Rumo à solenidade de todos os santos – 2

Na grande assembleia dos santos, Deus quis reservar o primeiro lugar à Mãe de Jesus

Assim, a solenidade hodierna ajuda-nos a considerar uma verdade fundamental da fé cristã, que nós professamos no «Credo»: a comunhão dos santos. Que significa isto: a comunhão dos santos? É a comunhão que nasce da fé e une todos aqueles que pertencem a Cristo em virtude do Baptismo. Trata-se de uma união espiritual — todos estamos unidos! — que não é interrompida pela morte, mas continua na outra vida. Com efeito, subsiste um vínculo indestrutível entre nós, vivos, neste mundo e aqueles que já ultrapassaram o limiar da morte. Nós, aqui na terra, juntamente com quantos já entraram na eternidade, formamos uma única e grande família. Conserva-se esta familiaridade!

Esta comunhão maravilhosa, esta admirável união comum entre terra e céu verifica-se do modo mais excelso e intenso na Liturgia, e sobretudo na celebração da Eucaristia, que exprime e realiza a união mais profunda entre os membros da Igreja. Efectivamente, na Eucaristia nós encontramos Jesus vivo e a sua força, e através dele entramos em comunhão com os nossos irmãos na fé: quantos vivem ao nosso lado aqui na terra e aqueles que já nos precederam na outra vida, na vida que não conhece ocaso. Esta realidade enche-nos de alegria: é bom ter tantos irmãos na fé, que caminham ao nosso lado, que nos apoiam com a sua ajuda e, juntamente connosco, percorrem o mesmo caminho rumo ao Céu. E é consolador saber que existem outros irmãos que já alcançaram o Céu, que nos esperam e intercedem por nós a fim de que, juntos, possamos contemplar eternamente a Face gloriosa e misericordiosa do Pai.

Na grande assembleia dos santos, Deus quis reservar o primeiro lugar à Mãe de Jesus. Maria está no âmago da comunhão dos santos, como guardiã singular do liame da Igreja universal com Cristo, do vínculo da família. Ela é a Mãe, é a nossa Mãe, a nossa Mãe! Para quantos desejam seguir Jesus no caminho do Evangelho, Ela é a guia segura, porque é a primeira discípula. Ela é a Mãe cheia de desvelos, à qual confiar todas as aspirações e dificuldades.

Papa Francisco, Resumo do Angelus de 1 de Novembro de 2014

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Rumo à solenidade de todos os santos – 1

Os santos ao longo do caminho nunca perdem de vista o caminho de Jesus

A solenidade de Todos os Santos é a “nossa” festa: não porque somos bons, mas porque a santidade de Deus tocou a nossa vida. Os santos não são pequenos modelos perfeitos, mas pessoas atravessadas por Deus. Podemos compará-los com os vitrais das igrejas, que fazem entrar a luz em várias tonalidades de cor. Os santos são nossos irmãos e irmãs que receberam a luz de Deus no seu coração e a transmitiram ao mundo, cada qual segundo a sua “tonalidade”. Mas todos foram transparentes, lutaram para tirar as manchas e as obscuridades do pecado, de modo a fazer passar a luz gentil de Deus. Eis a finalidade da vida: fazer passar a luz de Deus; e também o objectivo da nossa vida.

Quem está com Jesus é bem-aventurado, feliz. A verdadeira felicidade não consiste em possuir algo, nem em tornar-se alguém; a felicidade autêntica consiste em estar com o Senhor e viver por amor. Então, os ingredientes para a vida feliz chama-se bem-aventuranças: são bem-aventurados os simples, os humildes que deixam espaço a Deus, que sabem chorar pelo próximo e pelos próprios erros, permanecem mansos, lutam pela justiça, são misericordiosos para com todos, preservam a pureza do coração, trabalham sempre pela paz e vivem na alegria, não odeiam e até quando sofrem respondem ao mal com o bem.

Eis as bem-aventuranças. Não exigem gestos sensacionais, não são para super-homens, mas para quem vive as provações e as dificuldades de todos os dias, para nós. Assim são os santos: respiram como todos o ar poluído do mal que há no mundo, mas ao longo do caminho nunca perdem de vista o caminho de Jesus, indicado nas bem-aventuranças, que são como o mapa da vida cristã.

Papa Francisco, Resumo do Angelus de 1 de Novembro de 2017

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Quanto mais…

“Sair de si” é a pérola preciosa das nossas vidas. E aquele que nunca saiu da concha ainda nem sequer viveu. Quanto mais dou, mais recebo. Quanto mais procuro entender, mais me compreendo a mim próprio. Quanto mais ajudo, mais sou ajudado. E quanto mais me perder em benefício dos outros, mais me encontro.

Vasco P. Magalhães, sj

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“Muitos repreendiam-no para que se calasse” (Mc 10, 48)

Em vez disso, muitos dos que estavam com Jesus repreendiam Bartimeu para que estivesse calado (10, 48). Para estes discípulos, o indigente era um transtorno no caminho, um imprevisto no programa pré-estabelecido. Preferiam os seus tempos aos do Mestre, as suas palavras à escuta dos outros: seguiam Jesus, mas tinham em mente os seus projectos. Trata-se dum risco do qual sempre nos devemos precaver. Ao contrário, para Jesus, o grito de quem pede ajuda não é um transtorno que estorva o caminho, mas uma questão vital. Como é importante, para nós, escutar a vida! Os filhos do Pai celeste prestam ouvidos aos irmãos: não às críticas inúteis, mas às necessidades do próximo. Ouvir com amor, com paciência, como Deus faz connosco, com as nossas orações muitas vezes repetitivas. Deus nunca Se cansa, sempre Se alegra quando O procuramos. Peçamos, também nós, a graça dum coração dócil a escutar. Gostaria de dizer aos jovens, em nome de todos nós, adultos: desculpai, se muitas vezes não vos escutamos; se, em vez de vos abrir o coração, vos enchemos os ouvidos. Como Igreja de Jesus, desejamos colocar-nos amorosamente à vossa escuta, certos de duas coisas: que a vossa vida é preciosa para Deus, porque Deus é jovem e ama os jovens; e que, também para nós, a vossa vida é preciosa, mais ainda necessária para se avançar.

Papa Francisco, Homilia da Missa de Encerramento do Sínodo sobre os Jovens, 28 de Out., 2018

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30º Domingo do Tempo Comum – Ano B

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Marcos (Mc 10, 46-52)

Naquele tempo, ao sair Jesus de Jericó com os seus discípulos e uma grande multidão, o filho de Timeu, Bartimeu, que era cego, estava sentado à beira do caminho, a mendigar. Ao ouvir dizer: «É Jesus, o Nazareno», pôs-se a clamar, dizendo: «Jesus, Filho de David, tem misericórdia de mim». Muitos repreendiam-no para que se calasse. Mas ele clamava cada vez mais alto: «Filho de David, tem misericórdia de mim». Jesus parou e disse: «Chamai-o». Chamaram então o cego, dizendo-lhe: «Coragem, levanta-te: Ele chama-te». Deitando fora o seu manto, ele deu um salto e foi ter com Jesus. Jesus perguntou-lhe: «Que queres que Eu te faça?». O cego respondeu-Lhe: «Mestre, que eu veja». Jesus disse-lhe: «Vai, a tua fé te salvou». Ele recuperou logo a vista e seguiu Jesus pelo caminho.

Reflexão

O texto que nos é proposto para o 30º Domingo do Tempo Comum, Ano B, narra a cura do cego Bartimeu que levará este homem a seguir Jesus porque se operou nele uma iluminação pelo encontro com Aquele que é a “Luz do mundo”. Bartimeu vive de esmolas, dependendo da compaixão alheia. Está fora da cidade, é um excluído. As doenças e as deficiências físicas eram vistas como fruto do pecado. Segundo o modo de pensar de então, Deus castigava de acordo com a gravidade da culpa, o que se deduz que a cegueira dever-se-ia a um pecado bastante grave, próprio ou dos pais (cf. Jo 9,2). Está «sentado» porque é incapaz de mudar a sua condição; e «à beira do caminho», porque é um marginalizado, que não pode alcançar a salvação. Bartimeu é imagem da humanidade necessitada da Luz da salvação.

Porque cego, rege-se pelo ouvido. Ouve uma multidão que se aproxima e o povo a exclamar: «É Jesus, o Nazareno», aquele de quem já antes ouvira falar. Nasce então nele uma nova esperança e logo se põe a clamar: «Jesus, filho de David, tem misericórdia de mim». Certo do poder de Jesus, o Enviado de Deus, clama, pedindo-Lhe, com as mesmas palavras que nos salmos são dirigidas a Deus, que tenha misericórdia dele. Um pedido que a Igreja conservou até hoje na liturgia no grego original: Kyrie eleisón (“Senhor, misericórdia”).

As pessoas repreendem-no e mandam-no calar. É o que acontece muitas vezes também hoje: quando alguém procura Jesus e quer deixar a sua vida antiga, para aderir ao Evangelho e o seguir, não raro depara com a resistência dos outros, inclusive dos próprios familiares, amigos, colegas ou vizinhos. O cego, porém, não desiste e repete com renovada insistência: «Filho de David, tem misericórdia de mim».

Jesus pára e manda-o chamar. O cego deita fora o manto, símbolo da sua condição anterior, dá um salto e vai ter com Jesus. Para se encontrar com Jesus é preciso deixar a vida passada e dar o salto da fé. Jesus pergunta-lhe: «Que queres que te faça?». É a mesma pergunta que pouco antes fizera a Tiago e João. Mas agora a resposta é diferente, pois, se os dois irmãos queriam concretizar os seus sonhos de grandeza e poder, o cego deixa tudo apenas para receber de Jesus a luz de uma vida nova.

Jesus atende-o e diz: «Vai, a tua fé te salvou». «Ele recuperou logo a vista e seguiu Jesus pelo caminho». Bartimeu torna-se o exemplo do discípulo cristão que, com fé, confessa abertamente Jesus e O segue, sem nada mais pedir do que permanecer unido a Ele, caminhando com Ele até ao fim. Nesta decisão de caminhar com Jesus estão a fonte da coragem e a semente da vitória sobre a cruz. A cruz não é uma fatalidade, nem uma exigência de Deus. Ela é a consequência do compromisso assumido com Deus de servir os irmãos recusando ser o “maior”.

Palavra para o caminho

«Jesus, Filho de David, tem misericórdia de mim». A súplica de Bartimeu tornou-se, afinal, na oração que tem acompanhado as noites de insónia de tantos doentes, quando nenhuma palavra satisfaz, porque inúteis e vazias, e o sofrimento não dá descanso ao corpo nem à alma. Aquele grito de súplica tornou-se oração de peregrinos, murmúrurio incessante de monges… Também é a voz dos pobres, dos humildes, súplica de tantas mães que vêem os seus filhos a perder-se pelo caminho da droga, da violência e da diversão atordoante.

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Não cometerás adultério

Queridos irmãos e irmãs, bom dia

No nosso itinerário de catequeses sobre os Mandamentos, hoje chegamos à sexta Palavra, que se refere à dimensão afectiva e sexual, e diz: «Não cometerás adultério». A exortação imediata é à fidelidade e, com efeito, nenhum relacionamento humano é autêntico sem fidelidade e lealdade.

Não se pode amar só enquanto for “conveniente”; o amor manifesta-se precisamente além do limite da própria vantagem, quando se doa tudo incondicionalmente. Como afirma o Catecismo: «O amor quer ser definitivo. Não pode ser “até nova ordem”» (nº 1.646). A fidelidade é a característica da relação humana livre, madura, responsável. Até um amigo se demonstra autêntico, porque permanece tal em qualquer eventualidade, caso contrário não é um amigo. Cristo revela o amor autêntico, Ele que vive do amor ilimitado do Pai, e em virtude disto é o Amigo fiel que nos acolhe mesmo quando erramos e quer sempre o nosso bem, até quando não o merecemos.

O ser humano tem necessidade de ser amado sem condições, e quem não recebe este acolhimento tem em si uma certa incompletude, muitas vezes sem o saber. O coração humano procura preencher este vazio com sucedâneos, aceitando compromissos e mediocridades que só têm um gosto vago do amor. O risco consiste em chamar “amor” a relações superficiais e imaturas, com a ilusão de encontrar luz de vida em algo que, no melhor dos casos, é apenas um seu reflexo.

Assim acontece, por exemplo, que sobrestimamos a atracção física, a qual em si é uma dádiva de Deus, mas destinada a preparar o caminho para uma relação autêntica e fiel com a pessoa. Como dizia São João Paulo II, o ser humano «é chamado à plena e madura espontaneidade dos relacionamentos», que «é o fruto gradual do discernimento dos impulsos do próprio coração». É algo que se conquista, uma vez que cada ser humano, «com perseverança e coerência, deve aprender qual é o significado do corpo» (cf. Catequese, 12 de Novembro de 1980).

Portanto, a chamada à vida conjugal exige um discernimento atento sobre a qualidade da relação e um período de noivado para a averiguar. A fim de aceder ao Sacramento do Matrimónio, os noivos devem amadurecer a certeza de que no seu vínculo está a mão de Deus, que os precede e acompanha, permitindo-lhes dizer: «Com a graça de Cristo, prometo ser-te sempre fiel». Não podem prometer-se fidelidade «na alegria e na dor, na saúde e na doença», nem amar-se e honrar-se todos os dias da sua vida, unicamente com base na boa vontade ou na esperança de que “isto funcione”. Precisam de se fundamentar no terreno firme do Amor fiel de Deus. E per isso, antes de receber o Sacramento do Matrimónio, é necessária uma preparação atenta, diria um catecumenato, porque a vida inteira depende do amor, e com o amor não se brinca. Não se pode definir “preparação para o casamento” três ou quatro encontros realizados na paróquia; não, isto não é preparação: é falsa preparação. E a responsabilidade de quem faz isto cai sobre ele: sobre o pároco, sobre o bispo que permite tais situações. A preparação deve ser madura e leva tempo. Não é um ato formal: é um Sacramento. Mas deve-se preparar com um verdadeiro catecumenato.

Com efeito, a fidelidade é um modo de ser, um estilo de vida. Trabalha-se com lealdade, fala-se com sinceridade, permanecendo fiel à verdade nos próprios pensamentos, nas próprias acções. Uma vida tecida de fidelidade exprime-se em todas as dimensões e leva a ser homens e mulheres fiéis e confiáveis em todas as circunstâncias.

Mas para chegar a uma vida tão bonita não é suficiente a nossa natureza humana, é preciso que a fidelidade de Deus entre na nossa existência, nos contagie. Esta sexta Palavra chama-nos a dirigir o olhar para Cristo que, com a sua fidelidade, pode tirar de nós um coração adúltero e doar-nos um coração fiel. N’Ele, e somente n’Ele, existe o amor sem reservas nem arrependimentos, a doação completa, sem parênteses, e a tenacidade do acolhimento total.

A nossa fidelidade deriva da sua morte e ressurreição, a constância nos relacionamentos deriva do seu amor incondicional. A comunhão entre nós e o saber viver na fidelidade os nossos vínculos derivam da comunhão com Ele, com o Pai e com o Espírito Santo.

Papa Francisco, Audiência Geral, 24 de Outubro, 2018

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Ser livre ou escravo da hipocrisia

O que é que nos pode livrar de cair na hipocrisia? O apreço pela verdade e o sentido do serviço! Ora quando se educam as crianças para o conveniente e socialmente correcto, em vez de as educar para a coragem da verdade, quando só se fala e ensinam os direitos e se calam os deveres, então estamos a criar condições para que se forme a hipocrisia. É só esperar que as situações a ajudem a manifestar-se.

Vasco P. Magalhães, sj

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Para ser grande

Segundo Jesus, aquele que quiser ser grande, tem de renunciar ao seu desejo de poder sobre os outros e aprender, simplesmente, a servir a partir de uma postura de amor fraterno. Os que aceitam viver a partir da generosidade, do serviço e da solidariedade são pessoas que irradiam uma autoridade única. Não necessitam ameaçar, manipular, subornar nem adular. São homens e mulheres que nos atraem pela sua generosidade e nobreza de vida. Na sua existência resplandece a grandeza do próprio Jesus que «não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida como resgate para muitos» (Mc 10, 45). A sua vida é grande, precisamente, porque sabem dá-la.

José Antonio Pagola

O caminho do serviço é o antídoto mais eficaz contra a doença da busca dos primeiros lugares; é o remédio para os alpinistas, esta busca dos primeiros lugares, que contagia muitos contextos humanos e não poupa nem mesmo os cristãos, o povo de Deus, nem a hierarquia eclesiástica.

Papa Francisco, Angelus, 21 de Outubro de 2018

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Repousa no Senhor

Nos períodos de depressão física e de abatimento espiritual, se se torna difícil recolher as nossas energias para erguer-se e elevar-se, repousemos no Senhor e não nos entristeçamos. Tal estado pode trazer à alma grande proveito; basta que acolha a presença de Deus e Lhe ofereça a própria humilhação.

Beata Maria Josefina de Jesus Crucificado

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“Olha, se tu desprezas, se tu insultas, se tu odeias, isso é homicídio”

Queridos irmãos e irmãs, bom dia!

Hoje gostaria de prosseguir com a catequese sobre a Quinta Palavra do Decálogo, “Não matar”. Já destacámos como este mandamento revela que aos olhos de Deus a vida humana é preciosa, sagrada e inviolável. Ninguém pode desprezar a vida do outro ou a própria; o homem, com efeito, traz em si a imagem de Deus e é objecto do seu amor infinito, qualquer que seja a sua condição em que foi chamado à existência.

No trecho do Evangelho que ouvimos há pouco, Jesus revela-nos deste mandamento um sentido ainda mais profundo. Ele afirma que, diante do tribunal de Deus, também a ira contra um irmão é uma forma de homicídio. Por isso, o Apóstolo João escreverá: “Quem odeia seu irmão é assassino” (1 Jo 3, 15). Mas Jesus não se fica por aqui, e na mesma lógica acrescenta que também o insulto e o desprezo podem matar. E nós estamos acostumados a insultar, é verdade. E o insulto acontece-nos como se fosse uma respiração. E Jesus diz-nos: “Parem, porque o insulto faz mal, mata”. O desprezo. “Mas eu…estas pessoas, este, eu desprezo-o”. E esta é uma forma de matar a dignidade de uma pessoa. E belo seria que este ensinamento de Jesus entrasse na mente e no coração, e cada um de nós dissesse: “Não voltarei a insultar ninguém”. Seria um belo propósito, porque Jesus diz-nos: “Olha, se tu desprezas, se tu insultas, se tu odeias, isso é homicídio”.

Nenhum código humano equipara actos tão diferentes atribuindo-lhes o mesmo grau de juízo. E coerentemente Jesus convida até mesmo a interromper a oferta do sacrifício no templo se nos recordarmos que um irmão foi ofendido por nós, de maneira a irmos procurá-lo e reconciliar-nos com ele. Também nós, quando vamos à Missa, deveríamos ter esta atitude de reconciliação com as pessoas com as quais tivemos problemas. Mesmo se pensamos mal delas, se as insultamos. Mas muitas vezes, enquanto esperamos que o sacerdote chegue para celebrar a Missa, murmura-se um pouco e fala-se mal dos outros. Isto não se pode fazer. Pensemos na gravidade do insulto, do desprezo, do ódio: Jesus coloca-os na linha da morte.

O que Jesus quer dizer, ao alargar até este ponto o campo da Quinta Palavra? O homem tem uma vida nobre, muito sensível, e possui um “eu” recôndito não menos importante que o seu ser físico. De facto, para ofender a inocência de uma criança, basta uma frase inoportuna. Para ferir uma mulher pode bastar um gesto de frieza. Para despedaçar o coração de um jovem é suficiente negar-lhe a confiança. Para aniquilar um homem basta ignorá-lo. A indiferença mata. É como dizer à outra pessoa: “Tu estás morta para mim”, porque tu já a mataste no teu coração. Não amar é o primeiro passo para matar; e não matar é o primeiro passo para amar.

Na Bíblia, no início, lê-se aquela frase terrível saída da boca do primeiro homicida, Caim, depois de o Senhor lhe perguntar onde estava o seu irmão. Caim responde: “Não sei. Serei eu, porventura, o guarda do meu irmão?” (Gen 4, 9). Assim falam os assassinos: “não me diz respeito”, “é problema teu”, e coisas semelhantes. Experimentemos responder a esta pergunta: somos nós os guardiões dos nossos irmãos? Sim, somos! Somos guardiões uns dos outros! E este é o caminho da vida, é o caminho do não matar.

A vida humana precisa de amor. E qual é o amor autêntico? É aquele que Cristo nos mostrou, isto é, a misericórdia. O amor de que não podemos prescindir é aquele que perdoa, que acolhe quem fez o mal. Nenhum de nós pode sobreviver sem misericórdia, todos precisamos do perdão. Por isso, se matar significa destruir, suprimir, eliminar alguém, então não matar quererá dizer curar, valorizar, incluir. E também perdoar.

Ninguém pode iludir-se pensando: “Estou a postos porque não faço nada de mal”. Um mineral ou uma planta têm este tipo de existência, mas o homem não. Uma pessoa – um homem ou uma mulher – não. A um homem ou a uma mulher é pedido mais. Há o bem a fazer, preparado por cada um de nós, a cada um o seu, que nos torna nós mesmos até ao fundo. “Não matar” é um apelo ao amor e à misericórdia, é um chamamento a viver segundo o Senhor Jesus, que deu a vida por nós e por nós ressuscitou. Uma vez repetimos todos juntos, aqui na Praça, uma frase de um santo sobre isto. Talvez nos ajudará: “Não fazer o mal é coisa boa. Mas não fazer o bem não é bom”. Devemos fazer sempre o bem. Ir mais além.

Ele, o Senhor, ao encarnar santificou a nossa existência; Ele, que com o seu sangue tornou-a inestimável; Ele, “o autor da vida” (At 3, 15), graças ao qual cada um é um presente do Pai. Nele, no seu amor mais forte que a morte, e pelo poder do Espírito que o Pai nos dá, podemos acolher a Palavra “Não matar” como o apelo mais importante e essencial: isto é, não matar significa um chamamento ao amor.

Papa Francisco, Audiência Geral, 17 de Outubro de 2018

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