Catequese do Papa Bento XVI sobre Santa Teresinha
Queridos irmãos e irmãs,
Hoje gostaria de vos falar de Santa Teresa de Lisieux, Teresa do Menino Jesus e da Sagrada Face, que viveu neste mundo apenas 24 anos, no final do século XIX, levando uma vida simples e oculta, mas que depois da sua morte e da publicação dos seus escritos, se tornou uma das santas mais conhecidas e amadas. A “pequena Teresa” não deixou de ajudar as almas mais simples, os pequenos, os pobres, os que sofrem e os que lhe rezam, mas também iluminou toda a Igreja, com a sua profunda doutrina espiritual, de tal forma que o Venerável João Paulo II, em 1997, quis dar-lhe o título de Doutora da Igreja, acrescentado ao título de Padroeira das Missões, dado por Pio XI, em 1939. O meu querido predecessor definiu-a como uma “especialista na ‘scientia amoris'” (Novo millennio ineunte, 27). Esta ciência, que vê brilhar no amor toda a verdade da fé, Teresa expressa-se principalmente no relato da sua vida, publicado um ano após a sua morte com o título de “História de uma alma”. É um livro que foi de imediato um enorme sucesso; foi traduzido para muitas línguas e distribuído em todo o mundo. Eu gostaria de vos convidar a redescobrir este pequeno-grande tesouro, este luminoso comentário do Evangelho plenamente vivido! “História de uma alma”, de facto, é uma maravilhosa história de amor, contada com tal autenticidade, simplicidade e frescura, que o leitor não pode deixar de ficar fascinado! No entanto, qual é esse amor que preencheu a vida de Teresa, desde a infância até à sua morte? Queridos amigos, este amor tem um rosto, tem um nome, é Jesus! A santa fala continuamente de Jesus. Percorramos, então, as grandes etapas de sua vida, para entrar no coração de sua doutrina. Teresa nasceu a 2 de Janeiro de 1873, em Alençon, uma cidade da Normandia, França. Foi a última filha de Luis e Célia Martin, esposos e pais exemplares, beatificados os dois a 19 de Outubro de 2008. Tiveram 9 filhos, dos quais 4 morreram na infância. Restaram 5 filhas, que se tornaram todas religiosas. Teresa, aos 4 anos, foi profundamente afectada pela morte da sua mãe (Ms A, 13r). O pai, com as filhas, mudou-se então para a cidade de Lisieux, onde se desenvolveu toda a vida da santa. Mais tarde, Teresa, sofrendo uma doença nervosa grave, curou-se devido a uma graça divina, que ela definiu como “o sorriso de Nossa Senhora” (ibid., 29v-30v). Recebeu a Primeira Comunhão, vivida intensamente (ibid., 35r), e colocou Jesus Eucaristia no centro da sua existência. A “Graça do Natal” de 1886 marcou um ponto de viragem, ao que ela chamou de “conversão completa” (ibid., 44v-45r). De facto, ela curou-se totalmente da sua hipersensibilidade infantil e iniciou um “caminho de gigante”. Na idade de 14 anos, Teresa aproximou-se cada vez mais, com muita fé, de Jesus Crucificado, e levou muito a sério o caso, aparentemente desesperado, de um criminoso condenado à morte e impenitente (ibid., 45v-46v). “Eu queria a todo custo evitar que ele fosse para o inferno”, escreveu a santa, com a certeza de que a sua oração o teria colocado em contacto com o sangue redentor de Jesus. É a sua primeira e fundamental experiência da maternidade espiritual: “Tão confiante estava na infinita misericórdia de Jesus”, escreveu. Com Maria Santíssima, a jovem Teresa ama, crê e espera, com “um coração de mãe” (cf. PR 6/10r).
Em Novembro de 1887, Teresa vai em peregrinação a Roma, com o seu pai e a sua irmã Celina (ibid., 55v-67r). Para ela, o momento culminante foi a audiência do Papa Leão XIII, a quem pede autorização para entrar, com apenas 15 anos, no Carmelo de Lisieux. Um ano depois, o seu desejo foi realizado: ela torna-se carmelita, para “salvar almas e rezar pelos sacerdotes” (ibid., 69v). Ao mesmo tempo, começou a dolorosa e humilhante doença mental do seu pai. É um grande sofrimento que leva Teresa à contemplação do Rosto de Jesus na sua Paixão (ibid., 71rv).
Assim, o seu nome religioso – Irmã Teresa do Menino Jesus e da Sagrada Face – expressa o programa de toda a sua vida, na comunhão com os mistérios centrais da Encarnação e da Redenção. A sua profissão religiosa, na festa da Natividade de Maria, em 8 de Setembro de 1890, é para ela um verdadeiro matrimónio espiritual, na “pequenez” do Evangelho, que se caracteriza pelo símbolo da flor: “Que festa bonita a Natividade de Maria para me tornar a esposa de Jesus!”, escreve. Era a pequena Virgem Santa de um dia que apresentava a sua pequena flor ao Menino Jesus (ibid., 77r). Para Teresa, ser religiosa significa ser esposa de Jesus e mãe das almas (cf. Ms B, 2v). No mesmo dia, a santa escreveu uma frase que mostra a orientação da sua vida: pede a Jesus o dom do seu amor infinito, de ser a menor e, especialmente, pede a salvação de todos os homens: “Que nenhuma alma se condene hoje” (Pr 2). De grande importância é o seu Acto de Oferenda ao Amor Misericordioso, feito na Festa da Santíssima Trindade em 1985 (Ms A, 83v-84r; Pr 6): uma oferta que Teresa partilhou com as suas irmãs, sendo já auxiliar da mestra de noviças.
Dez anos após a “Graça do Natal”, em 1896, chega a “Graça da Páscoa”, que abre o último período da vida de Teresa, com o início da sua paixão profundamente unida à Paixão de Jesus; trata-se da Paixão do corpo, com a doença que a levou à morte através de grandes sofrimentos, mas acima de tudo trata-se da paixão da alma, com uma muito dolorosa prova de fé (Ms C, 4v-7v). Com Maria, junto à cruz de Jesus, Teresa vive agora a fé mais heróica, como luz nas trevas que invadem a sua alma. A carmelita tem a consciência de viver esta grande prova para a salvação de todos os ateus do mundo moderno, chamados por ela de “irmãos”. Ela viveu, então, mais intensamente o amor fraterno (8r-33v): com as irmãs da sua comunidade, com os seus irmãos espirituais missionários, com os sacerdotes e com todos os homens, especialmente aqueles mais distantes. Ela torna-se uma “irmã universal”! A sua caridade amável e sorridente é a expressão da profunda alegria cujo segredo nos revela: “Jesus, minha alegria é amar-te” (P 45/7). Neste contexto de sofrimento, vivendo o maior amor nas menores coisas da vida quotidiana, a santa leva ao pleno cumprimento a sua vocação de ser o amor no Coração da Igreja (cf. Ms B, 3v).
Teresa morreu na noite de 30 de Setembro de 1897, dizendo as palavras simples: “Meu Deus, eu te amo!”, olhando para o crucifixo, que apertava com as mãos. Estas últimas palavras da santa são a chave de todos os seus ensinamentos, da sua interpretação do Evangelho. O acto de amor, expresso no seu último suspiro, era como a respiração contínua da sua alma, como o bater do seu coração. As simples palavras “Jesus, eu te amo” são o centro de todos os seus escritos. O acto de amor a Jesus introdu-la na Santíssima Trindade. Ela escreveu: “Ah, tu sabes, divino Jesus, eu te amo, / o espírito de Amor inflama-me com seu fogo / e, amando-te, eu atraio o Pai” (P 17/2).
Queridos amigos, também nós, com Santa Teresinha do Menino Jesus, podemos repetir cada dia ao Senhor, que queremos viver de amor a Ele e aos outros, aprender na escola do santos a amar de maneira autêntica e total. Teresa é um dos “pequenos” do Evangelho, que são guiados por Deus nas profundezas do seu mistério. Uma guia para todos, especialmente para os que, no povo de Deus, desenvolvem o ministério de teólogos. Com a humildade e a fé, caridade e esperança, Teresa entra continuamente no coração das Sagradas Escrituras, que contêm o mistério de Cristo. E essa leitura da Bíblia, alimentada pela ciência do amor, não se opõe à ciência académica. A ciência dos santos, de facto, da qual ela fala na última página de “História de uma alma”, é a ciência mais alta: “Todos os santos a entenderam; em particular, talvez, aqueles que encheram o universo com a irradiação do ensinamento do Evangelho. Não será, talvez, por meio da oração, que os santos Paulo, Agostinho, João da Cruz, Tomás de Aquino, Francisco, Domingos e muitos outros ilustres amigos de Deus obtiveram essa ciência divina que encanta os maiores génios?” (Ms C, 36r). Inseparável do Evangelho, a Eucaristia é, para Teresa, o sacramento do Amor Divino que desce até ao extremo para nos elevar até Ele. Na sua última carta, a santa escreveu estas simples palavras sobre a imagem que representa o Jesus Menino na Hóstia Consagrada: “Não posso temer um Deus que por mim se tornou tão pequeno! (…) Eu o amo! De facto, Ele é só Amor e Misericórdia!” (LT 266).
No Evangelho, Teresa descobre sobretudo a misericórdia de Jesus, a ponto de dizer: “Ele deu-me a sua misericórdia infinita; através dela contemplo e adoro as demais perfeições divinas! (…) E então todas me parecem radiantes de amor; a própria justiça (e talvez mais do que qualquer outra), parece-me revestida de amor” (Ms A, 84r). Assim se expressa também nas últimas linhas da “História de uma alma”: “Basta folhear o Santo Evangelho e imediatamente respiro o perfume da vida de Jesus e sei para onde correr… Não é ao primeiro lugar, mas ao último que me dirijo… Sim, eu o sinto; inclusive se tivesse sobre a consciência todos os pecados que se podem cometer, iria com o coração partido de arrependimento lançar-me nos braços de Jesus, porque sei o quanto Ele ama o filho pródigo que volta para Ele” (Ms C, 36v-37r). “Confiança e amor” são, portanto, o ponto final do relato da sua vida, duas palavras que, como faróis, iluminaram todo o seu caminho de santidade, para poder guiar no seu próprio “pequeno caminho de confiança e amor”, da infância espiritual (cf. Ms C, 2v-3r; LT 226). Confiança como a da criança que se abandona nas mãos de Deus, inseparável pelo compromisso forte, radical do verdadeiro amor, que é o dom total de si mesmo, para sempre, como diz a santa, contemplando Maria: “Amar é dar tudo, é dar-se a si mesmo” (P 54/22). Assim, Teresa indica a todos nós que a vida cristã consiste em viver em plenitude a graça do Baptismo, no dom total de si ao amor do Pai, para viver como Cristo, no fogo do Espírito Santo, o seu próprio amor aos outros.
Bento XVI
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