Filho do Homem, então conhecerão que eu sou” (Jo 8, 28); “’quando for levantado da terra, atrairei todos a mim’. Jesus dava a entender deste modo de que morte ia morrer” (Jo 12, 32-33). Também nos Evangelhos sinópticos Jesus anuncia aos seus discípulos o mistério da sua condenação à morte (cf. Mt 20, 17-19; Mc 10, 32-34; Lc 18, 31-33). Com efeito, Cristo tinha que “sofrer tudo isto e entrar na glória” (Lc 24, 26).

Este mistério revela o grande amor que Deus nos tem. Ele é o Filho que nos foi dado, “para que quem acredite nele não pereça mas tenha a vida eterna”, este filho a quem nós rejeitamos e crucificamos. Precisamente nesta rejeição feita por nós, Deus manifestou-nos a sua fidelidade e o seu amor que não se detém perante a dureza do nosso coração. Ele realiza a salvação, apesar da nossa rejeição e desprezo (Act 4, 27-28), permanecendo sempre firme na realização do seu plano de misericórdia: “Porque Deus não enviou o seu Filho ao mundo para condenar o mundo, mas para que o mundo seja salvo por Ele”.

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19º Domingo do Tempo Comum – Ano A

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Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus (Mt 14, 22-33)

Depois, Jesus obrigou os discípulos a embarcar e a ir adiante para a outra margem, enquanto Ele despedia as multidões. Logo que as despediu, subiu a um monte para orar na solidão. E, chegada a noite, estava ali só. O barco encontrava-se já a várias centenas de metros da terra, açoitado pelas ondas, pois o vento era contrário. De madrugada, Jesus foi ter com eles, caminhando sobre o mar. Ao verem-no caminhar sobre o mar, os discípulos assustaram-se e disseram: «É um fantasma!» E gritaram com medo. No mesmo instante, Jesus falou-lhes, dizendo: «Tranquilizai-vos! Sou Eu! Não temais!» Pedro respondeu-lhe: «Se és Tu, Senhor, manda-me ir ter contigo sobre as águas.» «Vem» – disse-lhe Jesus. E Pedro, descendo do barco, caminhou sobre as águas para ir ter com Jesus. Mas, sentindo a violência do vento, teve medo e, começando a ir ao fundo, gritou: «Salva-me, Senhor!» Imediatamente Jesus estendeu-lhe a mão, segurou-o e disse-lhe: «Homem de pouca fé, porque duvidaste?» E, quando entraram no barco, o vento amainou. Os que se encontravam no barco prostraram-se diante de Jesus, dizendo: «Tu és, realmente, o Filho de Deus!»

Mensagem

No relato de Mateus proposto para o 19º do Tempo Comum, Ano A, (Mt 14, 22-33), os discípulos vão sozinhos na barca, sem Jesus. Mas surgem problemas, que os discípulos, sozinhos, não conseguem resolver. Esta importante cena serve para mostrar que, sem Jesus, os discípulos não conseguem ter sucesso. A barca serve para atravessar o mar encapelado, que são as perseguições, deste mundo. Mas apenas na companhia de Jesus. Ontem como hoje!

A referência ao caminhar de Jesus sobre as águas é claramente um indicador divino, pois Deus é Aquele “cuja estrada é no meio do mar, e o seu caminho sobre as muitas águas” (Sl 77, 20). Mas Mateus empresta a este episódio uma tonalidade própria, pois é o único a inserir o diálogo de Pedro com Jesus. Também Pedro caminha sobre as águas, a seu pedido, e seguindo a ordem de Jesus: “Vem!”. Entenda-se bem: Pedro caminha sobre as águas como Jesus, mas não com autoridade própria. O que Pedro faz assenta na Palavra de Jesus e na Fé que o liga a Jesus. Importante lição: Pedro faz o mesmo que faz Jesus enquanto permanecer vinculado a Jesus pela Fé. Esmorecendo a Fé em Jesus, Pedro torna-se presa fácil de outras forças e sucumbirá no meio da tempestade. Pedro como nós. Sentindo o perigo, Pedro grita: “Salva-me, Senhor!”. E sente logo a mão de Jesus que o segura. Nós como Pedro.

Pedro é, aqui, o porta-voz e o representante da comunidade dos discípulos que vai no barco (a Igreja). O episódio reflecte a fragilidade da fé dos discípulos, sempre que têm de enfrentar as forças da opressão, do egoísmo, da injustiça. Jesus comunicou aos seus o poder de vencerem todos os poderes deste mundo que se opõem à vida, à libertação, à realização, à felicidade dos homens. No entanto, enquanto enfrentam as ondas do mundo hostil e os ventos soprados pelas forças da morte, os discípulos debatem-se entre a confiança em Jesus e o medo. Mateus refere-se, desta forma, à experiência de muitos discípulos (da sua comunidade e das comunidades cristãs de todos os tempos e lugares) que seguem a Jesus de forma decidida, mas que se deixam abalar quando chegam as perseguições, os sofrimentos, as dificuldades. Então, começam a afundar-se e a ser submergidos pelo “mar” da morte, da frustração, do desânimo, da desilusão. No entanto, Jesus lá está para lhes estender a mão e para os sustentar.

Finalmente, a desconfiança dos discípulos transforma-se em fé firme: “Tu és verdadeiramente o Filho de Deus” (vers. 33). É para aqui que converge todo o relato. Esta confissão reflecte a fé dos verdadeiros discípulos, que vêem em Jesus o Deus que vence o “mar”, o Senhor da vida e da história que acompanha a caminhada dos seus, que lhes dá a força para vencer as forças da opressão e da morte, que lhes estende a mão quando eles estão desanimados e com medo e que não os deixa afundar.

Palavra para o caminho

Se somos sinceros, devemos confessar que há uma distância enorme entre o crente que professamos ser e o crente que somos na realidade. Que fazer ao constarmos em nós uma fé, às vezes, tão frágil e vacilante?

Primeiro, não desesperar nem assustar-se ao descobrir em nós dúvidas e hesitações. A busca de Deus vive-se quase sempre na insegurança, na obscuridade e no risco. É “tacteando” que se procura Deus. Não devemos esquecer que muitas vezes “a fé genuína só pode aparecer como dúvida superada” (Ladislao Boros).

O importante é aceitar o mistério de Deus com o coração aberto. A nossa fé depende da verdade da relação com ele. E não é necessário esperar que as nossas interrogações e dúvidas se resolvam para viver, verdadeiramente, diante desse Pai.

Por isso, o importante é saber clamar como Pedro: “Senhor, salva-me”. Saber levantar para Deus as nossas mãos vazias, não só como gesto de súplica, mas também como entrega confiante de alguém que se sabe pequeno, ignorante e necessitado de salvação. Não esqueçamos que a fé é “caminhar sobre as águas”, mas com a possibilidade de encontrar sempre essa mão que nos salva quando nos começamos a afundar.

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18º Domingo do Tempo Comum – Ano A

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Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus (Mt 14, 13-21)

Tendo ouvido isto, Jesus retirou-se dali sozinho num barco, para um lugar deserto; mas o povo, quando soube, seguiu-o a pé, desde as cidades. Ao desembarcar, Jesus viu uma grande multidão e, cheio de misericórdia para com ela, curou os seus enfermos. Ao entardecer, os discípulos aproximaram-se dele e disseram-lhe: «Este sítio é deserto e a hora já vai avançada. Manda embora a multidão, para que possa ir às aldeias comprar alimento.» Mas Jesus disse-lhes: «Não é preciso que eles vão; dai-lhes vós mesmos de comer.» Responderam: «Não temos aqui senão cinco pães e dois peixes.» «Trazei-mos cá» – disse Ele. E, depois de ordenar à multidão que se sentasse na relva, tomou os cinco pães e os dois peixes, ergueu os olhos ao céu e pronunciou a bênção; partiu, depois, os pães e deu-os aos discípulos, e estes distribuíram-nos pela multidão. Todos comeram e ficaram saciados; e, com o que sobejou, encheram doze cestos. Ora, os que comeram eram uns cinco mil homens, sem contar mulheres e crianças.

Mensagem

O Evangelho deste 18º Domingo do Tempo Comum (Mt 14, 13-21) é conhecido como a primeira «multiplicação dos pães», realizada, neste caso, em mundo judaico. Mas vê-se bem que o título de «multiplicação» é inadequado, pois o que está aqui em causa não é, na verdade, uma multiplicação, mas uma divisão ou condivisão.

Neste episódio, salta à vista o comportamento compassivo, acolhedor, inclusivo e de partilha de Jesus em confronto com o comportamento insensível, não acolhedor, exclusivista, frio, mercantilista, consumista, egoísta, e egocêntrico destes discípulos de Jesus, que propõem a Jesus que mande as pessoas embora, para que cada um, compre de comer para si mesmo (Mt 14,15).

Vistas bem as coisas, o comportamento destes discípulos, e se calhar o nosso também, opõe-se ponto por ponto, ao comportamento de Jesus: A celebração da Eucaristia, com Jesus sempre no meio de nós, reclama que mudemos tantas maneiras de fazer!

De notar que, aos olhos atónitos dos discípulos e aos nossos, Jesus não fez uma operação de «multiplicação» dos pães, mas de «divisão» e «condivisão», «partilha» dos pães! O milagre de Jesus – aquilo que suscita surpresa e maravilha – não consiste em aumentar a quantidade do pão (que permanece a mesma), mas em abrir os olhos aos Seus discípulos e a nós que, como cegos, só conhecemos e pensamos na lógica do vender e do comprar e não chegamos a saborear a lógica da gratuitidade, que é a do nosso Pai celeste que faz nascer o sol para os bons e para os maus. Entrar nesta lógica é acreditar na força do dom e ir por este mundo consumista, partindo o pão e dividindo-o com a clara consciência de que onde isto acontecer, não só se instaura o necessário para todos («todos comeram e foram saciados»), mas instaura-se igualmente o “excesso”, a superabundância da graça («os discípulos encheram doze cestos).

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17º Domingo do Tempo Comum – Ano A

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Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus (Mt 13, 44-52)

Naquele tempo, disse Jesus às multidões: «O Reino do Céu é semelhante a um tesouro escondido num campo, que um homem encontra. Volta a escondê-lo e, cheio de alegria, vai, vende tudo o que possui e compra o campo. O Reino do Céu é também semelhante a um negociante que busca boas pérolas. Tendo encontrado uma pérola de grande valor, vende tudo quanto possui e compra a pérola.» «O Reino do Céu é ainda semelhante a uma rede que, lançada ao mar, apanha toda a espécie de peixes. Logo que ela se enche, os pescadores puxam-na para a praia, sentam-se e escolhem os bons para as canastras, e os ruins, deitam-nos fora. Assim será no fim do mundo: sairão os anjos e separarão os maus do meio dos justos, para os lançarem na fornalha ardente: ali haverá choro e ranger de dentes.»

«Compreendestes tudo isto?» «Sim» – responderam eles. Jesus disse-lhes, então: «Por isso, todo o doutor da Lei instruído acerca do Reino do Céu é semelhante a um pai de família, que tira coisas novas e velhas do seu tesouro.»

Mensagem

A primeira parábola do Evangelho de hoje fala de um homem que por mero acaso, descobre no campo onde trabalhava um tesouro; volta a escondê-lo, vai vender tudo o que tem e compra o campo. O tesouro de que Jesus fala é o Reino dos Céus, a condição nova em que entra quem acolhe a proposta das bem-aventuranças. Tem um valor incalculável, e vai sendo progressivamente descoberto somente por quem decide apostar nele a própria vida.

O facto que este tesouro seja encontrado por acaso indica a sua gratuitidade: Deus oferece-o aos homens sem nenhum mérito da parte deles: não é um prémio pelas suas boas obras. Mas há um comportamento que é preciso assumir perante este dom. Quem o descobre não pode ter hesitações, perplexidades, dúvidas. A decisão tem que ser tomada com urgência, a escolha é inadiável. Não se pode faltar ao encontro marcado com o Senhor. E depois é preciso apostar tudo. Não é pedido que se renuncie a alguma coisa, mas que se concentrem os pensamentos, as atenções, os interesses, todos os esforços no novo objectivo. O tesouro – como irá acontecer também com a pérola – não é adquirido para ser depois vendido outra vez e assim permitir que se volte a possuir os bens antigos; é adquirido em substituição de tudo aquilo que, até àquele momento, tinha dado sentido à vida. A descoberta do Reino de Deus comporta uma mudança radical. É este o significado da decisão de «vender tudo quanto se possui para comprar o campo».

Uma tal mudança provoca surpresa, admiração, perplexidade. Quem não descobriu o mesmo tesouro não se consegue capacitar, não encontra uma explicação que justifique a novidade de vida para quem entrou no Reino de Deus. Quem viu o camponês vender tudo para comprar o campo deve ter pensado que tinha enlouquecido: a terra árida e pedregosa da Palestina não justificava tais sacrifícios. Só ele estava consciente da sua escolha: aquele era o negócio da sua vida.

Mas havia um sinal, pelo qual todos deveriam ter percebido que agia com lucidez e sabendo o que fazia: a alegria. Quem percebeu ter nas mãos um tesouro inesperado não pode deixar de se encher de alegria.

Na segunda parábola o protagonista não é um pobre trabalhador rural, mas um rico negociante que anda pelo mundo com um objectivo bem determinado: encontrar pérolas. Na Antiguidade, as pérolas eram tão preciosas como são hoje os diamantes. Sendo consideradas de grande valor, Jesus escolheu-as como imagem do tesouro inestimável que Ele oferecia: o Reino de Deus. Ao contrário de um camponês que embate por acaso num tesouro, o negociante encontra a pérola após uma pesquisa extenuante. Num caso, a descoberta é fruto da sorte; no outro, do empenho. O comportamento do negociante é a imagem da pessoa que procura apaixonadamente aquilo que pode dar sentido à vida e encher de alegria os seus dias. As duas parábolas completam-se: por um lado, o Reino de Deus é um dom gratuito do próprio Deus; por outro, é também fruto do empenho da pessoa.

A terceira parábola retoma o tema da parábola do trigo e do joio, tratado no domingo passado. A imagem é tomada da pesca no lago de Tiberíades, onde eram utilizadas grandes redes de arrasto, que capturavam peixes bons mas também peixes não comestíveis ou impuros (Lv 11, 10-11). Na praia, os pescadores procediam á separação. Assim – diz Jesus – acontece no Reino dos Céus.

Segundo a concepção dos antigos, o mar era o reino das forças diabólicas, inimigas da vida. Era confiada aos discípulos a missão de «pescar homens», subtraindo-os ao poder do mal. Paixões irreprimíveis, egoísmo, inveja são como ondas impetuosas que, como um turbilhão, os arrastam para o abismo. O Reino dos Céus é uma rede que os tira para fora, os deixa respirar, os traz para a luz, para a salvação. Nesta rede não são acolhidos apenas os bons, mas toda a gente, sem distinção. O Reino de Deus não se apresenta, hoje, em estado puro; na comunidade cristã deve ser admitida serenamente, ao lado do bem, também a presença do mal e do pecado. Ninguém, mesmo sendo impuro, se deve sentir excluído ou deve ser marginalizado. Este é o tempo da misericórdia e da paciência de Deus, que «não quer que ninguém pereça, mas que todos se convertam» (2Pd 3,9). Chegará, certamente, o momento da separação.

O discurso de Jesus termina com a pergunta: «Entendeste tudo isto?» e com a evocação da obra do escriba. A pergunta é dirigida aos discípulos, àqueles que encontraram o tesouro e a pedra preciosa. O Reino dos Céus que agora possuem foi preparado através do Antigo Testamento (as coisas velhas) e realizado em Cristo (as coisas novas). Os cristãos são convidados a tomar consciência, pelo estudo das Sagradas Escrituras, do dom imenso que receberam de Deus.

Palavra para o caminho

As duas pequeninas parábolas, a do tesouro escondido no campo e a da pérola preciosíssima, constituem dois fortíssimos acenos a deixar tudo por amor, para, por um amor maior, seguir Jesus, que é o Reino de Deus em Pessoa. É Ele o tesouro escondido, é Ele a pérola preciosíssima. Para o seguir, é mesmo necessário deixar tudo (Lc 14, 33).

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16º Domingo do Tempo Comum – Ano A

Green wheat under a blue sky

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus (Mt 13, 24-43)

Jesus propôs-lhes outra parábola: «O Reino do Céu é comparável a um homem que semeou boa semente no seu campo. Ora, enquanto os seus homens dormiam, veio o inimigo, semeou joio no meio do trigo e afastou-se. Quando a haste cresceu e deu fruto, apareceu também o joio. Os servos do dono da casa foram ter com ele e disseram-lhe: ‘Senhor, não semeaste boa semente no teu campo? Donde vem, pois, o joio?’ ‘Foi algum inimigo meu que fez isto’ – respondeu ele. Disseram-lhe os servos: ‘Queres que vamos arrancá-lo?’ Ele respondeu: ‘Não, para que não suceda que, ao apanhardes o joio, arranqueis o trigo ao mesmo tempo. Deixai um e outro crescer juntos, até à ceifa; e, na altura da ceifa, direi aos ceifeiros: Apanhai primeiro o joio e atai-o em feixes para ser queimado; e recolhei o trigo no meu celeiro.’»

Jesus propôs-lhes outra parábola: «O Reino do Céu é semelhante a um grão de mostarda que um homem tomou e semeou no seu campo. É a mais pequena de todas as sementes; mas, depois de crescer, torna-se a maior planta do horto e transforma-se numa árvore, a ponto de virem as aves do céu abrigar-se nos seus ramos.»

Jesus disse-lhes outra parábola: «O Reino do Céu é semelhante ao fermento que uma mulher toma e mistura em três medidas de farinha, até que tudo fique fermentado.»

Tudo isto disse Jesus, em parábolas, à multidão, e nada lhes dizia sem ser em parábolas. Deste modo cumpria-se o que fora anunciado pelo profeta: «Abrirei a minha boca em parábolas e proclamarei coisas ocultas desde a criação do mundo.»

Afastando-se, então, das multidões, Jesus foi para casa. E os seus discípulos, aproximando-se dele, disseram-lhe: «Explica-nos a parábola do joio no campo.» Ele, respondendo, disse-lhes: «Aquele que semeia a boa semente é o Filho do Homem; o campo é o mundo; a boa semente são os filhos do Reino; o joio são os filhos do maligno; o inimigo que a semeou é o diabo; a ceifa é o fim do mundo e os ceifeiros são os anjos. Assim, pois, como o joio é colhido e queimado no fogo, assim será no fim do mundo: o Filho do Homem enviará os seus anjos, que hão-de tirar do seu Reino todos os escandalosos e todos quantos praticam a iniquidade, e lançá-los na fornalha ardente; ali haverá choro e ranger de dentes. Então os justos resplandecerão como o Sol, no Reino de seu Pai. Aquele que tem ouvidos, oiça!»

Mensagem

O Evangelho deste Domingo fala-nos da parábola do joio e do trigo. Tanto na sociedade como na comunidade e na vida de todos nós, existe tudo misturado: qualidades boas e incoerências, limites e falhas. As nossas comunidades são constituídas por pessoas cada uma com a sua história, com a sua vivência, a sua opinião, os seus anseios, as suas diferenças. Existem pessoas que não sabem conviver com as diferenças. Querem ser juízes dos outros. Acham que só elas estão certas, e os outros errados. A parábola do joio e do trigo ajuda a não cair na tentação de querer excluir da comunidade os que não pensam como nós. Os empregados que aparecem na parábola representam certos membros da comunidade. O dono da terra representa Deus.

Mateus 13,24-26: A situação: joio e trigo crescem juntos. A palavra de Deus que faz nascer a comunidade é semente boa, mas nas comunidades sempre aparecem coisas que são contrárias à Palavra de Deus. De onde vêm? Essa era a discussão.

Mateus 13,27-28a: A causa da mistura que existe na vida. Um inimigo fez isso. Quem é este inimigo? O inimigo, o adversário, Satanás ou diabo (Mt 13,39), é aquele que divide, que desvia. A tendência de divisão existe dentro de cada um de nós. O desejo de dominar, de se aproveitar da comunidade para subir e tantos outros desejos interesseiros são divisionistas, são do inimigo que dorme dentro de cada um de nós.

Mateus 13,28b-30: A reacção diferente diante da ambiguidade. Diante dessa mistura do bem e do mal, alguns queriam arrancar o joio. Pensavam: “Se deixarmos todo o mundo na comunidade, perdemos a nossa razão de ser! Perdemos a identidade!” Queriam expulsar os que pensavam de modo diferente. Mas esta não é a decisão do Dono da terra. Ele diz: “Deixai-os crescer juntos até à colheita!” O que vai decidir não é o que cada um fala e diz, e sim o que cada um vive e faz. É pelo fruto produzido que Deus nos julgará. A força e o dinamismo do Reino manifestam-se na comunidade. Mesmo sendo pequena e cheia de contradições, ela é um sinal do Reino. Mas ela não é dona do Reino, nem pode considerar-se justa. A parábola do joio e do trigo explica a maneira como a força do Reino age na história. É preciso ter paciência e aprender a conviver com as contradições e as diferenças, mesmo tendo uma opção clara pela justiça do Reino.

O Evangelho deste domingo propõe-nos ainda duas outras parábolas: a parábola do grão de mostarda (vers. 31-32) e a parábola do fermento (vers. 33). São duas parábolas muito semelhantes, quer quanto ao conteúdo, quer quanto à forma. Numa e noutra, o quadro é o mesmo: sublinha-se a desproporção entre o início e o resultado final. O grão de mostarda é uma semente muito pequena, que no entanto pode dar origem a um arbusto de razoáveis dimensões; o fermento apresenta um aspecto perfeitamente insignificante, mas tem a capacidade de fermentar uma grande quantidade de massa. Estas duas comparações servem para apresentar o dinamismo do Reino. O Reino anunciado por Jesus compara-se ao grão de mostarda e ao fermento: parece algo insignificante, que tem inícios muito modestos e humildes, mas contém potencialidades para encher o mundo, para o transformar e renovar. Trata-se de um dinamismo de vida nova que começa como uma pequena semente lançada à terra numa província obscura e insignificante do império romano, mas que vai lançar as suas raízes, invadir história dos homens e potenciar o aparecimento de um mundo novo.

Com estas parábolas, Jesus responde às objecções daqueles que não acreditavam que da mensagem de um carpinteiro de Nazaré, pudesse surgir uma proposta de vida, capaz de fermentar o mundo e a história. Ele garante-nos que o Reino é uma realidade irreversível, que veio para ficar e para transformar o mundo. Escutar estas parábolas é receber uma injecção de ânimo e de esperança, capaz de levar a um compromisso mais sério e mais exigente com o “Reino”.

O ensino em parábolas. A parábola é um instrumento pedagógico que usa o quotidiano para mostrar como a vida nos fala de Deus. Torna a realidade transparente e faz com que as pessoas tenham um olhar contemplativo. Uma parábola aponta para as coisas da vida e, por isso mesmo, é um ensinamento aberto, pois das coisas da vida todo o mundo tem alguma experiência. O ensinamento por parábolas faz a pessoa partir da experiência que tem: semente, sal, luz, ovelha, flor, passarinho, mulher, criança, pai, rede, peixe, etc. Assim, ele torna a vida quotidiana transparente, reveladora da presença e da acção de Deus. Jesus não costumava explicar as parábolas. Geralmente, terminava com esta frase: “Quem tem ouvidos ouça!” (Mt 11,15; 13,9.43). Ou seja: “É isso! Vocês ouviram! Agora tratem de entender!” Jesus deixava o sentido da parábola em aberto e não o determinava. Sinal de que acreditava na capacidade do povo de descobrir o sentido da parábola, baseado na sua experiência de vida. De vez em quando, a pedido dos discípulos, ele explicava o sentido.

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14º Domingo do Tempo Comum – Ano A

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Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus (Mt 11, 25-30)

Naquela ocasião, Jesus tomou a palavra e disse: «Bendigo-te, ó Pai, Senhor do Céu e da Terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e aos entendidos e as revelaste aos pequeninos. Sim, ó Pai, porque isso foi do teu agrado. Tudo me foi entregue por meu Pai; e ninguém conhece o Filho senão o Pai, como ninguém conhece o Pai senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar.» «Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, que Eu hei-de aliviar-vos. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração e encontrareis descanso para o vosso espírito. Pois o meu jugo é suave e o meu fardo é leve.»

Comentário às palavras de Jesus

Mateus 11, 25-26: Só os pequenos podem entender e aceitar a Boa Nova do Reino. Perante o acolhimento da mensagem do Reino por parte dos pequenos, Jesus tem uma grande alegria e espontâneamente transforma a sua alegria em oração ao Pai: “Bendigo-te, ó Pai, Senhor do Céu e da Terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e aos entendidos e as revelaste aos pequeninos. Sim, ó Pai, porque isso foi do teu agrado”. Os sábios, os doutores daquele tempo, criaram uma série de leis à volta da pureza legal, que depois as impunham ao povo em nome de Deus (Mt 15, 1-9). Eles pensavam que Deus exigia todas estas observâncias para que o povo pudesse ter paz. Mas a lei do amor, revelada por Jesus, afirmava o contrário. De facto, o que conta, não é o que fazemos por Deus, mas antes, o que Deus, na sua grande misericórdia, faz por nós! Os pequenos ouviam esta boa notícia e alegravam-se. Os sábios e doutores não conseguiam entender tal ensinamento. Hoje, como naquele tempo, Jesus continua a ensinar muitas coisas aos pobres e aos pequenos. Os sábios e inteligentes farão bem em converterem-se em discípulos dos pequenos.

Jesus rezava muito! Orava com os discípulos, orava com o povo, orava sozinho. Passava noites inteiras em oração. Chegou a resumir toda a sua mensagem numa oração de sete pedidos, que é o Pai Nosso. Às vezes, como neste caso, os Evangelhos informam-nos acerca da oração de Jesus (Mt 11, 25-26; 26, 39; Jo 11, 41-42; 17, 1-26). Outra vezes dão-nos a conhecer que Jesus rezava os Salmos (Mt 26, 30; 27, 46). Na maior parte dos casos dizem simplesmente que Jesus rezava. Hoje por todas as partes os grupos de oração multiplicam-se.

No Evangelho de Mateus o termo pequenos às vezes indica as crianças e outras sectores excluídos da sociedade. Não é fácil fazer a distinção. Às vezes o que é chamado pequeno num Evangelho, é chamada criança noutro. Além disso, nem sempre é fácil fazer a distinção entre o que pertence à época de Jesus e o que é do tempo das comunidades para quem foram escritos os Evangelhos. Seja como for, o que é claro é o contexto de exclusão que reinava naquela época, e a imagem de pessoa acolhedora que os pequenos das comunidades cristãs primitivas tinham de Jesus.

Mateus 11, 27: A origem da nova lei: o Filho conhece o Pai. Jesus sendo o Filho, conhece o Pai e sabe o que o Pai queria, quando no passado, chamou Abraão e Sara para formar um povo e quando deu a Lei a Moisés para reforçar a aliança. A experiência de Deus como Pai ajudava Jesus a entender de uma maneira nova o que Deus dissera no passado. Ajudava-o a reconhecer erros e limites, dentro dos quais a Boa Nova de Deus ficara prisioneira da ideologia dominante A intimidade com o Pai dava-lhe um critério novo que o colocava em contacto directo com o autor da Bíblia. Jesus não ia da letra para a raiz mas da raiz para a letra. Ele procurava o sentido na fonte. Para compreender o sentido de uma carta é importante estudar as palavras que ela contém. Mas a amizade com o autor da carta pode ajudar a descobrir uma dimensão mais profunda nessas palavras, que só o estudo não pode revelar.

Mateus 11, 28-30: Jesus convida todos os que estão cansados e promete-lhes o descanso. O povo daquele tempo vivia cansado sob o duplo peso dos impostos e das observâncias exigidas pelas leis da pureza. Jesus diz: “Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração e encontrareis descanso para o vosso espírito. Pois o meu jugo é suave e o meu fardo é leve”. Através do profeta Jeremias Deus convidou o povo a investigar o passado para conhecer qual o caminho bom que poderia dar descanso às almas (Jer 6, 16). Este caminho bom aparece agora em Cristo. Jesus oferece descanso às almas. Ele é o caminho (Jo 14, 6).

Aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração”. Como Moisés, Jesus era manso e humilde (Num 12, 3). Muitas vezes esta frase foi manipulada para pedir ao povo submissão, mansidão e passividade. O que Jesus quer dizer é totalmente o contrário. Ele pede ao povo, para poder entender as coisas do Reino, que não dê tanta importância “aos sábios e doutores”, isto é, aos professores oficiais da religião do tempo, e que confie mais nos pequenos. Os oprimidos devem começar a aprender de Jesus o que é ser “manso e humilde de coração”.

Muitas vezes na Bíblia humilde é sinónimo de humilhado. Jesus não fazia como os escribas que se envaideciam da sua ciência, mas era como o povo humilde e humilhado. Ele, o Mestre, sabia por experiência o que se passava no coração do povo e quanto o povo sofria na vida de cada dia.

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